Ninguém mais dúvida de que a Inteligência artificial (IA) transformará radicalmente os meios de produção nas próximas décadas, substituindo parte de nossas atividades humanas por algoritmos e robôs mais eficazes e de menor custo. Estima-se que a indústria vá movimentar cerca de 190 bilhões de dólares em 2025, crescendo exponencial nos anos seguintes.
No entanto, o mais interessante não é quanto está sendo investido e, sim, quem está liderando o desenvolvimento e a aplicação dessa tecnologia? Não são os EUA nem tampouco qualquer país da Europa. A China já é o principal centro de inovação em IA do mundo. Startups chinesas já capturam 48% dos investimentos globais em IA e, se depender do governo a distância em relação aos demais países vai crescer ainda mais.
E não é só de dinheiro que estamos falando. Como qualquer nova tecnologia, IA demanda novas competências e talentos profissionais e um investimento ilimitado em pesquisa. Na China, são graduados anualmente cerca de 4,7 milhões universitários nas áreas de ciências, matemática, engenharia e tecnologia, quase o dobro da Índia e nove vezes mais do que nos EUA. Pesquisadores e estudantes chineses foram responsáveis pela publicação de mais de 35 mil artigos e citações científicas em 2017, superando os EUA e a Índia juntos.
Modelos e algoritmos dependem do acesso a um grande volume de dados e informações sobre consumidores e cidadãos. Quem são, o que eles compram, como e quando se locomovem, como se comportam nas redes sociais e o conteúdo que consome na internet, todos esses dados são o combustível essencial para a construção de soluções de IA capazes de prever o nosso comportamento e necessidades futuras de forma mais personalizada e assertiva.
Estima-se que a China seja responsável por cerca de 20% dos dados produzidos em todo o planeta (44 trilhões de Gigabites) e que, em 2030, este percentual seja superior a 30%. Somando-se isso ao fato de que o país não possui uma lei de privacidade que estabeleça limites para manipulação dos dados pessoais dos cidadãos, ao contrário da maioria das nações, incluindo o Brasil, cria-se um ambiente com ampla liberdade para que o Governo e a iniciativa privada desenvolvam novos algoritmos e aplicações em áreas tão distintas quanto redes sociais, saúde, serviços públicos, vigilância e defesa nacional.
E não se trata de um projeto para o futuro, pois os resultados já são visíveis. Um estudo da comissão europeia apontou que 50% das patentes de IA no mundo foram registradas pela China. Atualmente, já existem mais de 1100 aplicações comerciais de IA implantadas no país, lideradas principalmente pelo partido chinês.
O Governo trabalha para que a Inteligência Artificial seja parte do cotidiano da população e, enquanto a maioria dos países encontra dificuldades em suas primeiras iniciativas para digitalizar seus serviços essenciais, a China está construindo uma cidade inteiramente inteligente. Xiongan, localizada a cerca de 100 km de distância de Pequim, é a primeira cidade inteiramente inteligente do mundo. Sensores irão capturar dados da população, de suas casas e veículos e algoritmos otimizarão a distribuição de água e energia, as rotas de trânsito, fazendo melhor uso dos recursos públicos e devolvendo ao cidadão mais qualidade de vida e melhor retorno pelos impostos pagos.
O mais determinante é que, por trás de todos esses esforços, há um plano nacional estruturado pelo Governo para que o país assuma a liderança mundial de IA, garantindo o investimento dos recursos necessários (130 bilhões de dólares até 2030), foco e obediência por parte das várias esferas públicas.
O que está em jogo é a liderança mundial em uma tecnologia que será determinante para o futuro da humanidade, pois todos os sistemas, como soluções nas áreas de saúde, agricultura, economia, educação e defesa nacional terão algum nível de IA embutido em seu código. Segundo Vladimir Putin, “o país que liderar a Inteligência Artificial vai controlar o mundo”. Por isso, se quisermos nos beneficiar de uma parte, ainda que pequena, desse novo mercado, precisamos reagir antes que a distância seja grande demais.
Marcelo Sousa é diretor-executivo da Marketdata e presidente da Abradi. O executivo está participando do SXSW 2019 em Austin e produziu o conteúdo inspirado na palestra intitulada “How A.I. Is Changing Advertising in China”, de Bessie Lee, fundadora e CEO da Withinlink