Choram-se dilúvios no Brasil. Chora-se copiosa e desesperadamente. Choram-se faltas de materiais elementares e choram-se dramas psicológicos insuportáveis. As pessoas estão exaustas de tanto chorar. Choram por si, pelos próximos, pelos conhecidos e pelos desconhecidos. Choram pela irresponsabilidade pública e pela perversidade particular.
Nunca recebemos tantas notícias tristes e chocantes, ao mesmo tempo. Todos os dias, detalhes de sordidez política e de crueldade familiar são expostos à nossa sensibilidade já tão ferida. Não bastasse, faz o mundo sabermos que nos rejeita e fecha as portas.
E, assim, mais motivos ainda encontramos para chorar. Parece um drama e é um drama. É curioso que em meio à tamanha tragédia, o marketing continue na mesma toada de sempre, como se nada de anormal estivesse acontecendo.
Recebo ligações de corretores de imóveis oferecendo “oportunidades interessantes na minha região”, para investimento. Costumo perguntar em que planeta eles vivem. Diante do choque, comento que deveriam ponderar alguns fatores, antes de ligar para o celular de alguém, para dar uma informação que julgam ser “alvissareira”.
Pois, que entrar, sem aviso, na intimidade das pessoas, hoje em dia, corre um risco muito maior do que normal em termos de inconveniência. Como sabem que eu não estava chorando a perda de um parente para a Covid-19? Como sabem que eu não acabei de me desfazer do único bem para não ir à ruína? Como sabem que minha família não está à beira de um colapso nervoso, por conta do isolamento? Portanto, como é que me ligam, assim, como se fossem vizinhos, para pedir uma xícara de açúcar?! Claro que eles não têm culpa, vivem disso, desse comportamento alienado, sem noção, do mesmo jeito com que entram em nossas casas os comerciais de televisão e as postagens de anúncios em nossas timelines.
O problema não está nos meios, mas nas mensagens. Os meios são os mesmos de sempre, em suas conveniências e inconveniências. O que está faltando é um pouquinho de bom senso para adequar o conteúdo ao momento.
O coronavírus não deixou “apenas” centenas de milhares de mortos e outros tantos de sequelados, mas dezenas de milhões de “consumidores” tremendamente abalados psicologicamente. Como eu disse, há um choro copioso e extremamente sofrido sendo derramado no Brasil hoje.
O marketing está surdo? Será que não ocorre a nenhum planner, com mais sangue nas veias do que nos olhos, um certo marketing-ombro? Focado em mensagens que carreguem consolo, esperança, solidariedade, empatia, com o público de quem as marcas dependem para sobreviver? Mas, por favor, sem aquele padrão de filosofia de publicitário, na voz de um locutor de voz falsamente embargada.
Tampouco, falas técnicas de psiquiatras e psicólogos, que disso os programas da tarde e as redes sociais já estão bem servidos. Falo de ideias que caibam em 30 segundos, simples e profundamente tocantes, por serem sinceras e autênticas. De preferência escritas e interpretadas por quem sabe do que está falando.
Stalimir Vieira é diretor da Base de Marketing (stalimircom@gmail.com)