Os profissionais de marketing e propaganda já contam há muito tempo com a colaboração de sociólogos e psicólogos na coleta e interpretação de informações sobre o mercado e o consumidor. Mas o que poderiam fazer, pelo marketing, acadêmicos como os antropólogos, etnólogos, neurocientistas e até filósofos? A resposta é simples: todos eles fazem parte do novo exército de cientistas do consumo que estão se tornando cada vez mais importantes para dar mais segurança e rapidez às decisões de planejadores e criadores de marketing e propaganda.
A edição de maio/junho da Revista da ESPM é dedicada inteiramente a este tema. Em entrevistas e artigos, grandes profissionais de marketing e propaganda, bem como fornecedores de pesquisa e estudos sobre o consumo, demonstram a importância que o tema já assumiu para as empresas de vanguarda. No marketing e na propaganda de hoje não se pode mais perder tempo e dinheiro com decisões demoradas ou arriscadas demais. Cabe justamente a estes novos cientistas do consumo fornecerem informações que, até pouco tempo, eram difíceis de se conseguir.
Em si mesmos, o marketing e o consumo jamais poderiam ser tratados como ciências exatas. Na hora da verdade, os processos que levam às decisões combinam dados de cunho científico com variáveis subjetivas que não é possível controlar. Na verdade, há muitos planejadores e criadores que resistem às imposições das pesquisas e preferem trabalhar com mais liberdade, confiando em seu próprio instinto. Mas há também muitos casos, no marketing e na propaganda, em que as revelações e descobertas dos cientistas do consumo serviram de trampolim para o salto criativo que resultou em grandes campanhas.
Homenagem a um pioneiro
Cabe aqui uma referência a Alfredo do Carmo, já falecido, que foi certamente o primeiro cientista do consumo que surgiu no Brasil. No final dos anos 50, Alfredo do Carmo era gerente-geral da Marplan do Brasil e realizou uma grande pesquisa motivacional sobre o mercado de creme dental por encomenda da McCann-Erickson que, naquela época, tinha a conta do creme dental Kolynos. Até aquele momento a propaganda de Kolynos seguia o padrão internacional, enfatizando a proteção contra as cáries. Mas Alfredo demonstrou que a verdadeira motivação do consumidor brasileiro estava no frescor da boca e no hálito agradável.
A pesquisa foi levada tão a sério que toda a estratégia mudou, resultando na famosa campanha “Há! Kolynos”, que levou a marca à liderança do mercado brasileiro e acabou sendo usada em toda a América Latina. Outro exemplo de simbiose entre os cientistas do consumo e os planejadores de marketing nos é dado pela Unilever, em favor da marca Omo.
Durante anos, Omo trabalhou a mensagem: “Não tem aprendizado sem manchas”. Até que o departamento de marketing da Unilever entendeu que a marca deveria tirar um pouco a mãe de circulação e deixar os filhos mostrarem que se sujar faz bem. “Foi quando mudamos o posicionamento da marca e adotamos o novo conceito que representa uma evolução da ideia de que não existe aprendizado sem manchas”, explica Andrea Salgueiro, vice-presidente de personal care da Unilever. “Isso surgiu do entendimento de muitas conversas com as mães e da necessidade de dar mais espaço aos filhos para eles provarem que a sujeira faz parte do desenvolvimento motor e cognitivo de toda criança.”
É através de ações como essa, combinando as pesquisas e o talento, que a Unilever mantém Omo na liderança do mercado há muitas décadas. Parece-nos que esse é um caminho sem volta para o futuro.
*Conselheiro Emérito da ESPM