Visitamos a Tate Modern em agosto e algo me saltou aos olhos: a quantidade de arte envolvendo apenas palavras, textos, tipologia, ou ainda obras onde até existe uma imagem de fundo, mas são as palavras que brilham, que dão sentido à arte. Arte Alltype - e muitos com cara de propaganda.

As Guerilla Girls por exemplo, que também estão aqui no Masp, têm uma sala só pra elas que mais parece uma exposição do Clube de Criação, de tanto que o texto se sobrepõe e a estética de layout de propaganda se espalha pelas paredes.

A peça mais icônica do movimento que combate o machismo nas artes é praticamente um anúncio com layout clássico e o título: As vantagens de ser uma artista mulher. Embaixo, enumeradas, as tais “vantagens” são de uma ironia fina e um humor implacável. “Trabalhar sem a pressão do sucesso”, “Ver suas ideias vivendo no trabalho de outros”, “Não passar pelo embaraço de ser chamada de gênio” e outras.

Alltype puro. Simplicidade criativa pura. Arte pura.

Pois não é que a gente vai à Saatchi Gallery, outra meca da arte contemporânea de Londres, e também as projeções, quadros e instalações onde o texto é a grande estrela se multiplicam? Entre peças conceituais, instalações e lindas obras de todos os cantos do mundo, muita coisa alltype pelas paredes.

A pop art, ignição explosiva da arte contemporânea ou pós-moderna, já tinha nos quadros do Lichtenstein a linguagem de HQ com frases, palavras e onomatopeias, mas textos, títulos e conceitos como estrelas das obras, acredito ser um fenômeno bem mais recente.

Em uma sala só de Brasil na Tate, por exemplo, se destaca “seja marginal, seja herói” na bandeira de Hélio Oiticica. Como contraponto, temos uma exposição da Yayoi Kussama, que constrói suas obras com característicos pontos que já se tornaram até bolsas Louis Vuitton. Mais pop art impossível.

Uma das principais características da arte contemporânea é justamente a incorporação da cultura popular às obras, o que inclui o design e a propaganda. Banksy é o maior fenômeno da arte hoje com sua street art contemporânea cheia de referências de cultura pop. Talvez isso explique a quantidade de obras alltype ou com características de campanha publicitária, como as bandeiras sem cor de países explorados que mais parece uma supercampanha publicitária que ganharia GP no Cannes Lions.

Em Amsterdam, em uma galeria cheia de Jef Koones, Ai Wei Wei e Damien Hirst, tinha obras em neon com palavras e frases de humor ácido lindas, originais e de chorar de rir. Nosso Vik Muniz também tem essa pegada contemporânea de pop arte que já foi até apresentação de novela, Murakami usa o mangá como Warhol e Roy usavam a HQ e os produtos de consumo, mas voltando ao que mais me impressionou e nunca tinha visto: a arte alltype está em destaque, se multiplicando e fazendo o maior sucesso.

Mais incrível ainda é esta tendência acontecer ao mesmo tempo em que na propaganda existe uma opinião meio generalizada de que os títulos já não têm uma grande importância, os textos então, coitados, esses “ninguém lê nunca”, mesmo os mais curtinhos e os mais brilhantes. Não sei de onde tiraram essa ideia, mas que ela está por aí em posts (escritos, claro), tuítes e opiniões não se pode negar.

Fazendo um parênteses aqui, postei um anúncio da 11:21 nas redes sociais semana passada e usei o arquivo errado. Nele, lá no meio do texto, tinha um pequeno tipo (a palavra trabalho estava escrita de forma errada, “tranalho”). Impressionante quantos amigos mandaram mensagens por vários canais me alertando disso (agradeço a todos) com medo que fosse veiculado com erro. Acho que isso prova que texto de anúncio é lido, sim. Fim do parênteses.

Se falarmos de filmes, os comerciais com ator falando para a câmera um texto marcante, engraçado, emocionante ou surpreendente de alguma forma, assim como os filmes de cartela, ou seja, de ideia pura, são uma espécie de alltype dos filmes. Eles também são mais raros por aqui. Nos Estados Unidos e na Inglaterra, por exemplo, temos visto muitas campanhas alltype em OOH, por exemplo, e filmes extremamente simples e engraçados (veja as campanhas da Uncommon para British Arways e Hiscox ou da Mischief para Tubi, Peets Coffee - filmes muito simples - Chilis).

Por fim, deixo aqui um questionamento: será que na propaganda brasileira veremos mais Guerilla Girls, ideias poderosas, que mexem com as pessoas, criam impacto de maneira muito simples? Veremos por aqui mais BA, Chilis ou Tubi? Teremos essa mesma valorização criativa do alltype?

Gustavo Bastos é CEO/CCO da 11:21 Simplicidade Criativa
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