Desculpem o título. São saudades do Arthur da Távola. Que nunca escreveu uma besteira dessas. Mas quase chegou lá.
Uma vez nos visitou na V&S um prospect que tinha um negócio sensacional, de milhões de dólares. Uma ideia maravilhosa, indecente fábrica legal de dinheiro.
A diretoria da casa inteira foi para a sala de reunião ouvir o empresário. Que trouxe alguns auxiliares e um marketing plan digno da Coca-Cola. Tudo num data show deslumbrante, com projeções de mercado, faturamento, lucro. Coisa profissionalíssima.
A conta era uma estupidez, algo assim como o dobro de nosso maior cliente. E ouvimos uma exposição de horas, uma verdadeira lição de marketing. Tudo tinha sido estudado nos mínimos detalhes, cada ação era planejada para que o produto que seria lançado dominasse o mercado e se constituísse num “case” de mudar a história da mercadologia pátria.
Tratava-se de umas máquinas incríveis de fazer pipoca, tipo self-service. O cidadão pegava uma ficha, introduzia na máquina e escolhia o sabor (manteiga, queijo, doce, etc.) e via seu saco de pipoca encher-se. E o cliente apresentava fotos das máquinas, exames laboratoriais do milho, comparativo sobre tamanho e textura das pipocas. Tudo com certificados, raios x, pesquisas…
Três horas mais tarde, começou a falar de lucros e verbas de comunicação. Tivemos que segurar meu sócio. Que tentou umas três vezes beijar a boca do cliente (hoje, ele, envergonhado, desmente: jura que eram somente os pés). Coisa de milhões de dólares. Muitos. Tantos que eu resisti ao desejo de fazer trocadilhos com os milhões das pipocas gigantes.
Até que o Carlão, do alto de sua frieza, interrompeu a exposição e começou a perguntar:
– O senhor chegou a esta projeção de lucro baseado na instalação de 3.500 máquinas por ano, não foi?
– Sim, até alcançarmos o Brasil todo, com 50 mil máquinas em dez anos.
– E onde o senhor vai encontrar lugar pra instalar 3.500 máquinas no Rio de Janeiro que, segundo seus planos, será a primeira cidade a receber a Pop Machine?
– Em cinemas, shoppings, faculdades, por aí…
– O senhor acha mesmo que existam 3.500 lugares no Rio para instalar suas máquinas? Eu estive fazendo aqui os meus cálculos e não consigo imaginar onde colocar mais de 100 máquinas.
Fez-se um pesado silêncio. O cliente ficou embaraçado, começou a gaguejar, a mostrar seus próprios cálculos. E não conseguia convencer, nada de passar de 100, 150 no máximo. Até que pediu um tempo, chamou os assessores no corredor, prometeu voltar, juntou os papéis, desligou o data show e se mandou.
Quase batemos no Carlão. O mata-sonhos.
***
Uma vez Elysio Pires, digníssimo diretor da MPM, estava em seu escritório quando a secretária anunciou que lá fora, pedindo desculpas por não ter marcado hora, estava o sr. Franco, da Alitalia. Sabendo que empresa aérea italiana estava procurando agência, o Elysio ficou eufórico. Agradeceu aos deuses da MPM (Macedo, Mafuz e Petrôneo) por existirem clientes que caem do céu como esse (nenhuma relação com a atividade da empresa) e foi receber o sr. Franco com todas as pompas.
Vocês já viram o Elysio quando quer seduzir? Pois não queiram. Levou o cliente para conhecer a agência, mostrou as duplas de criação (na Thompson nós tínhamos um enorme cartaz: “Não dê comida aos animais”, de tanto sermos objetos de exposição para prospects), mostrou o refeitório (era uma agência de gaúchos, e gaúcho não recebe ninguém sem exibir a churrasqueira), e os primeiros computadores de uma agência de propaganda. Um tour caprichado, além de café com biscoitos e uma profunda pensata sobre o futuro da propaganda e sobre o mercado de empresas aéreas.
Foi num momento que o Elysio parou para tomar fôlego que o visitante pôde então dizer a que veio. Abriu uma malinha e tirou uns frasquinhos de perfumes que representavam o negócio que o comissário Franco, da Alitalia, tinha ido fazer na MPM. Para não pagar o mico completo, Elysio escolheu um Clair de Lune qualquer, levou o sr. Franco até a porta, despediu-se com um abraço e voltou para sua mesa. O pobre do Franco até hoje não tem ideia da razão de ter sido recebido com tanta gentileza.
* Para entrar em contato com o autor, escreva para lulavieira@grupomesa.com.br