Engraçado como a gente se acostuma com as coisas. O ser humano se adapta às condições que lhe são apresentadas de uma maneira muito consistente. “Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças”, frase atribuída a Charles Darwin, mas que dizem que ele nunca a proferiu, combina bem com os tempos que estamos vivendo. A teoria atribuída ao barbudo é boa, não há de se negar.
Mas, com vênia a Charles, ainda não me acostumei com muitas coisas desses tempos estranhos: não me acostumei a ficar em casa como se estivesse em prisão domiciliar, não me acostumei a não fazer happy hours, não me acostumei a cumprimentar os outros com o cotovelo, não me acostumei a encontrar minha mãe e não dar um beijo e um abraço bem apertado nela. Ou seja, sou péssimo em adaptação, o que pode levar ao meu desaparecimento da face da Terra muito rapidamente.
Mas, só pra contrariar a mim mesmo, com as máscaras eu me acostumei. Hoje, eu ando de máscara, dirijo de máscara, corro de máscara. Recebo o cara da NET de máscara, ando de elevador de máscara, vou pra academia de máscara. Devo ter uma quantidade de máscaras maior do que eu tenho de cuecas, ou de meias. Quando, por esquecimento, saio na rua sem colocar uma, que, invariavelmente está no meu bolso, me sinto quase pelado. Constrangido, com as minhas intimidades faciais de fora. E essa foi uma adaptação mesmo, uma mudança de avaliação radical pra mim. Antes da pandemia, achava muito estranho cruzar com pessoas usando máscaras nos aeroportos pelo mundo. Geralmente orientais, me davam a impressão que não queriam se misturar com o resto da humanidade. Uma coisa meio blasé. Era cuidado. Ou então médicos, enfermeiros e dentistas, esses obrigados a serem mascarados eternamente por força da profissão. Eu me perguntava: como esses caras aguentam trabalhar assim o dia todo? Bem, não foi uma adaptação fácil, mas rolou. Pra mim é bem natural usá-las. Mas o uso de máscara está nos levando a uma espécie de gafe social, pelo menos a mim. Como sou míope e uso sempre lentes que invariavelmente estão mais fracas do que seria o necessário, eu parei de falar com as pessoas.
Eu já não era bom fisionomista vendo o rosto inteiro das pessoas, imagina vendo só os olhos! Não é incomum encontrar alguém, ficar olhando, olhando, e essa pessoa perguntar: Ué, não tá me conhecendo, não?!!!! Mas eu desenvolvi uma técnica que tem me ajudado bastante: eu completo o reconhecimento das pessoas pelas máscaras que elas usam. A máscara está virando uma espécie de marca registrada de cada um.
Tem o cara que usa aquela N95, o que representa uma pessoa bem preocupada, que foca na proteção profissional. Têm aqueles que usam máscaras esportivas, mesmo sem estar praticando atividade física, o que já ajuda a identificar outro tipo de pessoa. Ah, esses também usam o tênis do Ironman para ir ao restaurante. Têm os que usam uma máscara 3M, e imediatamente imaginamos uma pessoa focada em inovação científica, o que já facilita no reconhecimento. Temos os das máscaras com válvulas, sinal inequívoco que ali atrás está um amigo seu que sonha em ser astronauta. Bingo. Bem, e por aí vai: máscara de grife, máscara de couro, máscara de lenço, máscara com estampas variadas. Adoro a máscara do Mengão, que o nosso vice-presidente usa! Eu, apesar de ter uma variedade de máscaras que me foram presenteadas, uso aquelas bem simplesinhas. Quando cruzar por mim, por favor, cumprimente. Por trás dessa máscara tem um cara legal.
Rodolfo Sampaio é sócio e CCO da Moma (rodolfo@momapro.com.br)