Nos anos 1970, comecei uma curta carreira em hotelaria, no Intercontinental, na Praia de São Conrado, no Rio de Janeiro. O hotel tinha acabado de ser inaugurado, e me impressionavam as dimensões de seus salões, separados por divisórias móveis.

Fiquei sabendo, na época, que esse padrão de arquitetura era resultado de uma grande expectativa de hoteleiros internacionais de que o Brasil liberaria, em breve, o funcionamento dos cassinos.

Mas a pressão da sociedade, principalmente da Igreja Católica, acabou por assustar os congressistas e o projeto não passou. Nos anos 1990, quando os bingos viraram uma praga, se utilizando de uma maracutaia, que, em tese, visava a beneficiar federações e associações de práticas desportivas, conquistei a conta de um deles.

Foi interessante conhecer um pouco dos bastidores daquele negócio. Lembro que fazia reuniões com dois franceses muito sinistros. Quando resolveram passar o negócio para a frente, o meu cliente virou, então, um espanhol mais sinistro ainda.

Na ocasião, conheci gente que recebia um bom salário para jogar nas máquinas em que o cliente ganhava, devolvendo, naturalmente, o valor do prêmio para o patrão. De todo modo, era um anunciante frequente, que pagava em dia.

No início dos anos 2000, passei a prestar serviços para a Abap, como consultor. Além dos seminários Comunicar e Crescer, que apresentei durante 14 anos, também compunha a defesa de alguns interesses da entidade, em audiências públicas, em Brasília. Muito debati a publicidade para crianças ou de medicamentos, por exemplo, sempre na perspectiva da, então, chamada liberdade de expressão comercial.

O tempo passa e eis que nos vemos outra vez tendo de unir forças para preservar o faturamento de clientes, veículos e agências. Agora, o assunto são as bets.

Dois projetos de lei tramitam no Congresso Nacional, um propondo a proibição da publicidade das casas de apostas, e outro impedindo que celebridades e influenciadores promovam a jogatina.

Se os bingos representavam uma fatia muito pequena do mercado anunciante, com as bets o negócio é muito diferente. Hoje, elas ocupam os espaços mais nobres dos meios, com produções requintadas e se utilizando de uma vasta gama de estrelas.

Características próprias das grandes marcas, anos atrás, que faziam da publicidade brasileira uma das mais respeitadas e premiadas do mundo.

Saber que as bets patrocinam os times, patrocinam os estádios, patrocinam as transmissões e patrocinam apresentadores, dotadas de uma presença avassaladora, maior que qualquer outro segmento anunciante, não me faz orgulhoso da profissão.

Reconheço, no entanto, que o negócio precisa ser preservado e os empregos mantidos.

Assistindo à audiência pública da terça-feira passada, ouvi um argumento recorrente, sempre que está em julgamento algo que sobrevive na fronteira do não-recomendado: quanto mais dificuldades impusermos à publicidade das bets, mais espaço estaremos concedendo às casas de apostas ilegais.

Com o cigarro não era diferente quando se tratava de aumentar os impostos – mais impostos, mais contrabando. Enfim, parece que certos negócios sempre têm um plano B.

Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing
stalimircom@gmail.com