Mais de um ano se passou desde que a maioria de nós pisava com frequência em nossos escritórios. Dificilmente alguém discorde de que a ausência da convivência física, característica daqueles ambientes, tornou mais complexo o nosso alinhamento em torno dos trabalhos. Por outro lado, a aceleração pela qual a maioria das empresas está passando para se digitalizar pode representar um verdadeiro salto em nossa capacidade de execução. Para tanto, é preciso que elas não se deixem seduzir pela maior disponibilidade aparente das pessoas e que abracem em definitivo uma cultura que use a tecnologia de forma mais humana com todos.
 
Passamos por diferentes desafios até aqui. A falta de cultura digital e a resistência ao trabalho remoto, muito presentes nas empresas tradicionais em todos os mercados, fizeram com que a maioria de nós não contasse de imediato sequer com o ferramental adequado para esse momento. Superado o susto inicial, a comunicação e a realização de trabalhos de forma assíncrona ainda representam grandes desafios para os times. Esse momento proporciona uma oportunidade única para as nossas áreas de Tech e de People se unirem na construção dos caminhos e das boas práticas para avançarmos com mais qualidade.
 
Em grande parte das empresas, houve diminuição dos investimentos em marketing e redução nos quadros de pessoal. O status quo nunca esteve tão desafiado e alguns reflexos foram o menor rigor nas escolhas por novos negócios e a maior concentração de trabalhos em times enxutos e exaustos física e emocionalmente – o que tem exigido novas análises e correções de rotas. É preciso evitar retrocesso quanto à profundidade nos trabalhos. Ao dividir a atenção da mesma equipe em diferentes objetivos ou produtos, afeta-se diretamente sua capacidade de idear cenários que nenhum outro vê. São necessários mais tempo e investimento dedicados a compreendermos melhor as oportunidades. A retenção é a nova aquisição.
 
O volume e a falta de foco tornaram-se detratores ainda mais cruéis na nova relação entre empresas e pessoas. O mindset das startups de tecnologia tornou-se uma importante referência para os desafios atuais das empresas, especialmente para agências. Se outrora eram justificáveis grandes investimentos e prazos para provarmos uma ideia, hoje tornou-se fundamental sermos mais ágeis, praticando conceitos como MVP (do inglês minimum viable product, ou produto mínimo viável), pelo qual se foca em um problema por vez e buscam-se as formas mais simples e baratas de resolvê-lo. Se antes fazia sentido a mentalidade de “projetos”, em que as métricas de sucesso remetiam apenas à entrega no prazo e dentro do budget, hoje é preciso viver o dia a dia de “produto”, buscando pequenas e rápidas melhorias incrementais continuamente, tendo como métrica os próprios ob jetivos do negócio.
 
O momento exige sermos paranóicos com os dados. A cadeia de decisão das empresas precisa ser mais científica e racional. Contar com dados na hora de avaliar a chegada ou permanência de um cliente, assim como na priorização de esforços dos nossos times, será a chave para o equilíbrio e comprometimento entre empresas e pessoas. E também será preciso garantir a visibilidade dos objetivos das empresas, clientes e agências, como um farol no direcionamento das equipes. Nesse sentido, a metodologia de gestão OKR (do inglês objectives and key results, ou objetivos e resultados-chave ), do lendário CEO da Intel, Andry Grove, tornou-se a mais utilizada no Vale do Silício para que todos concentrem esforços nos mesmos pontos importantes em todos os times.
 
Entre tantas incertezas, sabemos ao menos que aqueles tempos não voltarão. Os novos tempos exigem líderes mais capacitados e humanos para lidar com todas essas questões e garantir os investimentos necessários para a evolução do conhecimento em suas estruturas. As empresas não conseguirão ir além de onde suas lideranças forem capazes de enxergar.

Lucas de Paula Lima é head de digital da Gotcha