Às vezes eu me sinto andando em looping falando sobre as tendências do mercado de influência na Internet, você não tem essa sensação? Como se a gente não tivesse ainda aprendido o básico, dizendo sempre as mesmas coisas, apenas mudando a alegoria de inovação para prender a atenção do leitor. Porque em termos de ferramentas tecnológicas continuamos avançando e trazendo para as mãos de todos, perceba – todos – a possibilidade de influenciar em alta escala. No entanto, sem amadurecer os conceitos do que é influenciar em uma comunicação DA massa, na minha perspectiva, é como se tanto os produtores de conteúdo quanto as marcas consolidadas estivessem andando em uma Ferrari, só que com os olhos vendados – achando que é um fusquinha. Nada contra os fusquinhas, eu quando mais nova admirei muito o charme que existe nessa máquina, mas a potência de um fusquinha, como estrutura, é diferente de uma Ferrari. A pergunta é: você sabe dirigir uma Ferrari? E se eu te dissesse que essa Ferrari não é sólida, como você sempre aprendeu? Ela é um holograma, que estaciona em nuvens tecnológicas e por isso precisa de um piloto mais leve, com um novo estado de ser. O que você precisaria mudar em você e na sua empresa para não cair dessa plataforma virtual?
Toda construção de um novo mercado passa por ciclos de desenvolvimento, desde o momento em que a ideia é testada em bolhas de consumo, no qual empresas enfrentam o desafio de se manterem, até que as bolhas se conectem e mais pessoas comecem a perceber o valor daquele produto – seja ele qual for. Para as empresas que conseguiram se sustentar nessa primeira onda, este segundo instante se torna então o momento de nadar de braçada, mas rápido, porque outros estão vindo e muita baleia azul vai tentar engolir a sua expertise. E aos poucos diversos peixes graúdos vão entrando neste mar, e a sua resiliência aliada ao tempo e habilidade de navegação poderão lhe trazer, enfim, o reconhecimento do seu lugar no oceano. É o momento em que se diz que o mar então começa a ficar vermelho devido à competição entre as empresas, até que se busque novamente um novo oceano ainda não explorado. Pois bem, eu mesma já usei muito essa metáfora da liquidez para falar dos negócios e da sociedade, mas atualmente, se você me perguntar qual é a tendência do mercado digital, eu te diria que está em perceber o nosso estado de ser muito mais ligado a um comportamento aéreo, invisível e, inclusive, mirando o espaço.
Ok, eu poderia estar falando aqui sobre a consolidação dos modelos de monetização através do digital, seja com moedas e carteiras virtuais, self-commerce, processos de pagamentos rápidos e cada vez mais seguros, acontecendo desde um aplicativo a uma rede social, ou até mesmo sobre o mercado de conteúdo digital como fonte de transação financeira e investimento puro. Porém, na minha visão, isso é apenas perfumaria e evolução natural de qualquer negócio. Se você der um Google aí vai encontrar informações com detalhe sobre tudo isso. É fato dado, já é. O que eu proponho refletir através desse artigo é o quanto nós estamos preparados para atuar com consciência em nosso negócio e na vida com a sociedade conectada.
A tecnologia é apenas um reflexo das mudanças interiores que viemos fazendo em nós, como seres humanos. E é isso que eu amo ao olhar para a Internet, como um ambiente de interação das pessoas. Nós mudamos de plataforma, nos comunicamos através de avatares, logins, outros nomes que criamos para existir. Multiplicamos nossas identidades e passamos a estar, de fato, conectados com o mundo inteiro em apenas um clique. Estamos, oficialmente, sob o mesmo céu, que te traz uma amplitude ainda maior que o mar. Você não consegue nem ver onde está. E isso pode ser perturbador para quem ainda está aprendendo a nadar. Afinal, mar e céu compõem a mesma paisagem.
