É preciso muita resiliência para não desistir do momento presente. As notificações e mensagens instantâneas que nos empurram a cada minuto para o abismo que é a urgência do outro…

As obrigações simultâneas que nos fazem empurrar o outro para o abismo que é a nossa urgência…

Hoje, na caixa de entrada (de uma das minhas três contas de e-mail), há 17.405 mensagens não-lidas.

No WhatsApp, 264 conversas seguem em aberto.

É opressor, eu sei.

E não vai parar nunca.

Há algum tempo a vida, a maternidade (dupla) e um grande susto na saúde me escancararam que a aceleração extrema adoece o corpo e as relações.

Que a falta de presença vem disfarçada de produtividade.

Que criatividade e inovação são imensamente nutridas por silêncios e conexão com as pessoas.

Que insight não nasce de linha de produção de afazeres aleatórios.

Há alguns anos, imersa numa jornada em busca da autoconsciência, tenho a certeza de que a intensidade e a sutileza de cada momento bem vivido são muito mais recompensadores do que viver distraída.

Posso ir longe aqui sobre os muitos métodos testados e frustrados para apaziguar as pressas.

Mas milagre mesmo, nessa alma afoita, começou a acontecer com a ajuda daquele famoso tapetinho. E é sobre essa experiência que venho falar.

No auge de um puerpério e de algumas crises, deixei-me ser içada para uma prática de ioga no fim de uma sexta-feira qualquer.

Alguém me disse que a conexão com o mestre e com o método mudariam o jogo.

E mudaram.

Lembro bem de ter entrado absolutamente descrente de que me conectaria à prática.

Meus amigos me desacreditaram.

Você não vai dar conta, isso não é para você.

Outros menosprezaram até.

É modinha de Instagram.

Não me esqueço da angústia de ser conduzida a observar as sensações que se passavam “no topo da minha cabeça” - nem da surpresa de, após alguns minutos de entrega, perceber o vento soprando na franja, a testa latejando e a nuca gotejando de suor.

Imagina, tudo aquilo se passando só no topo da minha cabeça há 30 e poucos anos - e eu incapaz de realizar.

(E o que mais nessa vida eu deixei de perceber?)

(Quantas reuniões e processos criativos não foram aproveitados com toda a potência, em todas as sutilezas, porque a atenção estava fragmentada?)

Observe os zilhões de pensamentos sem criar aversão a cada um deles.

Flexões e invertidas.

Preste atenção em cada postura - por trás dela, muitas coisas acontecem.

Coordene respiração, equilíbrio, força e ritmo.

Inspire em quatro segundos; exale em oito.

Respiração do fogo.

Meditação.

Derreta-se no chão e permita-se apenas existir.

Savasana - e uma conexão íntegra e inabalável com o aqui e agora.

Tempos depois descobri que os mais dedicados yoginis que conheci se enxergavam neste mesmo lugar de incompatibilidade.

Em meio ao processo de adaptação, me identifiquei profundamente com o relato do Dan Harris (autor de 10% mais feliz); que conseguiu se entregar à meditação a partir do momento que parou de “lutar” consigo mesmo para controlar os pensamentos.

Porque meditar não se trata de forçar a barra, de limpar a mente, mas de (re)aprender a observar. Sente-se numa posição confortável e imagine que está atrás de uma cachoeira; seus pensamentos são como a água jorrando forte.
Contemple o “cair”, o “molhar”, o vento frio que sopra dessa pedra.

Aprendi essa visualização em um retiro que participei  - e foi assim que parei de me debater, impaciente, na postura de lótus e comecei a meditar quase que organicamente.

Hoje, em meio a tantos barulhos e sentimentos de dentro pra fora e de fora pra dentro, aprendi a colocar em prática tal distanciamento. Há alguns dias, no Rio2C, me percebi visualizando a cachoeira por alguns minutos, de olhos abertos mesmo, como numa defesa para modular os sentidos sobrecarregados - desacostumada que estava a tantos estímulos presenciais ao mesmo tempo.

A ioga, quando foi incorporada não só na prática física, mas também na filosofia, me ensinou a decupar as sensações - sem conectar de forma tão desgastante com todas elas.

A ioga mudou minha forma de perceber e experimentar o mundo - e não foi por causa dos asanas (posturas) instagramáveis.

Ainda assim, mesmo com uma prática assídua e consistente, é sempre um desafio gigantesco driblar padrões e um contexto que só interrompe. Para mim, aprimorar a habilidade de se conectar ao presente é ouro em pó.

É cultivar a saúde mental; é inspiração.

Um alicerce inerente aos bons vínculos (os duradouros), à escuta e às conversas relevantes.

Viver bem no presente é o melhor jeito de viver bem no futuro.

Fernanda Menegotto é diretora-executiva da Vbrand