Eu sou homem, cisgênero, maduro – já em idade de aposentadoria, mas ainda trabalhando muito –, branco, casado com a mesma mulher há muito tempo, tenho um filho adulto, pratico tênis e me exercito todos os dias e moro em grande condomínio urbano em São Paulo.

Num mundo onde dados são o novo petróleo, informações detalhadas dessa forma são preciosas, mas não as fornecemos assim tão fácil. Pelo menos, não conscientemente.

Aliás, vivemos momento paradoxal: por um lado, esmiuçar dados pessoais pode ser considerado invasão de privacidade, mas, por outro, assumir posições com relação a idade, cor e preferência sexual pode ser encarado como uma atitude desejável.

Os RHs de empresas já adotam seleção de potenciais colaboradores às cegas, ocultando do currículo do candidato idade, cor, gênero, estado civil e até a faculdade em que estudou.

Tudo para evitar vieses na hora de contratar. Por outro lado, se o objetivo é uma ação afirmativa, no sentido de minimizar alguns gaps na empresa, tais informações são a base da seleção.

Explico: se uma empresa identifica que tem colaboradores pretos ou pardos em número bem menor que o perfil Brasil, ela pode implementar processos de seleção só para candidatos que se declaram com essas características.

Tem sido comum, em eventos, palestrantes se autodescreverem, como eu fiz no primeiro parágrafo deste artigo, como forma de permitir que deficientes visuais tenham mais informações sobre seu perfil. Nas redes sociais, muitos não têm a mínima preocupação em se expor, postando o seu dia a dia sem filtro, do café da manhã à balada.

Programas do tipo  reality show têm enormes audiências, com milhões interessados nos barracos dentro de uma “casa” e na intimidade revelada. Somos voyers da vida real. Adoramos saber detalhes da vida de famosos ou quase famosos ou mesmo não famosos. Mas, ao mesmo tempo, ficamos possessos quando sabemos que nossos dados foram garimpados e utilizados nas teias digitais. Adoramos serviços digitais gratuitos, mas nos esquecemos que o uso dessas ferramentas de gratuito não tem nada.

Nosso pagamento é a abertura do nosso diário aos gestores dessas plataformas, que fazem milhões, bilhões, com nossos dados. Essa é a lógica por trás dessa gratuidade. Você pode até bloquear informações, mas vai ter de se contentar com limites na utilização de serviços.

É o paradoxo que estamos vivendo. Ao conhecer nossos hábitos com maior profundidade, as plataformas digitais podem oferecer produtos e serviços adequados ao nosso perfil, mas, para isso, você precisa topar dividir sua jornada e dados pessoais com eles. Estamos vivendo agora um estágio mais preocupante de uso de dados.

A inteligência artificial generativa, ao mesmo tempo em que provoca wows de admiração, suscita preocupação quanto aos limites de uso de dados e da atuação de máquinas no lugar de humanos.

Não há dúvida de que os dados processados farão parte, cada vez mais, das nossas vidas, seja no campo pessoal como profissional. Não há dúvida também que o armário de pessoas LGBTQIA+ estará cada vez mais escancarado, com seus representantes batendo no peito dizendo: “sou sim, e daí?”.

Todo o preconceito ainda existente está sendo minado e isso é muito bom! É ridículo estereotipar pessoas e defini-las pelas suas características físicas ou de idade ou de origem, ou ainda de preferência sexual. Em outros tempos, pessoas com a minha idade estavam fazendo palavras cruzadas e arrastando chinelos pela casa.

Hoje – e cada vez mais – pessoas acima de 60 são superativas e ainda capazes de estender por um bom tempo sua carreira profissional.

Nosso sonho é que tais preconceitos logo logo sejam coisa do passado e você e eu possamos viver nossas vidas com plenitude, sem o olhar crítico de quem quer que seja.

Alexis Thuller Pagliarini é sócio-fundador da ESG4
alexis@criativista.com.br