No auge da maior crise hídrica da história de São Paulo, a Sabesp deixou de fazer campanhas na mídia, neste mês, para conscientizar a população sobre como economizar água e combater o desperdício. A previsão da companhia responsável pelo abastecimento na Região Metropolitana de São Paulo é de retomar a comunicação a partir de fevereiro. A pergunta que não quer calar é: não seria essa uma oportunidade para os governantes esclarecerem o problema e preparar a população para o caso do agravamento da estiagem?
“No caso da água é sim um descuido no processo de comunicação da Sabesp, que está falando pouco sobre o tema. Ela não está aproveitando o momento para vir a público e informar a gravidade do problema, falar sobre a importância de economizar água, importância da mudança de hábitos. A gente vê parte da população consciente e outra não”, avalia o professor Francisco Serralvo, coordenador do Grupo de Estudos da Marca (Gema) da PUC-SP.
O especialista reforça que a comunicação tem um papel fundamental para influenciar essa mudança de comportamento das pessoas em relação ao uso racional da água. Para Serralvo, a comunicação da Sabesp sobre o assunto é tímida. “Foi muito tímida a campanha da Sabesp no ano passado e não foi incisiva. Até outubro, a gente entendia que era por causa das eleições, já que ninguém estava tratando o tema de forma aberta e a redução do fornecimento de água não estava sendo sentida. Mas agora é diferente, já estamos sentindo o racionamento”, observa ele.
“Teria que ter uma campanha ampla para preparar a população para os tempos difíceis. É enfrentar a crise de frente”, completa o professor da PUC-SP.
Na opinião dele, as grandes marcas também poderiam aproveitar o momento para mostrar o que estão fazendo para contribuir com o problema. “A avaliação que os executivos das empresas estão fazendo é que tocar neste assunto pode acabar colocando a imagem dessas marcas numa situação ruim, negativa. Mas eu acho que as marcas, de uma maneira geral, estão perdendo uma oportunidade. Elas poderiam aproveitar esse momento para divulgar o que estão fazendo para contribuir com a redução do uso da água”, diz Serralvo.
Política
A Sabesp é uma empresa de economia mista – 50% pertencem ao governo de São Paulo e 50% estão em ações na Bolsa de Valores –, o que implica em muitas decisões com cunho político. Isso ficou evidente durante as eleições de 2014, quando o governador reeleito Geraldo Alckmin (PSDB) disse que não havia falta de água em São Paulo e cravou inclusive que não havia risco de racionamento em 2015.
A companhia informa que ficou fora da mídia em janeiro porque era necessário ter um novo alinhamento diante da troca de secretário e do próprio presidente da Sabesp. O novo secretário estadual de recursos hídricos, Benedito Braga, assumiu a secretaria neste mês, assim como Jerson Kelman, que está à frente da Sabesp.
A Sabesp diz que começou a fazer campanha sobre o uso racional de água em janeiro de 2014 – quando o sistema Cantareira estava com capacidade de 24%, atingindo o menor nível em dez anos, sendo que hoje o volume é de 5,1%. A Sabesp afirma que no ano passado investiu R$ 90 milhões em marketing e publicidade e que quase totalidade da verba foi destinada a campanhas sobre o uso da água, como as estreladas pelo apresentador Rodrigo Faro e o ator Juca de Oliveira, sobre o desconto na conta com o mote “É hora de economizar!” (veja os vídeos abaixo).
Este ano, a Sabesp afirma que o investimento deve alcançar R$ 100 milhões. As agências que atendem à Sabesp são Lew’Lara/TBWA, Fischer e White. No site da empresa, há uma ferramenta onde a pessoa pode consultar se a Sabesp realiza redução de pressão na região onde mora. Outra ferramenta, batizada de “Calculadora de sonhos”, mede o consumo de água em condomínios e em quanto tempo o sonho da economia será alcançado – o recurso gerou críticas nas redes sociais. Segundo a companhia, as classes C/D são as que mais economizam água.
Nesta quarta-feira (28), finalmente os prefeitos da Grande São Paulo se reuniram e cobraram do governo de São Paulo a criação de um comitê para gerir a maior crise de abastecimento da região metropolitana. Na reunião com o secretário de recursos hídricos, também foi requisitado um plano de contingência para o caso do agravamento da crise. Os prefeitos ainda criticaram o plano de comunicação da Sabesp e a falta de clareza. Os prefeitos souberam sobre a possibilidade de rodízio de cinco dias sem água pela imprensa, após declaração do diretor da Sabesp, Paulo Massato.
Os vereadores de São Paulo também apresentaram um projeto de lei que prevê multa para o paulistano flagrado desperdiçando água. O texto autoriza a aplicação de multa de R$ 1 mil para quem lavar a calçada ou carro com água comprovadamente tratada. Os parlamentares avaliam que vão garantir a aprovação do texto na sequência do retorno do Legislativo, em 3 de fevereiro.
Vale ressaltar que a ONU (Organização das Nações Unidas) sugere um consumo per capita de 110 litros de água por dia. São Paulo está acima da média mundial. Segundo dados da própria Sabesp, antes da crise, o consumo per capita era de 160 litros. Atualmente, está em 128 litros.
https://www.youtube.com/watch?v=6ulHtgnJbxE