Ela é filha do empresário Roberto Justus. E certamente teve influência do pai quando resolveu flertar com a publicidade, afinal ele liderou o maior grupo de comunicação do país, o Newcomm, que teve participação na gestão da líder Y&R.
Mas Luiza Justus é independente e buscou com passos próprios sua relação com a publicidade quando decidiu estudar comunicação e cinema no tradicional Boston College, nos Estados Unidos. Da capital de Massachussets, ela se mudou para Nova York e há três anos é redatora sênior na estrutura criativa da Grey NY. “Meu pai é um recurso indispensável para mim”, diz ela, que faz parte do núcleo que cuida das ações de comunicação de marketing para P&G, especialmente para a marca Pantene, inclusive para a operação brasileira. Luiza concedeu a seguinte entrevista.
Como iniciou sua carreira na publicidade?
Desde pequena, eu sempre amei escrever histórias, e até gravava e editava “filmes” por diversão. Então, claro, eu precisava escolher uma profissão que me deixasse fazer isso todo dia o dia inteiro! Eu estudei cinema e comunicação na Boston College, depois me mudei para Nova York para começar a minha carreira. Trabalhei numa produtora minúscula e logo percebi que produção não era para mim. Eu queria usar a imaginação, escrever e criar, sem me preocupar com logística, orçamentos e papelada.
Então, preferi arriscar um estágio de cinco meses na criação da Grey New York em vez de um emprego garantido na produtora. Foi a melhor decisão que tomei! Fui efetivada logo depois do estágio, e eles até me ajudaram a conseguir o visto para ficar nos EUA, onde moro há quase 8 anos.
Roberto Justus exerceu influência nessa escolha?
Não tenho como dizer que não! Sempre que ele lia alguma das minhas histórias ou via qualquer projeto escolar criativo que eu tinha feito, ele brincava que queria me contratar. Depois da faculdade, ele queria muito que eu entrasse para esse meio e, pra falar a verdade, eu tinha uma certa resistência. Às vezes quando as coisas são muito próximas você acaba não querendo muito, sabe? Esse era o negócio de família, e eu tinha aquela vontade de explorar algo desconhecido. Eu queria ir direto trabalhar com filmes ou seriados de TV, e ele insistia que eu tinha de tentar entrar no mundo da publicidade, pois tinha certeza de que eu iria gostar, e um não anula o outro, na verdade, um agrega ao outro. E não é que ele estava certo? Meu pai sempre enxerga as coisas uns 20 passos na frente. Queria ter herdado esse dom.
Chegou a trabalhar com o Roberto Justus?
Nunca trabalhei diretamente com ele, pois minha entrada no mundo publicitário coincidiu mais ou menos com quando ele decidiu sair. Mas meu pai é um recurso indispensável para mim. É incrível ter alguém que entende de absolutamente tudo, como o mercado funciona, as políticas de agência, e tudo mais. Ele sempre me orienta. Eu vou e volto do trabalho a pé, e ligo para ele todos os dias quando eu saio da agência. Vou andando e conversando com ele sobre tudo que aconteceu naquele dia. Então, de uma certa forma, ele não conseguiu se livrar dos altos e baixos do mundo de agência, porque agora ele precisa agir como meu mentor.
Onde se formou?
Estudei na Escola Graduada de São Paulo, depois fiz faculdade em Boston College. Lá eu fiz o que eles chamam de “double major,” que é para os indecisos como eu, que querem fazer dois cursos ao mesmo tempo. É o dobro do trabalho, mas vale a pena para ter uma abrangência maior nos estudos. Eu me formei em 2015 com dois diplomas, um de cinema e um de comunicação.
Qual a disciplina da publicidade que você abraçou?
Criação! Sou redatora sênior. Amo mais que tudo poder usar a imaginação todos os dias, e ver palavras que eu mesma escrevi sendo ditas na TV ou nas páginas de uma revista. Cada disciplina dentro da publicidade tem seus desafios, mas eu gosto mesmo é de pensar nas ideias e depois vê-las no mundo real.
Como foi essa escolha?
Foi muito natural, mesmo! A criação tem tudo a ver comigo, acho que qualquer um que me conhece concordaria. Se eu acabasse trabalhando no atendimento ou planejamento, acho que eu seria um peixe fora d’água.
Qual é a sua motivação?
A minha maior motivação é ver algo que veio da minha imaginação, da bagunça do meu cérebro, no mundo real. É, por exemplo, aquele momento quando a TV
está ligada e eu ouço a música que eu escrevi para o filme da Pantene, que eu acompanhei do começo ao fim. Ele passou, inclusive, durante os Grammy! Daí eu penso
em todas as pessoas que estão assistindo o meu comercial naquele momento, e a sensação que sinto é indescritível. Também senti isso quando vi os prédios iluminados com o símbolo da mulher para a ONG Catalyst, algo que foi minha ideia, que pulou da minha mente diretamente para o skyline de muitas cidades. Não existe motivação maior!
Em quais agências já trabalhou?
Só na Grey!