Isso nos traz o mar com a sociedade líquida, que Bauman tanto falou, no qual homens e mulheres ainda estão aprendendo que seus papéis são líquidos, e que as relações sociais, econômicas e de produção são frágeis, fugazes, maleáveis e que derretem. Um lugar no qual ainda temos muitas pessoas, empreendedores, consumidores e empresas sofrendo e, às vezes, “apanhando” por ainda não aceitarem o quanto elas são vulneráveis. E que, sim, algo que era muito sólido, no passado, pode se desfazer com a evolução da sociedade. Quem se encontra aqui ainda resiste muito em perceber as possibilidades que o mercado digital traz, por mais que esteja atuando nele. Costuma possuir tímidas experimentações, ou tenta ser básico – estar por estar porque todo mundo está, e pode chegar ao ponto de se arrepender de algum projeto, produto ou post quando acha que perdeu o controle, voltando rapidamente para se segurar na terra. Porque quando pensamos no oceano, por mais água que se tenha, ainda é possível jogar uma âncora e se fixar em um ponto, apesar das turbulências. Por isso, é usual destes “navegantes” se apegarem às dificuldades que este novo estado da “água” lhe provoca. Quer a sensação de conforto e controle sobre a segurança virtual e as fake news, mas insiste em manter o mesmo corpo que lhe trouxe até aqui.
Porém, quando olhamos para o céu, já vemos as nuances de uma sociedade gasosa, que percebe que precisa ser leve em suas relações sociais, econômicas e de produção. Só que para ser leve, você precisa se desapegar de muita coisa que você julgou essencial até agora, e, inclusive, mudar sua própria estrutura. Não nascemos com asas, criamos. E esse processo de transmutação pode inclusive parecer caótico à primeira vista, se deixamos as nossas inseguranças dominarem o processo. Neste local, encontramos mulheres e homens, por exemplo, que já adaptam seu corpo fisicamente para o invisível que mora em cada um deles, percebemos empresas que possuem, de fato, o mind set global, e que têm em sua estratégia a contratação de estrangeiros para a construção de produtos com o core internacional – independente de onde eles residam fisicamente. São “navegantes” que buscam aprimorar seu equilíbrio interno com a experiência e o conhecimento, e não com a posse de muitos artefatos, pois estes o tornam pesados neste primeiro momento de mutação. E estão desenvolvendo a capacidade de descansar em pleno vôo, com as asas abertas, enquanto o vento lhe direciona para a melhor estação. Não percebem a Internet como uma ferramenta externa ou uma plataforma onde a vida não é real, mas já a aceitam como parte de seus dias, tornando a experiência orgânica e não amedrontadora – buscando sabedoria em suas ações e aprendizados nas dificuldades, como em qualquer processo de ambientação.
Ganhar céus não significa renunciar ao passado líquido, mas desaprender determinados movimentos para desenvolver novas soluções criativas para o seu negócio e para a sua vida. Ao se derreter, você percebeu que é possível atuar em outros papéis para influenciar: homem que é mulher, mulher que é homem, agência que vira produtora, produtora que vira canal, canal que vira marca, marca que vira conteúdo, conteúdo que vira consumo, consumidor que vira influenciador. E agora faz parte do mindset de uma sociedade gasosa e virtual atuar em uma era da transparência, onde todas as informações destas experiências estão à mostra. Nunca foi tão fácil aprender sobre qualquer coisa no mundo. Um cientista no Brasil, por exemplo, aprende com os avanços da medicina na Rússia, um conteúdo da China inspira influenciadores nos Estados Unidos, uma empresa alemã contrata uma pesquisa desenvolvida na Austrália, e o céu tende com o tempo a se tornar algo rotineiro em nosso processo de aprendizado. Percebendo que quanto mais estivermos abertos para compartilhar e conversar, mais estaremos aptos a trazer novas formas para a nossa estrutura.
