A representatividade e a sua importância na construção da confiança e da autoestima de pessoas diferentes do padrão estabelecido pela mídia já é um assunto debatido por muitos. É possível ver avanços neste tema, apesar de ainda haver um massacre da normatividade nas imagens a que temos acesso, em redes sociais e na publicidade. No entanto, pouco se fala da coletividade, da ocupação de espaços urbanos por grupos historicamente marginalizados.

Quantas vezes você já esbarrou com um grupo de mulheres trans se exercitando no Ibirapuera, em São Paulo, ou na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro? Por que, em um contexto atual de valorização da saúde mental e do bem-estar, não pensamos, de forma natural, nestes grupos? Se os parques são públicos, por que sua utilização é tão restrita? Não é à toa que um dos bordões da comunidade trans é o “bota a cara no sol”. Isso porque o que parece natural para pessoas-padrão - sair ao sol - não é tão simples para quem tem um corpo diferente, diverso. São vidas consideradas menos vivas e cuja materialidade, em seus corpos não aceitos, é entendida como “não importante". Porém, isso não significa que não possuam uma existência concreta e que suas histórias de vida e ações não façam parte do espaço urbano.

Além do claro preconceito e da marginalização de grupos inteiros, há uma questão econômica. Não há razão para que, por exemplo, toda uma comunidade LGBTQIAP+ seja excluída de espaços públicos e privados onde também estariam movimentando a economia. Ainda há poucos dados disponíveis sobre o que chamamos de “Pink Economy”, mas um estudo do fundo LGBT Capital estimou que a contribuição desse grupo para o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil seja de R$ 460,3 bilhões. Outra pesquisa, da Nielsen, com dados referentes a 2022, mostra que o grupo LGBTQIAP+ movimenta, em média, R$ 10,9 bilhões por ano em compras no varejo e no comércio eletrônico.

O Pacto Global da ONU e a Nhaí!,  startup de inovação voltada à temática da diversidade, trabalham em um censo inédito sobre a inclusão produtiva LGBTQIAPN+. O levantamento vai detalhar o perfil de empregabilidade e de empreendedorismo da comunidade no Brasil.

Com informação, visão estratégica e de negócios, é a hora de criarmos esses espaços. É preciso que as grandes empresas estejam dispostas a investir e a abraçar essa pauta. Precisamos, juntos, criar locais onde seja possível, com toda liberdade, a prática de esportes para todos e onde corpos hoje marginalizados possam se exercitar e desempenhar livremente a sua cidadania, ocupando a cidade.

Assim, dentro de uma discussão tão viva atualmente, sobre corpos reais, precisamos incluir realmente todos os corpos. Vamos mostrar que qualquer corpo ocupa os espaços urbanos, criando, trabalhando e consumindo. E isso deve acontecer durante todo o ano, e não somente no mês em que mudamos os avatares de nossos perfis para a cor e forma da campanha correspondente. Afinal, todo mundo tem que poder jogar o tempo todo.

Raquel Virgínia é CEO da Nhaí!