Ana Theresa Borsari, diretora-geral das marcas Peugeot, Citroën e DS do Brasil, voltou ao país há alguns anos para assumir a operação que ela viu nascer e crescer. Primeira mulher a liderar um país para a Peugeot no mundo, em abril ela protagonizou uma campanha sobre o novo momento da marca no Brasil.

Na entrevista a seguir, a executiva comenta os resultados do posicionamento e dos compromissos assumidos pela empresa, o desenvolvimento da mobilidade e de sua visão para o futuro da indústria de automóveis.

Alê Oliveira

Por que você protagonizou a campanha da Peugeot?
A rede de concessionárias falava sobre esse tema, achando que chegamos num nível de maturidade do plano que colocamos em prática, que o ideal seria eu a apresentar para o mercado. A ideia da utilização da minha pessoa surgiu dos concessionários. Fui bastante reticente no início, porque também represento a Citroën e não queria que ficasse uma coisa muito vinculada a uma marca. Mas já estava nesse projeto junto à marca Peugeot há três anos. E a nossa agência de CRM, a Tribal, que teve a ideia de campanha de recall, projeto antigo de um briefing de como apresentar essa nova marca para o mercado. Então, acabou unindo a ideia da Tribal com uma antiga demanda da rede. Foi um processo que demorou um ano. Não foi uma ideia de ‘vamos lançar uma campanha publicitária’. É muito mais profundo. Começou com a transformação na cultura da empresa junto à rede de concessionárias. A Tribal trouxe a forma: um jeito diferente, inusitado e impactante.

Isso faz parte do plano Virada Brasil?
Este é um plano de desenvolvimento de negócios das nossas marcas no Brasil. Tem um tripé de sustentabilidade, a renovação da nossa gama de produtos, o que foi acontecendo, e da nossa rede de concessionárias, qualitativa também. Essa transformação de marca requeria que tivéssemos parceiros que pensassem como a gente: o cliente como o centro das atenções. Mais do que nunca precisávamos que essa verdade acontecesse na ponta e fosse a ponta a reverberar para o mercado. Então fizemos essa mudança qualitativa da rede para chamar parceiros que acreditassem no nosso projeto. E o pilar dos serviços, que lançamos os compromissos do Peugeot Total Care, que há dois anos já eram uma ruptura para o mercado. Colocamos mais de mil carros reservas à disposição para nossos clientes, fizemos o compromissos tangíveis, objetivos e palpáveis: se o teu carro não ficar pronto em 24 horas você não paga, se o teu orçamento for diferente da fatura você não paga… Não queríamos compromissos filosóficos, mas coisas tangíveis, que mostrassem o novo momento. E isso culminou com a síntese de que se você não está satisfeito com o serviço, não paga.

Quais os resultados até aqui?
O nosso fluxo de loja aumentou em mais de 40%. A rede sentiu não só um aumento quantitativo, mas de clientes em conquista, que não conheciam a marca, mas se interessaram e tiveram curiosidade por conhecer melhor nossos produtos, nossa rede e serviços. Hoje levar fluxo para loja é uma tarefa praticamente impossível, porque a pessoa se desloca quando ela já sabe exatamente o produto que vai comprar, já pesquisou na internet, sabe oferta, promoção, versão…

A campanha foi muito mais ampla nesse sentido.
Uma campanha de marca ultrapassa as barreiras da própria vontade ou interesse de compra, é aquela coisa que faz ir até a concessionária para ter uma experiência com uma marca nova que até já ouviu falar no passado, mas que está falando com uma linguagem diferente e traz essa curiosidade de ‘deixa eu entender o que é essa nova Peugeot’. A gente queria aguçar essa curiosidade. As pessoas estão vindo conhecer, entender o que é a nova Peugeot.

Alê Oliveira

O ano também teve lançamento. O que a marca está preparando para o segundo semestre?
Anunciamos no primeiro semestre o Peugeot 2008, coroando essa nova etapa do ciclo de vida dos nossos produtos. O 2008 é hoje o coração dos produtos da gama Peugeot. E quisemos fazer um novo 2008 com a cara do 3008, que é o sonho de consumo de todo mundo. Este é o filhinho menor, que nasceu agora. Vamos participar da Fenatran [22º Salão Internacional do Transporte Rodoviário de Carga, de 14 a 18 de outubro]. E estamos no meio de uma imensa ofensiva no segmento de carros utilitários. O Grupo PSA é líder do segmento de utilitários na Europa. E a gente industrializou os produtos na América latina, porque queremos buscar a liderança desse segmento no Brasil. Dobramos o nosso share nos dois últimos anos. E a Fenatran é um momento de grande exposição dos nossos produtos e das nossas marcas. O ano termina com esse grande evento e queremos nos tornar referência.

