A cada ano, diversas adaptações e mudanças ocorrem nos comportamentos e padrões de consumo da sociedade - sejam relacionadas a preferências por serviços e produtos, atendimento ou até mesmo formas de pagamento. Um estudo global sobre consumo da PWC, por exemplo, mostrou que, em 2023, o canal físico segue sendo o preferido dos consumidores (43%), mas o consumo pelo celular chegou a quase 40% em 2022.

Um outro levantamento feito pelo NG.CASH com mais de 1 milhão de participantes da Geração Z, com pessoas com idades entre 13 e 24 anos, revelou que, no primeiro trimestre, o público elegeu o PIX como principal método de pagamento (49%). Ao mesmo tempo, o cartão de crédito ocupa pouco mais de 40% das transações feitas por essas pessoas.

Nos últimos anos e meses, tenho acompanhado de perto os novos hábitos dos brasileiros. Já realizei projetos para diferentes marcas, que estão percebendo que não dá para pensar em consumo sem compreender as pessoas e seus contextos sociais, culturais e familiares.

E, com base nos projetos desenvolvidos ao lado de grandes players, observei alguns padrões da sociedade em relação ao consumo nos últimos meses - e que deverão guiar as tendências de comportamento para 2024.

1.  Sustentabilidade conceitual
A sustentabilidade permeia muitos dos comportamentos e decisões de consumo. Mas, em muitos casos, aparece mais como um conceito do que, de fato, algo incorporado e compreendido na prática.

Muitas pessoas buscam marcas que falam sobre sustentabilidade e que oferecem atributos sustentáveis, mas, quando vamos destrinchando, vemos que a consciência ambiental e sustentável ainda é, para muitos, bastante superficial - assim como a disponibilidade para implementar medidas sustentáveis no dia a dia. Claro que contextos sociais impactam nesses comportamentos mas, de forma geral, vemos que a temática tem muitos lados.

As marcas consideradas sustentáveis representam, em muitos casos, o que o consumidor deseja ser ou, de certa forma, implementar em seu dia a dia - e há diversas sustentabilidades. Existem diversas oportunidades para se comunicar com essas pessoas e estabelecer conexões de acordo com suas demandas, dores e desejos. Sustentabilidade é um macro tema - mas, dentro dele, existe um universo muito vasto.

2.  Deslocamento e ressignificação do trabalho
Em muitos dos estudos que participei, a ressignificação da relação com o trabalho e a busca por mais equilíbrio, principalmente emocional, se destacam. Depois do cenário pandêmico, as percepções de muitas pessoas em relação àquilo que valorizam foram atualizadas e alguns comportamentos já estão sendo transformados - a forma como "alocam" o trabalho em suas vidas,a vontade de preservar e fortalecer vínculos e afetos e, assim, ter mais momentos em família/amigos, a valorização e busca por viagens e momentos off, entre outros.

Há um processo de desengajamento crescente na relação com o trabalho, que é driver e também consequência dessa ressignificação. Esse movimento revela uma mudança, e que é preciso entender quais são as raízes disso. É importante compreender os gatilhos para que elas aconteçam. Quase tudo vem de desconfortos e angústias emocionais - sentimentos poderosíssimos para guiar mudanças comportamentais.

3.  Redes sociais x saúde mental
As pessoas têm relações duais com o uso das redes sociais e isso gera angústia - afinal, como ter mais equilíbrio para que isso não impacte tanto a saúde mental?

Sentimentos como   ansiedade   e  inadequação   são  comuns,  mas  acabam  sendo equalizados" por sensações de pertencimento, por exemplo. E, assim, um ciclo de angústia e alívio se estabelece como um looping.

Percebemos que as pessoas têm assumido mais essa situação e buscado recursos de ajuda de forma mais recorrente: momentos de detox das redes têm ganhado cada vez mais valor - por exemplo: deletar o app do Instagram por alguns dias, assim como estabelecer horários para o uso das redes sociais têm sido alternativas relevantes. Tudo isso cria rituais que antes não existiam e há muitas oportunidades para que as marcas possam fazer parte desse momento.

4.  Educação e consciência financeira
A busca por mais educação e consciência financeira tem aparecido com bastante relevância nos estudos do ateliê. No Brasil, há alguns anos, tivemos o boom do uso do cartão de crédito e, um pouco mais recente, dos bancos digitais. Tudo isso impactou, e impacta, muitos dos comportamentos de consumo no universo financeiro.

Há muitos brasileiros que tiveram que lidar com dívidas e que, na época, não sabiam muito bem o que deveriam fazer ou de que forma os juros aconteciam na prática, por exemplo, e que, hoje, têm muito mais conhecimento a respeito do tema.

Muitas pessoas têm vontade de saber mais sobre investimentos, como organizar os gastos, alcançar maior estabilidade e autonomia financeira, mas ainda se sente um muito confuso. Há uma grande oportunidade de levar educação e consciência financeira para muitos brasileiros - isso pode parecer meio óbvio, mas o ponto é que pode ser feito de diversas formas e isso varia de acordo com diferentes contextos - não podemos tratar da educação / consciência financeira de forma homogênea, porque há muitas nuances dentro disso.

O impacto dos novos padrões de consumo no mundo corporativo
A ressignificação na relação com o trabalho e o balanço do uso das redes sociais, por exemplo, são comportamentos que vêm ganhando cada vez mais força e que, de certa forma, têm um aspecto mais "urgente" para as pessoas- afinal, os impactos emocionais são sentidos diariamente.

Acredito que muitos comportamentos de consumo serão impactados por isso, pautados por novos hábitos, buscas e valores. É importante que as marcas se preparem para mudanças comportamentais relacionadas a esses dois temas e que possam adaptar e atualizar não só seus produtos e serviços, mas suas comunicações, conceitos e até culturas.

A partir desse cenário, os players mais atentos e inovadores já estão resgatando um olhar mais humano e integrado. Essas empresas querem se aproximar dos seres humanos e entender além do briefing.

Compreender esse processo é muito importante para que o mundo corporativo possa, enfim, se comunicar e se conectar com seus públicos de maneira mais integrada e consistente.

Julia Ades é fundadora e head de conteúdo da Apoema