Então é Natal, e o que você fez? O questionamento da tradicional canção Então É Natal, imortalizada na voz de Simone, é um convite para uma reflexão de o que fizemos no ano passado. Assim como a letra da música, irei te fazer um convite para refletir sobre suas ações para transformar o mercado publicitário em um local mais plural, mais apaixonante, menos tradicional e mais contemporâneo. Confesso que fiquei surpreso com o saldo positivo da minha reflexão de fim de ano. O projeto #BlackSquad, na Mynd, vem dando frutos e potencializando vozes negras e periféricas através da publicidade. Personalidades pretas estão sendo reconhecidas pelo seu lugar de fala, obtendo voz nos mais variados assuntos e recebendo valores condizentes com suas entregas e KPI’s.

Ainda temos muito o que fazer, é verdade. Porém, o saldo até aqui é mais que positivo. O prêmio Potências! A premiação do agora foi um sucesso, uma noite na qual celebramos a negritude como potência e não exceção. Nomes como Tia Má, Ludmilla, Iza, Gil do Vigor, Christian Malheiros, Jéssica Ellen, Camilla de Lucas, Rebeca Andrade, Djamila Ribeiro, Mc Soffia, Helena Bertho, Gilberto Gil e Mano Brown tiveram uma noite preta e cheia de reconhecimento pelos trabalhos que fizeram o ano de 2021 muito especial para a negritude brasileira.

Inatimi Nathus/Unsplash

Nem no meu sonho mais incrível eu poderia ter pensado em uma noite tão especial, noite de Rincon Sapiência, Mariah Nala, Preta Gil, Negra Li, Mc Soffia e Urias. Noite de encontros, como Preto Zezé, Raull Santiago, Mano Brown e outras personalidades celebrando o poder do agora. Os portões de Wakanda estão abertos e estamos ocupando os lugares que antes éramos barrados ou, no máximo, acessávamos pela entrada de serviço. Outro saldo positivo que tivemos foi o aumento da negritude presente nas listas e premiações da comunicação. Poder aplaudir Samantha Almeida, Felipe Silva, Gabriela Rodrigues e outros nomes em um dos mais tradicionais prêmios da comunicação realmente foi uma sensação especial, a sensação de que estamos chegando. Confesso que em um determinado momento pensei: “estão deixando a gente sonhar”. Porém, logo mudei para “estão deixando a gente chegar”. Chegar aos lugares que deveríamos estar há muito tempo. Lugares que deveríamos ser a maioria e não a exceção. Lugares nos quais deveríamos estar abertamente conversando sobre assuntos como o montante de dinheiro que a comunidade negra movimenta - segundo dados do Instituto Locomotiva, a população negra movimenta R$ 1,9 trilhão em renda própria por ano no Brasil. E, claro, lugares para estarmos comemorando a negritude como potência e não como a cota de profissionais, artistas, empresas e afins.

Estamos chegando, poderosos! Estamos sonhando e sendo referência para os outros que virão. Como diz Samantha Almeida, “somos a última geração de primeiros”. Somos a geração que está construindo pontes, abrindo caminhos e sonhando. Em breve, teremos pretos nas agências, nas escolas, nas universidades, nos prédios e em lugares que durante décadas os portões estavam fechados para nossa entrada. Chegamos e ocupamos o nosso local de direito. Imagina só: preto sonhando e realizando. Isso é, sem dúvida, motivo de muita alegria de nossos antepassados. Poucos anos se passaram desde a frase “eu, pessoalmente, não botaria um preto nos meus comerciais, porque eu acho que o preto desvaloriza o produto anunciado”, dita por um dos publicitários da “velha guarda” brasileira. Hoje, famílias pretas estão sendo celebradas em campanhas de Natal, de bancos e, pasmem, até de margarina. Você acredita?

Somos a geração que está ensinando aos nossos que podemos sonhar, podemos realizar e temos até personalidades para nos espelharmos. Ô sorte da geração que terá referências tão incríveis, que fazem de tudo para transformar o Brasil e todo um mercado mais justo e plural. Hoje, assim como aconteceu na marcha de Selma a Montgomery, temos uma negritude andando de braços dados sobre uma ponte construída por mãos pretas que será caminho para toda uma geração de novos doutores, professores, publicitários, artistas e outras profissões onde a negritude será potência! Ainda temos muita luta pela frente. Ainda temos muita pedra e capim para tirarmos do caminho. Mas, mais cedo ou mais tarde, as mudanças vão chegar. Estou extremamente ansioso para saber o que 2022 nos reserva. Quais os motivos para comemorarmos, quais as vitórias que teremos, quais personalidades pretas que surgirão, quais pautas iremos levantar, especialmente em um ano que será crucial e importante para o futuro do país. Reflexão feita, o play na canção foi dado, e o pensamento positivo foi lançado! E mais uma vez: senhoras e senhores, chegamos. E daqui nunca mais iremos sair.

Julio Beltrão é head do núcleo de Pretos da Mynd, agência de marketing de influência e entretenimento