Todo mundo tem histórias para contar sobre experiências em uma central de atendimento. A questão é que, em geral, o histórico é ruim. As pessoas ligam para o SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor) das empresas para resolver um problema e, além de outros inconvenientes, a espera, na maioria das vezes, é longa. Esse é um cenário que as empresas tentam melhorar, principalmente depois que os consumidores começaram a reclamar nas redes sociais. Com isso, nos últimos anos, o SAC 2.0 vem ganhando mais espaço, também por uma questão de custo – um atendimento telefônico chega a custar R$ 14 para as empresas.
Dados de mercado mostram que há quatro anos 70% do tráfego dos atendimentos ao cliente eram via telefonia – hoje esse índice caiu para 50%, sendo que os canais digitais, via chat, e-mail, entre outros, já correspondem à outra metade do total de atendimentos. E a tendência é só aumentar, bem como os investimentos na área – a estimativa é que as empresas destinem R$ 5 bilhões por ano para soluções digitais no Brasil.
“As marcas precisam se relacionar com os clientes onde eles estão para serem relevantes. O 0800 tende a diminuir. As redes sociais deixam isso mais evidente. Quem define o canal de atendimento é o consumidor. A gente viu as empresas irem para as redes sociais para fazer monitoramento a partir do momento que perceberam que as pessoas estavam lá para falar sobre as marcas e na maioria das vezes para falar mal”, pontua Daniel Lindenberg, sócio e CEO da M2G, empresa de soluções de atendimento para canais digitais.
Para resolver o problema das reclamações de consumidores serem postadas no mural da página da Bonafont (da Danone) no Facebook, a M2G criou uma central de relacionamento com o consumidor na própria fanpage da marca de água. “A central de relacionamento no Facebook é na realidade uma maneira de organizar o atendimento dentro da fanpage, fazendo com que o mural seja um lugar onde a marca possa falar sobre produtos, lançamentos. Essa central apresenta vários canais possíveis de interação com a marca. O consumidor pode mandar uma mensagem privada, começar uma conversa pelo chat, fazer uma ligação telefônica e até mandar um recado de voz”, conta.
O projeto para Bonafont foi lançado em setembro e, mesmo com pouco tempo de vida, a Danone já planeja estendê-lo para outras marcas da multinacional. “O objetivo é aproveitar a presença que a Danone tem nas redes sociais e melhorá-la. A expectativa é expandir para outras marcas da Danone. Já temos planejamento nesse sentido”, revela o CEO da M2G. Com a pressão dos consumidores nas redes sociais, o atendimento e o marketing também começaram a se “falar” mais dentro das empresas. “Esse é um movimento que só tende a aumentar, já que os posts negativos nas redes sociais passaram a ser avaliados pelo marketing, deixando de ser só uma questão do atendimento, até porque mexe com a imagem das empresas”, avalia Lindenberg. A M2G atende 70 clientes, entre Bonafont, Amil e Sul América.
Comportamento
Para Marcelo Pugliesi, CEO da Direct Talk, também especializada em soluções para atendimento em canais digitais e que nasceu no boom das pontocom em 2000, a internet mudou definitivamente o padrão de comportamento do consumidor e vem provocando a mudança no atendimento das empresas, com a abertura cada vez maior de canais digitais. Além de atendimento via e-mail, chat, redes sociais, mobile, uma das vedetes do mercado é o assistente virtual, que usa inteligência artificial. “O SAC deveria ser a solução de muita dor de cabeça das empresas, mas ainda não acontece desse jeito. E eu acho que a internet e a telefonia celular estão mudando a cara de como o SAC é feito. E as redes sociais trouxeram uma mudança muito grande, pois abriram a possibilidade de o consumidor reclamar”, destaca Pugliesi.
A Direct Talk desenvolve softwares que focam em tudo que é alternativo ao atendimento telefônico. “A gente não tem nada contra o atendimento telefônico, mas sabemos que é um modelo saturado. Ultimamente, a gente escuta mais histórias negativas do que positivas sobre atendimento. Aproveitamos as tendências tecnológicas para converter em benefício para o SAC”, reforça. Segundo pesquisa realizada pela Abrarec (Associação Brasileira das Relações Empresa Cliente), 100% das empresas oferecem atendimento via e-mail e o canal que mais cresce nos últimos dois anos é o atendimento via rede social. “A gente enxerga uma mudança grande também de comportamento do consumidor, que usa cada vez mais os canais alternativos”, diz Pugliesi.
O tema atendimento está tão em alta que a Direct Talk decidiu aproveitar a onda e lançar uma campanha cujo título é “Eu amo meu cliente”. O objetivo, de acordo com a empresa, é mudar a imagem negativa do SAC, além de melhorar a autoestima dos profissionais do setor. “A gente decidiu contar histórias bacanas de atendimento ao consumidor. Estamos bastante motivados a mudar a relação entre consumidor e empresa”, fala.
A primeira ação da campanha foi a criação de um hotsite. Nele, as empresas contam histórias bem-sucedidas de suas centrais de atendimento. Lançada em setembro, a campanha reuniu no primeiro mês mais de 200 histórias de 42 empresas, sendo que o site recebeu mais de 1.000 acessos. A Direct Talk atende hoje 240 clientes, entre os maiores estão Sky, Netshoes, Natura, Magazine Luiza, Globo.com e Gol.
Lei
Resolver a questão do atendimento ao cliente é um problema que sai caro para as empresas – só a Sky, por exemplo, tem 12 mil operadores de telefonia. Os esforços começaram a aumentar a partir do decreto federal de 2008, que obrigou as empresas a seguir regras em relação ao tempo de espera na linha, gratuidade na ligação, entre outros aspectos. Mas nem por isso é possível dizer que o atendimento, em geral, melhorou. Para especialistas, um dos principais gargalos é o fato de que o SAC deve ser visto de uma forma estratégica e não operacional. Outra crítica recorrente é em relação à terceirização do serviço.
“O cliente é a principal razão das empresas. Devido à emergência do mercado e concorrência, a regra número um do negócio passou a ser manter os clientes. Então, ouvir o cliente passa ser fundamental para as empresas”, destaca Miguel Noronha Feyo, professor de MBA de Marketing da ESPM. “Eu acho que grande parte das empresas continua a utilizar o SAC naquele conceito de se livrar do cliente e não de ajudá-lo, principalmente por causa da terceirização dos call centers. Os atendentes são muito pouco preparados, com salários mínimos.”
Para Feyo, muitas empresas mantêm suas centrais de atendimento apenas para cumprir legislação, “em vez de olhar o SAC como um ótimo canal para abrir novas oportunidades tanto para reter os clientes como para escutar sugestões de produtos, melhorias de processos, e fundamentalmente criar uma visão positiva, para que, depois do contato com o SAC, o consumidor possa refletir para sua rede de contatos”.
O professor da ESPM finaliza ressaltando que o SAC 2.0 vem fazendo com que as empresas comecem a se preocupar mais com o impacto do atendimento nas suas marcas. “Esse cliente tem uma network muito maior e a possibilidade de contar em minutos seu caso negativo ou positivo para centenas de pessoas.”