Calainho:

 

Luiz Calainho está no universo do entretenimento desde 1991, quando ingressou na Sony Music Entertainment, aos 23 anos, e chegou à vice-presidência. Diante das transformações no mundo da música, em 2000 criou a L21, que atua com participações em diversos segmentos. Hoje, aos 45 anos, é sócio de 11 negócios com faturamento anual em torno de R$ 68 milhões. Nesta Entrevista, ele conta sobre seus projetos na L21, como o Samba Book, que levantou patrocínio de R$ 2 milhões. O executivo falou que a conta só fechou porque teve patrocínio. Entre seus próximos projetos, está o lançamento do livro: “Reinventando a roda, uma provocação autobiográfica”.

Você acompanhou a “queda do muro de Berlim” do mercado musical, processo que está acontecendo, em medidas bem semelhantes, nos mundos do cinema e da literatura. O que isso lhe ensinou?
Essa é exatamente a abordagem do meu livro, no qual uso minha experiência empresarial com exemplos de “reinvenções da roda”, ou seja, desconstruções e reconstruções de conceitos. Preciso voltar no tempo para responder a essa questão. Sempre fui muito inquieto, desde moleque. Estudei numa escola focada em desconstrução, chamada Escola Ativa, e mudei de escola sete vezes. Desde pequeno busquei o novo, o diferente, e nessas circunstâncias de mudanças de ambiente tive que me “reinventar” várias vezes.  Isso potencializou um espírito que eu já possuía. Buscar o novo passou a ser uma filosofia desde o início da minha vida profissional.

Você começou em propaganda, não foi?
Comecei como estagiário na Standard Ogilvy em 1987, depois fui contratado para atender um grupo de contas que cuidava de Fleischmann & Royal, Bausch & Lomb e Brahma, na época arcaica, nuclear, cinco níveis de banheiros (o dos assistentes, gerentes, diretores). Acabei indo trabalhar lá, no departamento de marketing. Depois que o Garantia comprou a companhia, entrou o Marcel Telles, que virou a empresa de cabeça para baixo, e depois o revolucionário diretor de marketing Magim Rodrigues. Fiquei lá me alimentando das cabeças geniais dessas pessoas revolucionárias que entraram em cena. Foi nessa época que decidimos transformar Skol numa cerveja jovem, por exemplo, algo que não existia.

Quando você assumiu a direção de marketing da Sony?
No livro conto a história curiosa e divertida por trás do convite, em 1990, algo por si só revolucionário para a época, pois trabalhar no marketing de uma gravadora era algo inesperado. Fui para a Sony e, ao chegar lá, me reportava a Roberto Augusto, um transformador, um revolucionário. Quando entrei na Sony ouvi dele o seguinte: “Estou te contratando porque você estava fora do mercado, mas não vou ensinar você a nadar, e quero que você revolucione. Aqui na companhia, eu gosto é de contramão. Se queremos dar grandes porradas no mundo da música, temos que ir para o lado oposto da boiada”. Meu período de Sony foi muito revolucionário e fui moldando minha cabeça com esse viés. Hoje, isso é mandatório. O mundo atual demanda revolução o tempo inteiro. Novos caminhos, novas ideias, novos formatos. Não dá para ficar parado. Estamos vendo empresas como Kodak e até Yahoo quebrando.

Como você enfrentou, na Sony, a entrada em cena dos formatos digitais?
Foi o contraponto. Formatos digitais começaram a surgir, a pirataria começou a consumir o mercado e as gravadoras que deveriam ter entendido a oportunidade digital como uma oportunidade de negócio, a entenderam como uma ameaça. Não compreenderam que não vendiam o formato físico, vendiam música, e que era uma oportunidade de venda direta para o consumidor, deixar de ter fábricas, varejistas. Mas não, se prenderam ao formato físico. Ao final de um ano decidi aplicar minha experiência em entretenimento para montar a minha empresa, a L21 Participações. A ideia era montar um negócio multiplataforma, no qual as empresas têm vida própria, mas podem e devem se autoalimentar.

Qual foi seu primeiro foco na época?
Eu queria ter mídia. Como dizia o velho guerreiro, quem não se comunica, se trumbica. Decidi então colocar de pé o projeto das rádios no Rio – uma mídia clássica, das mais antigas. Em paralelo investi em internet, no portal Vírgula, hoje o maior portal vertical do país, focado no segmento jovem.

