O sucesso da inteligência artificial na comunicação será sustentado por um único fator: a mediocrização do processo criativo. Óbvio. Primeiro, baixa-se o nível de exigência na elaboração das ideias, depois trabalha-se coletivamente o consenso, ou seja, a ideia média que será aprovada. Repita-se esse processo em milhares de jobs, em todas agências, de todos os lugares. Pronto. Já temos dados suficientes para alimentar algoritmos capazes de atender ao novo padrão da propaganda.

Podemos dispensar todos os criativos, ou melhor, os derradeiros criativos. Essa gente que ainda cobra para trabalhar, porque acha que precisa ser brilhantemente original.

É muito mais confortável e barato adotar um aplicativo do que sustentar um profissional frustrado com a exigência de que exerça a sua profissão abaixo da sua capacidade, de que perca tempo precioso em reuniões inúteis, de que se desgaste, tentando demonstrar o valor de uma boa ideia a uma corporação que não quer arriscar, que só se ocupa de retroalimentar um sistema cômodo para a falta de talento.

É verdade que já tentamos de outro jeito, colocando júniores como se sêniores fossem, mas eles e elas também tinham ambições, queriam ganhar prêmios, pediam aumento salarial, chegavam até a brigar por ideias, o cúmulo! Então, corremos para os estagiários, em tese, gente mais fácil de ser moldada para atender os nossos propósitos inibidores do processo criativo.

Mas eles são de uma geração mais independente e, decepcionados, conosco, dão o fora, e acabamos nas mãos dos frilas.

Campanhas gigantescas, verbas importantes em nossas mãos, e a gente no telefone, caçando alguém que tope criar, num fim de semana, o que levamos seis meses “planejando”. Parece que esses frilas esqueceram que, quando no mercado, trabalhavam todos os fins de semana.

Estávamos dispostos a pagar cinco mil reais, até sete ou oito, quem sabe, dez, por um único fim de semana de trabalho, grana que pagávamos pros pobres dos júniores por mês. E os frilas dizendo que por esse dinheiro não fazem. Uma ameaça para o futuro do negócio.

Felizmente, mentes privilegiadas da tecnologia da informação vêm em nosso socorro, trazendo a solução mais econômica, prática e disciplinada, que poderia existir: a inteligência artificial. Acabou o sofrimento, acabaram-se os atrasos nas entregas, acabou o desgaste das discussões internas. Agora, é pá, pum, tudo se resolve em segundos e do jeito certo, indiscutível. Não há razão para não aprovar uma campanha.

Trata-se de lógica, pura e simples. As soluções são incontestáveis, não há o que contradizer, acabou a era do “eu acho”, “eu prefiro”, “gostaria de ver mais opções”, não, não existem mais opções, ela é única e matematicamente perfeita, suficientemente pobre para que todos percebam que não estarão correndo riscos, suficientemente simplória para que não gere conflitos, suficientemente barata para que caia no gosto dos clientes.

Antes que eu me esqueça: o último a sair não precisa apagar a luz. A IA faz isso também.

Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing
stalimircom@gmail.com