Como foi seu retorno ao Brasil depois de tantos anos na Europa e de passar por quase todas as lideranças operacionais no país? Qual sua missão?
É supergostoso voltar para assumir a direção de uma empresa que você trabalhou de startup e praticamente viu nascer. Quando cheguei ao Brasil, a marca estava muito desgastada. Precisávamos fazer um trabalho profundo de reconstrução de marca. Por isso esse projeto de centralidade e obsessão no encantamento do cliente. Com as redes sociais e a maneira com a qual os consumidores interagem com as marcas, não existe mais campanha publicitária inócua.

A voz do consumidor tem grande impacto na comunicação da Peugeot?
Você não pode postar qualquer coisa, porque embaixo os consumidores falam a verdade. Isso é o mais bonito dessa nova era. Efetivamente corrobora que o que você comunica, divulga, posta, tem de ser a mais
absoluta verdade, porque embaixo da sua publicação está a verdade. O que me deixa mais feliz é viver esse exército de clientes lovers da nova marca, que corrobora o que a gente fala nas redes sociais. Acho que é isso que é mais potente e mais bonito dessa história.

E esse olhar mais atento ao consumidor é algo que está com você desde o início da carreira.
Comecei no Procon. Sempre imaginei que minha carreira devesse fazer algum tipo de sentido, muito mais do que profissional puro daquilo que se faz. E ter a oportunidade de chegar no Brasil e fazer essa transformação de marca através do cliente. Fazer com que hoje seja ele o maior reverberador desse novo momento da marca, é uma chance profissional realmente única.

O que você destaca desse novo consumidor que está no centro das atenções da empresa?
As ferramentas nos permitem ter esse termômetro, essa visão e interação direta com o cliente final. É uma chance única, ainda ter um tamanho crítico capaz de cuidar dessas pessoas e elas se sentirem parte dessa família. Hoje a lógica de consumo é que você quer consumir marcas que fazem sentido de alguma forma, não simplesmente pelos produtos que ela tem ou pela utilidade deles. Acredito que é isso que vai fazer as relações futuras serem tão bonitas entre marcas e consumidores, que não vão sair consumindo só porque é mais barato, mas porque faz sentido para eles.

Alê Oliveira

O Grupo trabalha mobilidade além da concepção do produto automóvel há algum tempo. Como está essa questão na Peugeot hoje?
Lançamos estrategicamente uma segunda perna de atividades do nosso grupo com um fundo de investimentos especificamente em serviços de mobilidade. Um dos aspectos é o da facilidade e familiaridade da conectividade do teu carro. Hoje o nível de conectividade que nossos carros podem oferecer faz o cliente ter um ambiente totalmente interativo por voz, para se sentir como se tivesse no escritório ou na casa. Acredito que o futuro das relações entre consumidores e automóveis estará muito ligado nessa relação de conectividade e espelhamento da vida dentro do carro. E quanto mais próxima for essa afinidade mais a pessoa se sentirá bem ali dentro.

Outros aspectos incluem o prazer de dirigir e opções de serviços?
Os nossos carros já proporcionam sensações gostosas de dirigir. A Peugeot tem, por exemplo, um volante reduzido e o fato de enxergar os visores por cima traz uma sensação meio de estar brincando no kart e se divertindo. São coisas intangíveis, mas já provadas que trazem muita fidelidade. Tem o que está intrínseco da tecnologia. E tem todos os serviços de mobilidade, car sharing, carpooling, travel car…

O Free2Move faz parte disso?
Hoje temos um leque gigantesco com o Free2Move. É um aplicativo que funciona na Europa, no qual você coloca onde quer ir, ele detecta onde você está e te dá as mais diferentes formas de chegar ao seu destino, desde ir a pé, locar um patinete, uma scooter ou um carro mais próximo – que pode ser desbloqueado pelo celular. Você escolhe a modalidade que te interessa naquele momento pelas suas necessidades. Temos mais de um milhão de seguidores lá. Lançamos o Rent para oferecer comodidade. Você pode ter o seu carro urbano, mas se quiser viajar no fim de semana com os amigos em um carro de sete lugares, por exemplo, você aluga pelo aplicativo, o carro vai até você ou o app mostra o que está mais próximo. Não precisa de chave.

A oferta de carros em plataformas multicombustível está nesse olhar?
Todos os lançamentos têm opção de elétrico e híbrido para o mundo. Foi uma decisão estratégica do Grupo de deixar o consumidor escolher.

Esses serviços apontam o futuro?
Eles vão crescer de maneira exponencial nos próximos anos, e as montadoras têm de estar preparadas para oferecer o leque. A relação com o cliente não vai ser ligada com a propriedade do automóvel, mas pelos serviços que somos capazes de prestar. E eles podem passar pelo automóvel ou por outros serviços que não estejam diretamente conectados com a propriedade de um carro. Parece intangível e é a realidade. Eu acredito muito no desenvolvimento de serviços conectados à mobilidade, e acredito que essa será a relação futura de consumo entre as pessoas e suas marcas favoritas.

Alê Oliveira