Ops! Dois neologismos no título deste artigo? Desculpe, mas é o que acontece todos os dias, não? O mercado não cansa de criar novos termos e siglas, acompanhando o ritmo da inovação. Mas eu não criei nada novo para nortear este texto.

Apenas me ocorreu uma reflexão sobre o termo glocal, que não é nada novo. O termo foi cunhado lá nos anos 1980, no Japão, e potencializado no Ocidente pelo sociólogo Roland Robertson. Num momento em que só se falava em globalização, o conceito glocal chegou para colocar uma pitada de valorização nas ações locais, em detrimento da visão de globalidade.

Pense global, mas aja local. Este era o princípio. O tempo passou, gigantes globais foram criados, fortalecendo o conceito da globalidade, mas, em paralelo, cresceu também a valorização do local, agora retrofitado pelos princípios da sustentabilidade.

O consumo de itens locais, principalmente alimentícios – mas não só eles –, passou a ser um must entre os mais antenados. É realmente fora de moda consumir algo que foi produzido do outro lado do mundo, muitas vezes usando mão de obra muito barata (semiescravidão), que passará por um processo logístico que deixará uma pegada antissustentável, embora viável economicamente.

Muitos acabam optando pelo produto local por consciência, outros por obrigação legal mesmo. Eu vivi uma experiência nesse sentido, que divido com você.

Fui aos EUA para um grande evento em Kansas City. Como eu iria produzir um evento semelhante no Brasil, me interessava prospectar representantes de outros países presentes para participar do evento no Brasil.

Qual foi minha ideia? Vamos produzir uma Caipirinha Party e convidar os líderes dos países prospectados. Levei cachaça brasileira, claro!

E lá fui eu contratar uma sala no hotel onde estava para organizar a tal Caipirinha Party. Tudo certo até o momento em que o gerente de eventos do hotel me pergunta que itens vão ser servidos. Além de snacks que compraria ali mesmo, informei que a grande estrela seria a famosa caipirinha brasileira, que eu ensinaria a bartenders como fazer.

Ao dizer que eu já tinha a cachaça, que havia trazido do Brasil, descobri que não era possível. De acordo com lei municipal, todos os produtos servidos num evento devem ser adquiridos no mercado local. Mas não tem cachaça por aqui, argumentei! Nada feito! Era realmente proibido.

No final, acabei optando pelo aluguel da suíte presidencial, o que transformou meu evento em uma festa privada, sem os controles de produtos consumidos, e viabilizei a Caipirinha Party com cachaça brasileira. Conto essa história para exemplificar como o consumo de itens locais está sendo tratado em outros países.

Não vejo essa atitude por aqui. Nem por força legal, tampouco por consciência. Adoramos servir salmões defumados, queijos importados e outras iguarias importadas nos nossos eventos. Mas esse é apenas um aspecto do conceito Glocal.

Há organizações mastodônticas que continuam empurrando goela abaixo sua forma de atuar, independentemente do país em que está. Lembro-me do fracasso retumbante do lançamento da AOL (America Online) no Brasil, na época um dos maiores players mundiais no provimento de acesso à internet. Eu estava na agência que fez a campanha de lançamento no Brasil. Não adiantou alertarmos que não funcionaria a estratégia de entupir os brasileiros com CDs de instalação, distribuídos a rodo via mala direta ou em espaços públicos. Os americanos lidavam com catálogos, cupons e amostras grátis pelo correio com naturalidade, mas não os brasileiros.

A arrogância dos americanos em insistir no seu jeito de fazer foi certamente um dos motivos do fracasso da AOL no Brasil. Hoje, vemos McDonald’s inserindo picanha no seu cardápio brasileiro e servindo sanduíches em pães do tipo croissant na França. Pensam de forma global, mas agem de forma local, sem perder a sua essência. Mas são os princípios da sustentabilidade os maiores catalisadores do Glocal nos dias de hoje.

Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional das Agências de Propaganda) (alexis@fenapro.org.br)