“O rádio é o jornal de quem não sabe ler, é o mestre de quem não pode ir à escola, é o divertimento gratuito do pobre”. A frase é do médico, antropólogo, escritor e pesquisador de radioeletricidade carioca Edgard Roquette-Pinto, considerado o “pai do rádio” no Brasil. É precisamente na data de seu nascimento – 25 de setembro (1884) – que comemora-se o Dia do Rádio por aqui, para homenagear o criador da primeira rádio brasileira, que acabou convencendo a Academia Brasileira de Ciências a patrocinar a inaguração da Rádio Sociedade do Rio de Janeiro.

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Roquette-Pinto – um entusiasta da radiodifusão a partir de suas pesquisas com ondas eletromagnéticas para uso na medicina – havia acompanhado a transmissão, a distância e sem fios, da fala do presidente Epitácio Pessoa na inauguração da radiotelefonia brasileira, em 7 de setembro de 1922.

Naquele dia, comemorou-se o primeiro centenário da Independência do Brasil e o Rio de Janeiro – na época capital federal – abrigou uma grande feira internacional e recebeu a visita de empresários americanos que queriam demonstrar os avanços da radiodifusão, o grande destaque da época nos Estados Unidos. Para demonstrar o funcionamento do novo veículo de comunicação, os americanos instalaram uma antena no pico do morro do Corcovado, onde hoje se encontra a estátua do Cristo Redentor.

O discurso do presidente Epitácio Pessoa foi captado em Niterói, Petrópolis (serra fluminense) e em São Paulo, onde foram instalados aparelhos receptores.

Roquette-Pinto definiu a novidade, na época, como uma potencial “máquina importante para educar nosso povo” e tentou, sem sucesso, convencer o governo federal a comprar os equipamentos apresentados pelos norte-americanos na feira. Seus contatos no mundo da medicina acabaram facilitando a articulação de outro patrocínio – o da Academia Brasileira de Ciências – para criar, em 1923, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro.

Conforme sonhara seu criador, era uma rádio educativa, que transmitia programação infantil, aulas de inglês, francês, química e até ginástica. Na época, era preciso “cadastrar-se como ouvinte”, adquirindo um equipamento para ouvir a programação em casa – só cerca de dez anos depois os equipamentos se tornaram mais acessíveis e vendidos em lojas especializadas. 

As primeiras emissoras eram clubes ou sociedades de amigos, em geral nascidas da união de curiosos encantados com a novidade. Como a própria Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, a PRA-2.

A segunda emissora foi inaugurada em 1924, no Rio de Janeiro, a Rádio Clube. Mas somente em 1931, já no governo Getúlio Vargas, que se organizou a rádiodifusão nos moldes atuais, permitindo inclusive a propaganda.

Em 1936, Roquette-Pinto doou a rádio ao então Ministério da Saúde e Educação – dando origem à Rádio MEC. Ao saber que Gustavo Capanema, então ministro, havia decidido incorporar a antiga Rádio Sociedade ao Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), órgão responsável pela censura durante o Estado Novo, do presidente Vargas, Roquette-Pinto batalhou pela autonomia da emissora – até conseguir.

Ao longo da vida, ele se manteve um grande apaixonado por educação e também pela natureza: realizou cerca de 300 curtas para o Instituto Nacional do Cinema Educativo. Lecionou etnografia, antropologia e história natural e participou da Missão Rondon, do tenente-coronel Cândido Mariano da Silva Rondon, figura de grande importância em sua vida profissional.

Foi diretor do Museu Nacional e integrante da Academia Brasileira de Letras pelo seu trabalho como ensaísta e poeta (terceiro ocupante da cadeira 17, eleito em 20 de outubro de 1927, na sucessão de Osório Duque-Estrada), fundou o Instituto Nacional do Cinema Educativo e foi também um dos fundadores do Partido Socialista Brasileiro.

Lula Vieira, publicitário e apaixonado por rádio, lembra que há também controvérsias em torno da figura de Roquette-Pinto: ele era também um eugenista, e suas opiniões sobre a necessidade de melhoria da eugenia brasileira sempre o colocaram sob suspeita.

Roquette-Pinto faleceu no Rio de Janeiro, no dia 18 de outubro de 1954. Seu neto, Cláudio Roquette-Pinto Bojunga, tornou-se jornalista e escritor, autor, entre outros, do livro JK, o artista do impossível.

O legado de Roquette-Pinto no mundo do rádio segue firme – embora talvez não tão forte quanto em outros tempos.

Lula Vieira acredita que o Dia do Rádio deveria ser dedicado a se pensar no meio e refletir sobre o seu poder, sua influência e seu alcance.

“Se é através dele que muitas igrejas se sustentam, que muitos anunciantes mantêm seus negócios, se é eleque cria formadores de opinião de grande importância nas cidades onde atua, se é o rádio que estabelece sucessos musicais, elege dezenas de políticos, esse é um meio que deve merecer mais atenção da indústria da propaganda”, conclui.