Por razões que a própria razão desconhece, e não obstantes os milhares de fracassos de sempre, o sonho e o coração prevalecem. E assim, como mais que previsto, aconteceu, novamente. O mais que bem-sucedido empresário Michael Klein, que recomprou a Via Varejo do Grupo Casino e em dois anos trouxe a empresa para o azul e crescendo de forma acelerada, decidiu, anos atrás, investir no território da aviação executiva. Seus amigos mais próximos tentaram demovê-lo da ideia; consultores a distancia fizeram sucessivos alertas; mas, o sonho era maior e irresistível. E assim, Michael Klein embarcou na aventura de colocar em pé uma empresa de aviação executiva relativamente parruda, A Icon Aviation.

Segundo Michael, além de sua paixão pelos aviões, a empresa da família, Casas Bahia, precisava de muita agilidade na locomoção de seus gestores. Ele, Michael, era um heavy user do táxi aéreo. Durante o período em que ficou distante da Casas Bahia, e enquanto o grupo Casino era o sócio majoritário, Michael decidiu comprar mais aviões e dedicar-se quase que full time ao negócio.

Ainda no mês de novembro de 2018, quando não tinha retomado o controle da Via Varejo, em entrevista para a revista Forbes, falava com emoção sobre seu negócio de táxi aéreo. Dizia: “Hoje temos dez hangares em diferentes aeroportos na região Sudeste com bases em Congonhas, no Campo de Marte, em Sorocaba, Santos Dumont e Brasília... Além do charter, investimos no atendimento em hangar para quem tem aeronave, em consultoria para a compra e venda de aeronaves, e em um novo sistema de propriedade compartilhada...”. E seguia em seu entusiasmo: “Em função da crise econômica muita gente que se desfez de aeronaves passou a fretar aviões e helicópteros. Investimos em uma frota nova e diversificada. Temos desde turbo-hélices para pistas de terra até jatos de médio e longo alcance, além de helicópteros. São mais de 30 aeronaves...”. Michael conta de seus hábitos no correr de sua trajetória junto com o pai e o irmão na Casas Bahia... “Sempre usei a aviação – meu pai e meu irmão também – para decidir, por exemplo, onde ergueríamos uma nova loja. No início fretávamos, e depois passamos a comprar, aviões e helicópteros. Com o tempo toda a diretoria da Casas Bahia passou a usar essas aeronaves na otimização do negócio... A gente ganha tempo, não fica preso no trânsito, é mais seguro, e conseguimos cumprir uma agenda bem extensa...”.

Era esse o pensamento de Michael, em 2018, quando ainda permanecia distante da Via Varejo. Corta para 2021, Michael Klein no Estadão, manchete: Michael desiste de investir no setor da aviação. E, na matéria, “depois de investir oito anos em aviação executiva o empresário Michael Klein se desfez do negócio e ampliou o foco de seus investimentos em imóveis e concessionárias. De 13 hangares e 33 aeronaves de sua empresa Icon Aviation sobraram dois aviões, dois helicópteros e dois hangares...”.

Assim, e como previsto, aconteceu, novamente. Todo o cuidado quando se mistura paixão com negócio. Se não conseguir preservar um mínimo de isenção e critério, a paixão falará mais alto e o negócio custará caro, muito caro. Michael atribui o fracasso à fatalidade. Diz: “Não foi um erro apostar em aviação executiva. É um mercado muito dinâmico. E acredito ter sido bom passar por essa experiência. Como não foi rentável, decidi sair do negócio...”. Rabelais, escritor, médico e padre, do Renascimento, alertava: “O homem nasceu para trabalhar, tal como o pássaro para voar... Alguns homens, no entanto, não resistem a tentação de trabalhar, literalmente, voando...”

Quase nunca dá certo... E, quando dá, é por pouco tempo...

Francisco Alberto Madia de Souza é consultor de marketing famadia@madiamm.com.br