Uma pesquisa realizada para uma tese de doutorado pelo professor da UERJ e da FGV, Guilherme Caldas, contesta que houve o surgimento de uma “nova classe média” nos últimos anos com a adoção dos conjuntos de políticas públicas adotadas pelo governo. Segundo Caldas, houve a emersão de uma nova classe trabalhadora frente à classe trabalhadora tradicional. Segundo o acadêmico, a ideia de classe média se vincula a um determinado estilo de vida que envolve, além da posse de determinados bens, como a casa própria e o carro, uma educação diferenciada, de nível superior. Seu estudo mostrou, a partir de uma amostra analisada, um distanciamento entre a classe média e o que ele chama de “nova classe trabalhadora”.
“Embora o capital cultural institucionalizado no diploma seja uma condição diferenciadora da classe média, não pareceu haver, no caso da amostra, qualquer indício de que as políticas públicas de elevação de renda e de ampliação de acesso à educação superior tenham determinado nos pesquisados ou em seus núcleos familiares um novo status de classe social. Ao contrário, os hábitos, os valores e as aspirações continuam centrados na dinâmica do trabalho, o que leva a crer que seja mais adequado considerá-los membros da classe trabalhadora”, disse Caldas, que apresentou sua tese durante encontro recente realizado pela ABA (Associação Brasileira de Anunciantes), no Rio de Janeiro.
Ele contesta os estudos realizados por Marcelo Neri, que se tornou ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos do Governo, a respeito de uma “nova classe média”. “Poder aquisitivo não define classe social. O critério Brasil é focado basicamente em poder de compra. Mas poder de compra não é classe social. Começou-se a cometer um equívoco muito sério, de chamar a nova classe C de nova classe média”, conta Caldas, que mergulhou, por exemplo, na obra de Pierre Bourdieu e o conceito de capital cultural.
“O curso superior é fundamental para se conseguir empregos melhores, que pagam melhor. Segundo Bourdieu, capital cultural é convertido em capital econômico e em capital social”, diz. Bourdieu afastou de suas análises a ênfase central nos fatores econômicos, algo que Caldas também procurou fazer na sua investigação.
O acadêmico decidiu realizar um estudo empírico com alunos da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e o trabalho de campo foi organizado pelo acadêmico partindo de duas premissas. A primeira, de que deveria haver diferenças entre a perspectiva de valores dos filhos da classe média tradicional, que tem alta renda, vinda de uma profissão com nível superior, mora em casa própria, tem automóvel e oferece aos filhos educação diferenciada – e a dos filhos da classe trabalhadora de baixa renda, que por sua vez vive com dificuldades, em habitações precárias, utiliza transporte coletivo e estudou em escola pública.
Ele testou valores, anseios, sonhos e expectativas desses grupos e constatou que essa nova classe trabalhadora se distancia, cada vez mais, da antiga classe trabalhadora de um Brasil agrário que ficou para trás e se aproxima velozmente de uma classe média. Entre as pessoas de menor renda, os sonhos e aspirações se mantiveram iguais ao longo do tempo, ao contrário do outro grupo – a chamada classe média, na qual a educação superior, por exemplo, se apresenta como uma perspectiva natural desde cedo. O grupo de menor poder aquisitivo não é a classe média, e a princípio não será, a menos que chegue ao curso superior.