Na esteira do escândalo levantado por um estudo da Social Puncher, reportado por importantes órgãos da imprensa americana, o CEO e a CFO do Newsweek Media Group renunciaram, buscando minimizar as graves responsabilidades da organização, que através de seu site, International Business Times, montou um esquema fraudulento global para entregar uma “compra de cliques” que lhe havia sido encomendada por uma agência federal dos Estados Unidos – com a complacência de uma conhecida agência digital e até da DoubleClick (uma empresa do Google).
A campanha havia sido contratada pelo Consumer Financial Protection Bureau, que tem por objetivo proteger consumidores americanos de desvios praticados por financiamentos de casas, educação e outros. O target, evidentemente, era pessoas que moram nos Estados Unidos e o site é dedicado justamente a esses temas financeiros. O IBTimes ficou com 44% da verba, mais do que outros com maior reputação e audiência, como o CNN Money (que levou 29%).
O negócio foi feito pela agência GMMB e a execução gerenciada pela DoubleClick.
Como a obrigação de “entrega de cliques” não vinha sendo alcançada, o IBTimes lançou mão de diversos expedientes fraudulentos, como mascarar os cliques feitos em outras campanhas como se fossem desse cliente, usar sites internacionais (que não atingiam o target) e outros mecanismos de geração indevida de resultados, que acabaram rendendo as devidas comissões aos participantes do processo e até mesmo levaram dinheiro do governo para sites piratas e constantes da “lista negra” das autoridades dos EUA.
Diante da gravidade da denúncia, integrantes do escritório da Promotoria Pública de Manhattan recolheram computadores na sede do Newsweek Group e o Congresso Nacional entrou em polvorosa, pois a agência havia sido criada pela maioria Democrata, contra a vontade dos Republicanos, que obviamente vão utilizar esse caso para tentar fechar ou limitar sua atividade.
Este caso, somado ao recente escândalo da anabolização fraudulenta de seguidores de celebridades e especialistas no Twitter e a tantos outros que têm vindo a público nos últimos anos, reforça a necessidade de se fazer uma profunda limpeza na estrutura conceitual e na prática operacional da maior parte das operações da mídia digital, em especial as de maior relevância, que estão crescendo e ocupando o lugar das mídias tradicionais nos principais mercados publicitários.
A ausência de legislação reguladora nacional e transnacional, a falta de critérios robustos de execução das campanhas digitais e de mensuração dos seus resultados, a não existência de controle independente do que os gigantes digitais afirmam obter e outros fatores se somam para prejudicar os demais meios em muitos aspectos,
da apropriação indevida de suas propriedades intelectuais à operação em condições unfair (injustas), uma vez que as organizações tradicionais se impõem regras e limites às quais estão sujeitas e habituadas há décadas.
Também está no âmago dos graves problemas a serem solucionados o modelo de cobrar, cada vez menos, por resultados de audiência e ação “comprovados”. Como esses valores não são suficientes para cobrir os custos de investimentos e operação das mídias digitais, especialmente no caso dos menores, o setor não tem gerado rentabilidade suficiente para se manter de forma saudável – com exceção dos megacontroladores da área e dos que apelam para esquemas fraudulentos.
É evidente que este é um modelo insustentável e demandará a atuação de todos para ser profundamente alterado – de governos aos grandes anunciantes e as organizações de mídia sérias e responsáveis.
Rafael Sampaio é consultor em propaganda (rafael.sampaio@uol.com.br)