Os valores das organizações tornaram-se um ativo efetivamente de valor, passando a considerar aspectos como compliance, ética e atuação socialmente responsável. O avanço na direção de um mundo mais justo, bom e equilibrado muito se deve à evolução destes valores que ajudaram a transformar a visão do que era o ‘capitalismo selvagem’, ancorada na busca pelo lucro a qualquer custo, para um capitalismo mais sustentável. A despeito desse avanço, ainda são visíveis as estruturas de pensamento dos primórdios do capitalismo, que guardam semelhanças com o atual momento de disrupção tecnológica, em que novos modelos de negócios permanecem fora de regras e normas válidas em um determinado setor, que são referência de boas práticas e condutas. Reconhecido como um dos mais criativos e premiados do mundo, o mercado publicitário brasileiro alcançou patamar indubitável de criatividade, qualidade e desempenho, apoiando marcas de todos os setores.

Um dos pilares fundamentais para isso foi o código de autorregulação da publicidade, elaborado a partir da criação do Cenp, que se consolidou como alicerce para uma indústria forte, preservando-a de políticas e disputas predatórias e ajudando a proteger anunciantes, agências e veículos de comunicação. Elogiado internacionalmente, este código torna-se hoje fundamental no momento em que o meio digital, dominado pelas grandes plataformas de tecnologia, transforma não só a forma de comunicação, mas, em alguns casos, gera disparidade entre os parâmetros que orientam as empresas alinhadas ao código e aquelas que julgam não se enquadrar às regras. A atualização do Anexo B, realizada em 2018 e produto de mais de três anos de discussão aberta com todos os integrantes do Cenp, foi importante para atualizar a autorregulação no que se refere aos níveis do Desconto-Padrão. O Anexo B fixou novos percentuais de retorno do Desconto-Padrão, com uma tabela progressiva dos descontos, aplicada sobre o investimento do anunciante para remunerar as agências, de forma ética e justa. Foi uma atualização importante, que considerou aspectos que já influenciavam as negociações. Foi concedido um bom período de adaptação do código. Por mais de dois anos, anunciantes, agências e veículos puderam conhecer e implementar as novas diretrizes. A pandemia atrasou essa adaptação, e o Cenp discutirá ainda este ano a necessidade de dar maior prazo. É necessário observar que a autorregulação é positiva para todas as partes, incluindo os anunciantes, apesar da recente decisão da Associação Brasileira de Anunciantes (ABA) de se retirar do Cenp – órgão que ajudou a fundar há 22 anos – e de propor a criação de novo fórum para se discutir uma nova autorregulação.

Neste momento singular, em que o setor de publicidade, assim como outras atividades, enfrenta o impacto da pandemia, torna-se fundamental buscar a união da indústria e defender a autorregulação como base para uma competição justa e saudável. Este debate deve ser conduzido no âmbito do Cenp, que defende o setor há mais de duas décadas. Temos de manter como parâmetro as melhores práticas, e elas devem considerar a sustentabilidade de toda a indústria, não apenas o desejo dos detentores dos recursos. Com certeza, a forma de se fazer publicidade evoluiu para novas frentes tecnológicas, mas isso não significa que devemos abrir mão de conquistas que tornam o nosso setor mais justo, ético e profissional.

Dudu Godoy é presidente do Sinapro-SP, VP da Fenapro e VP do Cenp (presidencia@sinaprosp.org.br)