Aos dois anos, perdi a visão devido a um câncer na retina. Esse não era o futuro que meus pais imaginaram para mim, mas, desde pequeno, aprendi que minha história não precisava ser sobre limitações.

Cresci ouvindo que eu podia tudo, e acreditei nisso.

Minha infância em Natal (RN) foi repleta de descobertas. Meus pais me ensinaram a ser independente e a me virar no mundo, mas não foi fácil.

A falta de acessibilidade, o olhar do outro e o capacitismo foram barreiras constantes. Ainda assim, nunca aceitei que a cegueira me definisse.

Estudei, viajei, trabalhei e encontrei um caminho onde pudesse me expressar e transformar realidades.

A comunicação sempre foi minha aliada. Primeiro no jornalismo, depois nas redes sociais, onde hoje compartilho minha rotina para quase meio milhão de pessoas.

Mas, mais do que contar histórias, quero ajudar a mudar mentalidades. Quero que as pessoas parem de enxergar a deficiência como algo extraordinário ou digno de pena.

Somos consumidores, trabalhadores, influenciadores, cidadãos e, acima de tudo, seres humanos, que merecem estar representados no mercado e na sociedade.

E é aí que está a minha maior inquietação: ainda há um abismo entre inclusão e pertencimento. Quantas marcas realmente falam com o público com deficiência?

Quantas campanhas publicitárias nos incluem de forma genuína, sem estereótipos? Poucas. Isso porque muitas empresas ainda não nos enxergam como parte do público-alvo. E isso precisa mudar.

Quando criei um projeto incentivando artistas a postarem autodescrições nas redes sociais, vi o impacto que uma simples ação pode ter.

Pequenas iniciativas geram grandes transformações. Mas não podemos depender apenas de boas vontades. Acessibilidade tem de ser regra, não exceção.

No censo de 2022 do IBGE, o Nordeste foi a região com o maior percentual de população com deficiência, atingindo 10,3%, o que equivale a 5,8 milhões de pessoas.

Seguem-se as regiões Sul (8,8%), Centro-Oeste (8,6%) e Norte (8,4%), enquanto o Sudeste apresentou o menor percentual, com 8,2%.

Apesar dos avanços no Brasil em questões de inclusão e acessibilidade, ainda há muito a ser feito.

Precisamos questionar ainda quantas lojas, restaurantes, festivais e cinemas estão preparados para nos receber?

Quantas empresas possuem profissionais com deficiência em suas equipes, não por cota, mas por competência?

Quando chegarmos em um ponto da história onde conviver com PCDs não será exceção, mas sim algo completamente usual, saberemos que vencemos.

Fernando Campos é jornalista, escritor e influenciador