Poucas manifestações, em toda a história da humanidade, passaram por processo de reinvenção permanente e intenso quanto o pão. E me refiro ao pão em si, não como usamos o pão com diferentes cremes, manteigas, recheios e tudo o mais. Até 2009 e na cabeça da maioria das pessoas, o pão tinha 12 mil anos de idade. Supostamente uma invenção ocorrida na Mesopotâmia, hoje, espaço de terra ocupado pelo Iraque. Até que em 2010 pesquisadores identificaram resíduos de amido em pedras milenares de moer, com uma idade aproximada entre 30 e 40 mil anos. E, de lá para cá, passou-se a desconfiar que o pão é muito mais antigo.

Nasci na cidade de Bauru, joguei no infantil do Baquinho, era treinado pelo Valdemar de Brito, e, todos os dias de manhã, meu pai ia até a Padaria e Confeitaria Lalai comprar pães. Na Rua Batista de Carvalho. Quando mudei para São Paulo, o pão era entregue pelo padeiro da Padaria Baronesa, nas esquinas da Baronesa de Itu com Albuquerque Lins. Nas madrugadas, quando voltava para casa depois da última música no Jogral, do Carlos Paraná, ao lado de Geraldo Cunha, Jorge Ben e Trio Mocotó, artistas e outras celebridades e saudosos e queridos amigos como Alfredo Rosa Borges e Paulo Vanzolini, dava uma passada na Padaria Basilicata, no Bixiga, para comprar um pão italiano da fornada das 5 da manhã. Que deixava na mesa da cozinha para meus saudosos pais, claro, e sempre com um beijo.

Nos anos 1960, a reinvenção dos pães ocorreu no bairro da cidade de São Paulo onde passei a maior parte da minha vida. Obra e graça de Benjamin Abrahão, e de sua padaria com sua família na Praça Vilaboim, em frente à FAAP, a Barcelona. E, de repente, não mais que de repente, da virada do milênio para cá, o fermento da inovação que sempre esteve presente na história do pão escalou! Neste preciso momento, considerando a revolução Maker, combinada com a revolução Perto, que varre o mundo, e com a valorização do orgânico, genuíno, raiz, artesanal, o pão, e respectivas padarias, vivem a maior releitura de toda a história. Hoje o Brasil tem milhares de jovens padeiros arrasando.

De novo, e perto da minha casa, duas manifestações espetaculares. Inclusive a Fabrique, na Rua Itacolomy, eleita pela
Folha a melhor padaria de São Paulo, assinada por José Carlos Gomes, economista de uma família de padeiros portugueses, formado pelo French Pastry School. Os próprios supermercados correram atrás, e hoje é possível comprar-se pão de ótima qualidade em algumas das lojas do Pão de Açúcar, Carrefour, Saint Marche e outros, e por aí vai. Semanas atrás, o Estadão, na revistinha de fim de semana, a D, de Divirta-se, apresentou um roteiro de 50 padarias. Mas, se quisesse, poderia multiplicar por 10. Mesmo porque as tradicionais e antigas reinventaram-se e voltaram a brilhar como nos melhores tempos.

E aí vocês me perguntarão, Madia, além de nos deixar com água na boca, por que mesmo você está fazendo esse comentário? Porque o pão, amigos, sobre todos os aspectos e sentidos, talvez seja a melhor manifestação, desde milhares de anos para cá, da importância decisiva e vital da permanente inovação. Do se reinventar, reposicionar-se, renascer, preservar-se vivo. Live! Do inovar ou morrer. Uma referência que deveríamos usar sempre em palestras, treinamentos, e indução de uma cultura de gestão de qualidade no capital humano de nossas empresas. Que todos, o tempo todo, comportassem-se em relação ao que planejam, produzem, fazem e vendem, como padeiros e padarias vêm se comportando e no correr de milênios em relação ao pão. Reinventando permanente, incessante e obstinadamente. Paro por aqui e agora vou dar um pulo até a Fabrique para um delicioso café e uma fatia generosa de seu pão de nozes…

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing (famadia@madiamm.com.br)