Como o rádio se revolucionou e você fugiu do tradicional?
A internet lhe adicionou valor. No caso da rádio jovem, a Mix, temos o modelo clássico de breaks, mas os modelos comerciais, de patrocínio, de entrega e de conteúdo são muito diferentes do tradicional. Depois criamos uma rádio adulta, a Paradiso, que nasceu baseada em um tripé. Deveria ter música de qualidade e também lançar novidades – o que não é uma característica das rádios adultas. Tocamos primeiro Destiny’s Child, Jack Johnson, Amy Winehouse, e por aí vai. A segunda perna do tripé era ter conteúdo de qualidade: programas exclusivos. Percebemos rapidamente que a música transformada em conteúdo é um commodity. Hoje a música está nos iPods, iPhones, na internet, na TV a cabo e por aí vai. Nunca se ouviu tanta música quanto hoje em dia. A terceira perna do tripé é a presença da rádio em ambientes que se comunicassem com o nosso público. Rádio adulta pouco age em promoções e ambientes externos. Nos tornamos rádio oficial da Art Rio, do Noites Cariocas, da Casa Cor, do Red Bull Air Race. A Paradiso era quinto lugar em 2003 e chegamos ao segundo lugar em 2008. Depois, nos associamos à SulAmérica, em parceria com a MPM: a primeira experiência de naming rights de um veículo de comunicação estabelecido. Na época ouvimos muita gente dizer que jamais iriam anunciar na rádio e que os ouvintes iriam estranhar. Acreditamos que a marca agregaria valor à rádio. Dito e feito. Nossa audiência cresceu 52% e em faturamento 27% nos primeiros seis meses.

Ou seja, mais uma vez isso prova a sua teoria, de que é preciso inovar e transformar?
Mas é preciso saber fazer. É preciso ter conhecimento do ambiente em que se está transitando, tem que ter os sócios certos e que acreditem nas ideias revolucionárias – eu particularmente acredito tanto em sócios que tenho 36.

E qual é o futuro do rádio?
O mais importante é o conteúdo e a chancela que se tem a partir dele. Mas não tenho dúvida de que haverá uma transformação na frequência, no dial. As pessoas querem ouvir, e pode ser no rádio ou na internet. A transformação passa pelo fato de que no futuro todas as cidades do mundo serão wi-fi. Piraí é wi-fi. Fort Lauderdale é wi-fi. Lá eu escuto a Paradiso FM no rádio do carro, que localiza rádios na internet, e em breve todos os carros terão rádios assim. O dial tende a perder valor. As rádios serão “mundiais” e terão endereços ip. O que diferenciará será o conteúdo exclusivo. Um dos grandes baratos do rádio é a surpresa. Isso não tem lista de iPod que ofereça. E a tecnologia ainda enriquecerá muito o rádio.

Seu negócio mais recente é a Musikeria. Em que medida ele revoluciona o conceito de gravadora?
Hoje a conta não fecha. Você pode investir R$ 1 milhão num determinado produto para vender 30 mil CDs. Não se consegue ter renovação de artistas no país, e o curioso é que o Brasil é o país com o maior número de talentos musicais disparado. Nesse cenário, o mercado da música caiu 10 vezes no país, embora o mercado como um todo tenha crescido. Assisto a isso doente. O Brasil já é o terceiro maior mercado de musicais do mundo. Vamos passar a Inglaterra logo, logo. É preciso haver investimento empresarial para potencializar a carreira dos artistas. Por isso estou trazendo a iniciativa privada para investir em música, da mesma forma que investem em festivais, musicais, cinema.

Fazendo como?
Basta embalar a entrega para gerar resultados de posicionamento de marcas e produtos. Pode-se trabalhar com licenciamento inclusive internacional, ativar mais o mercado publicitário, que não tem usado tanto a música. Meu primeiro produto levantou um patrocínio de R$ 2 milhões, o maior da história para um produto musical: chama-se Samba Book, que a cada ano homenageará um grande sambista e teve o patrocínio da Petrobras e Itaú. O primeiro é o João Nogueira. Tem duração de sete meses, desde o momento em que o portal entra no ar, até a alimentação das redes sociais, o trabalho da imprensa, o evento de lançamento com mídia pré e pós, a venda em si dos produtos, que são um fichário de partituras, um CD duplo e um DVD, Blue Ray e um livro discobiográfico feito pela Casa da Palavra. Pode-se comprar o box de luxo ou os produtos separadamente em todos os pontos de vendas individualmente. Ano que vem será Martinho da Vila. Não tenho dúvida de que isso, na indústria da música, nunca foi feito nem nos tempos áureos. A conta só fecha porque tem patrocínio. E para as empresas é lindo. Elas estão se apropriando de conteúdo e gerando valor para a população do país. É uma desconstrução no mercado musical.