Cunha: a rede é também o local perfeito para procrastinarÉ impossível imaginar um mundo sem o Facebook hoje. Estamos tão acostumados a acessar a rede social azul que é estranho pensar em ligar o computador pela manhã e não digitar o www.facebook.com, dar uma geral no feed, conferir e responder notificações, falar com amigos, dar parabéns pra outros, compartilhar memes, notícias e vídeos. E então começar a trabalhar.

A rede é também o local perfeito para procrastinar. Sem tomar cuidado, podem ser perdidos preciosos minutos no trabalho. Alguns perdem horas. No feed de notícias frenético, acabamos sempre rolando a página ávidos por mais e mais conteúdo, mas raramente nos aprofundamos em algum post. Há muita gente, inclusive, que lê o título da notícia e já sai comentando, cheio de razão – ah, as eleições.

É nesse cenário onde o efêmero prevalece, que as marcas estão tendo que aprender a dançar conforme a música. Até ontem, ganhar likes na fanpage era a “brincadeira” do momento. Ultrapassar o concorrente então, nem se fala. Lembra dos posts comemorativos quando alguma fanpage atingia 100.000 likes? E aquelas que comemoravam quando atingiam 1.000 likes? Parece que foi ontem. Lembro também das malditas abas onde fazíamos zilhões de aplicativos buscando experiência e interação com os usuários ou apenas meros concursos culturais onde a “taxa de participação” ou moeda de troca era o like? Funcionava como um ingresso. Mesmo que depois de participar, muitos davam o “dislike”.

Muita mídia foi comprada pra promover as tais abas e as marcas se saíram bem nessa ‘festa’, conquistando a atenção de muita gente. Até que veio a mudança de layout do Facebook, alterando profundamente os guides da rede e escondendo, de uma vez por todas, as malfadadas abas, que acabaram perdendo completamente sua relevância. Os hotsites, que nessa época foram morar dentro das abas do “feice”, tiveram que voltar pro seu local de origem, um domínio www qualquer – os designers agradeceram. Aí veio a briga por engajamento e a queda do tal alcance orgânico. Percebeu-se que o Facebook não era mais uma rede social, e sim um veículo com possibilidades de segmentação nunca antes vista, onde pagar pra ser visto tornou-se corriqueiro. Como, quem diria, um comercial de TV ou um spot de rádio.

Enxergar o Facebook como um veículo, não significa que a forma de fazer propaganda deve ser vista da mesma forma que era feita até ontem. Dentro desse canal, o que mais as pessoas gostam de fazer é compartilhar conteúdo bem humorado como memes, fotos e vídeos engraçados. Não importa a procedência e nem a língua falada, basta que eles entretenham por alguns segundos e possam ser taxados como “incríveis” e “geniais” quando compartilhados. O ponto é que ainda há marcas que pensam na propaganda como há 5 anos atrás. Ainda acreditam que podem alcançar grande relevância dentro do Facebook simplesmente falando sobre seus produtos e acabam se comportando como aquele seu amigo no bar, que nem te deixa falar e simplesmente fica te contando vantagens e mais vantagens, porque ele fez e aconteceu e isso e aquilo.

O que acontece hoje é que as marcas ganharam um concorrente que jamais existiu, mais poderoso que qualquer outra marca do planeta: as pessoas. Pessoas que conversam sobre os mais diversos tipos de assunto, que postam sobre seu casamento, sobre o fim de semana na praia e fotos do filho que acabou de nascer. Como o conteúdo da sua marca pode ser mais atraente que tudo isso?

Isso não é simples. Técnicas de Storytelling estão aí desde sempre pra que isso seja possível. Estamos vivendo uma época sem precedentes no que diz respeito a histórias. Nunca antes se viu tanto conteúdo com qualidade como House of Cards, Breaking Bad, True Detective e Orange is the New Black. O Facebook é isso, é feito de histórias. As pessoas vivem falando sobre histórias. No Twitter, dias atrás, se manteve uma hashtag fazendo referencia a morte de um personagem de The Walking Dead, o assunto que tratava de um spoiler acidental na fanpage da série, se estendeu por mais de três dias. As pessoas gostam de se envolver com histórias, sempre foi assim. Resta entender por que marcas ainda insistem em interromper isso pra simplesmente mostrarem seus produtos, sem construir nada de interessante.

Acredito que muitas empresas ainda se preocupam apenas com o relatório que precisam enviar ao seu chefe. Se não houver um gráfico ascendente, há um problema. Se a performance caiu, fim do mundo. Ora, não estou aqui dizendo que resultados não são importantes, o problema é esperar que eles venham a curto prazo. Isso inviabiliza a construção de cases realmente incríveis e atrapalha a construção de marca. Enquanto a publicidade digital ainda funcionar como extensão do “offline”, dificilmente veremos a propaganda como algo agradável. É por isso que há gente deixando o Facebook, a interrupção é ainda mais inaceitável dentro dele.

Enquanto todas as áreas da agência não interagirem em prol da criação de algo que terá grande relevância para o usuário final, continuará havendo anúncios, anúncios e mais anúncios. Prova disso é o impacto que uma marca causa ao sair do ponto comum. Quantas vezes você compartilhou um post da Oreo ou mesmo do Humans of New York sem pensar no produto, mas sim na história? As pessoas não consomem conteúdo ruim, elas gostam de coisas interessantes. Nem tudo precisa ser snack. Pode haver profundidade no conteúdo publicitário.

Enquanto os próprios anunciantes seguirem pressionando as agências pra entregarem “pra ontem” aquela estratégia que vai orientar a marca nos próximos seis meses, com o objetivo único de triplicar as vendas, o Facebook continuará sendo a passarela pra um desfile de interrupções de conteúdo frio e vazio. É fácil interromper, basta pagar. O difícil é ter calma e olhar com sabedoria para esse novo mercado que está diante de nós e ajustar o tom da conversa. A maioria das grandes empresas ainda insiste apenas em falar alto no bar, achando que as mesas do lado irão parar tudo só para ouvi-las.

* Gerente de mídia e novos negócios da fri.to