Óbvio que, durante este processo, iremos lidar com a falta de consciência e responsabilidade humana ao ter acesso a todas essas informações. Vamos cometer excessos, enquanto estamos ainda aprendendo a lidar com esta liberdade, ao mesmo tempo em que pilotamos aviões no ar. Quem nunca escutou essa expressão antes? Por isso, cabe a cada um de nós, buscar o desapego em todas as instâncias para consolidar este mindset mais leve e de conexão invisível. Alguns exemplos:
– Colaboração: não é reunir todos para um mesmo objetivo no qual é preciso chegar a um consenso sobre um único caminho. Desapegue da ideia de que a colaboração é feita com todos de braços dados, concordando sobre tudo. Isso é medo de tomar decisão e o seu negócio pode afundar com o peso da falta de direção. Em uma sociedade gasosa, é preciso soltar as mãos das pessoas, confiando na responsabilidade delas de voo. Você pode até dizer a direção, que pode mudar inclusive com o vento. Mas, assim como acontece com os pássaros no céu, cada pessoa é livre para fazer o caminho da forma que quiser. Colaborar é delegar e ser surpreendido com novos desenhos que o coletivo forma ao voar em bando no céu. É incentivar a independência e o crescimento do indivíduo, assim como reconhecer a força existente na simbiose das diferenças em seus modelos de negócios.
– Parceria: não é buscar pessoas e empresas que te complementem, na tentativa de manter o controle daquilo em que você se considera expert. Desapegue da ideia de que você crescerá rápido se estiver sozinho na sua especialidade. Isso é medo de abrir mão da identidade que você construiu até aqui. Parceiros que possuem áreas aderentes com o que você faz lhe ajudam a ganhar espaço, trazer novos públicos e, também, conhecimento sobre o seu próprio negócio se forem trabalhados de forma estratégica. Os famosos “frenemies” irão acelerar o seu crescimento, a partir do momento em que os objetivos são claros entre vocês. O combinado não sai caro e pode gerar, inclusive, mais lucros. O desafio de ser “Glocal” só poderá ser cumprido se você desapegar de dominar o mundo sozinho.
– Glocal: ser global e local ao mesmo tempo não é uma característica particular das grandes empresas. Você pode atuar, por exemplo, apenas com o público da sua cidade ou de seu país, mas não esteja fechado a se conectar, contratar, e participar de interações globais. Desapegue da ideia de que só existe conforto no seu chão. Isso é só medo de cair por tentar voar. A frequência na troca cultural pode ampliar seu processo criativo, além de trazer mais robustez na sua estrutura e unidade na sua comunicação. Vivemos em um mundo global, onde temos, cada vez mais, pessoas de todas as nacionalidades se espalhando e se misturando em terras estrangeiras. E estamos caminhando, apesar ainda de resistências e guerras territorialistas, para uma sociedade de consciência de planeta. Já se vê serviços de streaming, por exemplo, com produções de todos os lugares, notícias internacionais impactando em nossa rotina e, inclusive, um mesmo vírus mudando a nossa vida. A nossa percepção sobre a nossa identidade já está em mutação, mesmo que não estejamos falando abertamente sobre ela. A transformação acontece no invisível, driblando qualquer fronteira que seja convenção conhecida na Terra.
Enfim, eu poderia escrever vários outros exemplos aqui sobre como podemos nos evaporar, para conseguir dirigir aquela Ferrari que citei no início, com tanta destreza que teremos a sensação de estar voando ao ganharmos velocidade. De qualquer maneira, o mais importante neste momento é perceber: onde é que você está? E onde estão seus parceiros, sua audiência, sua empresa, seus amigos, seu time, sua família… Estão no céu, às vezes dando alguns mergulhos, ou no mar? Estamos em fase de transição e é preciso trazer esse conhecimento para a nossa comunicação. Nos adaptando o tempo inteiro de acordo com a maturidade de nossa sociedade, mas sempre com os olhos abertos para as estrelas que podemos ver do céu. Nos acostumando com o estado invisível de ser do humano, aprendendo a confiar no que não vemos no físico, desenvolvendo um mindset digital que desapega sem sofrer, ao ponto em que, um dia, o céu deixará de ser limite.
Vanessa Oliveira é diretora da ViU Hub