Como observa a publicidade que vive um momento de transição?
Eu vejo que o mundo digital está crescendo muito, e muitas dessas agências grandes estão fazendo de tudo para se adaptar. A tendência agora é das agências se unirem para fortalecer este lado digital e experiencial, como aconteceu com a Y&R e a VML, entre outras. Essa semana mesmo, uma das agências digitais mais modernas e criativas, a Droga5, foi comprada pela Accenture. Ou seja, até as grandes empresas de consultoria estão apostando na publicidade digital e interativa.
Quais são os seus desafios profissionais?
Meu maior desafio é chegar num ponto onde possa escrever roteiros e realizar filmes que impactem muitas pessoas. Seja isso no mundo do cinema, TV, publicidade ou algum meio que talvez nem exista ainda, sei que quero continuar a contar histórias numa escala maior ainda.
Quais projetos considera relevantes na sua trajetória?
Eu passo 90% do meu tempo escrevendo para a Pantene, e eu adoro! O projeto mais marcante que fiz para a marca foi o lançamento das ampolas Pantene nos Estados Unidos. Minha ideia foi fazer um trailer, como se fosse de um filme mesmo, que mostrou as ampolas sendo clandestinamente levadas do Brasil (onde elas já existem há 10 anos) para os EUA, no estilo do filme “Prenda-me se for capaz”. Depois, meu briefing era explicar como funcionam essas ampolas, então decidi escrever uma música para comunicar isso de um jeito divertido. Os clientes amaram!
Eu também criei uma campanha para uma ONG chamada Catalyst, que visa criar ambientes de trabalho com mais igualdade entre homens e mulheres dentro de empresas grandes. No Dia Internacional da Mulher, em 2018, conseguimos fazer com que várias empresas que fazem parte dessa organização (inclusive P&G e Morgan Stanley, entre muitas outras) colocassem um símbolo da mulher gigante na fachada do prédio, janela por janela, para mostrar que elas acreditam em um ambiente de trabalho que respeita e ajuda suas funcionárias a crescerem. Fizemos isso em 30 prédios, em mais de 10 cidades e 5 países!
O que te levou ao mercado dos Estados Unidos, sempre muito inspirador diante da sua diversificação, oportunidades e clientes?
Eu sempre quis trabalhar em Nova York depois da faculdade, tenho facilidade com o inglês e queria sentir a agitação do mercado aqui, especialmente depois de assistir seriados como “Mad Men”. Então, aproveitei o “ano extra” de visto que os Estados Unidos oferece pra quem faz faculdade aqui, parti para a Madison Ave e não saí mais!
E como chegou à Grey?
Acho que expliquei a trajetória toda nas primeiras perguntas.
O que significa estar na Grey NY?
É incrível e às vezes até um pouco surreal. A agência me deu oportunidades que eu nunca poderia imaginar. Aqui é tudo na pura meritocracia, qualquer um tem a chance de mostrar seu potencial. Não tem a questão de idade, ou aquela coisa dos mais novos terem de ficar calados ou só participarem de trabalhos pequenos. A qualidade do trabalho é a única coisa que importa. Fora que trabalhar na headquarters mundial de uma empresa é uma sensação imbatível. A agência fica na frente do prédio histórico de Flatiron, no coração da cidade com vista pro Empire State Building. Às vezes eu sinto que eu vivo dentro de um filme.
Em qual área atua?
Sou redatora sênior na conta da P&G.
Quais são seus planos?
Planejo ficar aqui por mais um tempo, aprendendo, crescendo e produzindo mais ainda. Mas eu sempre gostei de escrever roteiros de cinema, então quero ver se consigo entrar nesse meio eventualmente. Também estou no processo de produzir e dirigir um curta que eu escrevi. As duas indústrias são muito interconectadas, então eu sei que tudo que eu aprendo na publicidade, eu vou poder aplicar de alguma forma no cinema.
Que tipo de adaptação precisou para atuar na Grey?
A maior adaptação foi descobrir do que se trata este mundo de publicidade! Aqui tem uma expressão que dizem muito, “fake it till you make it,” ou seja, finja até chegar lá. Quando comecei eu não tinha experiência nenhuma com isso, então tive de pegar o bonde andando e meio que me virar, fingir que eu entendia todos os termos e como tudo funciona. Mas eu sinto que me adaptei rápido, pois fui de estagiária para redatora sênior, só vendendo e produzindo cada ideia.
Quais qualidades dos brasileiros é mais valorizada nos EUA?
Existem muitos brasileiros atuando na publicidade aqui. Acho que a criatividade é uma das maiores. O Brasil é considerado o mercado de onde vêm as ideias mais inusitadas, então os brasileiros que vêm pra cá já têm uma fama de serem ultracriativos. A Grey valoriza muito pessoas de outros países com outras visões de mundo. Só na minha equipe tem uma outra brasileira no planejamento, e o diretor de criação é do México. O fato de sermos todos bilíngues ajuda muito, tanto que produzimos trabalho para toda a América Latina daqui do escritório de NY.