O sonho de todo mandatário é tomar um dinheiro que não precisará pagar. Ou terceirizar os custos dos serviços públicos, o que acaba dando na mesma. O que para alguns poderia causar problemas de consciência, para outros, ideologicamente, é o mais certo a fazer. O prefeito de São Paulo, João Doria Júnior, típico representante do marketing business, não tem dúvida de que lotear a cidade entre grupos empresariais é o jeito mais rápido de resolver problemas crônicos e impulsionar as transformações que recuperarão anos de atraso.
Em termos práticos, está certo. Nada tem mais senso de urgência do que a ambição do capital. Basta observar como as grande corporações se comportam pelo mundo, diante de potenciais de boas remunerações aos acionistas. Em tempo recorde erguem torres de aço e vidro e permeiam um país inteiro com suas marcas. É da índole do capitalismo de raiz abraçar com determinação obsessiva os espaços que o poder público, por crença ou necessidade, deixa vulneráveis.
Fernando Haddad fez bastante por São Paulo. Mas num ritmo e num padrão insuficientes para atender à sede de transformação rápida dos paulistanos que formam opinião. Quem visita outras capitais importantes pelo mundo percebe que, em tese, poderíamos estar vivendo muito melhor. O problema é que o Brasil é um país pobre e com muita gente concentrada nos centros urbanos.
Rudolph Giuliano, ex-prefeito de Nova York, tornou-se ícone de eficiência, com seu programa “Tolerância Zero”, focado em segurança e organização. Deu bastante certo por lá. A prefeitura da cidade do México contratou a consultoria de Giuliani para repetir a experiência. Fracassou. Nem é preciso explicar a razão. Alguns anos atrás, não lembro se Marta Suplicy ou outro prefeito, “vendeu” ao McDonald’s o direito de patrocinar as cercas de proteção das árvores plantadas ao longo da Avenida 23 de Maio. O resultado foi um desastre que transformou uma das mais importantes artérias de São Paulo num interminável display.
Em outra ocasião, certa marca de desodorante instalou uma escultura do seu produto numa das vias de saída do aeroporto de Congonhas. Principalmente à noite, aquilo iluminado era bizarro. Durou pouco. Contar com o dinheiro da iniciativa privada nem sempre, portanto, traz benefícios. A edição mais recente da revista Adbusters, editada em Vancouver (aliás, com uma direção de arte primorosa do brasileiro Pedro Inoue), relata uma experiência interessante sobre o casamento entre o público e o privado.
Em 1989, as escolas públicas dos Estados Unidos passaram a usar aparelhos de televisão nas salas de aula. Neles, exibem conteúdo didático financiado por empresas que, em troca, dispõem de dois minutos para anúncios a cada dez de programação. São 12 mil escolas, alcançando 8 milhões de crianças. Uma pesquisa realizada em 2000, apontou que essas escolas aumentaram as vendas de refrigerante em 94% e de guloseimas em 72%, por exemplo. Imaginemos, em São Paulo, alugar a Cracolândia para algum laboratório farmacêutico testar produtos, desde que “assuma” os nóias. Alguma dúvida de que a maioria dos paulistanos aprovaria a ideia?
Stalimir Vieira é diretor da Base Marketing