Volta e meia surgem artigos e posts em veículos de comunicação criticando a onda do storytelling: “Não tem nenhuma novidade nisso”, “A publicidade sempre contou histórias”, “É só mais uma picaretagem proferida por falsos gurus”.
Passei os últimos 7 anos da minha carreira estudando storytelling e trabalhando, direta ou indiretamente, com isso. Hoje dou aula sobre o assunto por todo o Brasil e presto consultoria para diversas agências e empresas que querem contar histórias. De certa forma acabei me tornando um desses “gurus” e, justamente por isso, sou obrigado a dizer que concordo com essas críticas. Pelo menos em parte.
Qualquer pessoa que tenha trabalhado alguns anos em comunicação e marketing já percebeu que, de tempos em tempos , surge uma nova buzzword que será vendida à exaustão. É sempre algo que vai revolucionar o mercado, garantir resultados certeiros e salvar o cliente. Storytelling, obviamente, não é nada disso. Tampouco “big data”, “design thinking” e “inbound marketing”. Mas isso não significa que essas coisas sejam inúteis. Quando bem aplicadas, por um professional sério, não vão mudar o mundo mas podem trazer bons resultados.
Nesse sentido é importante que o mercado entenda o que de fato é esse tal de storytelling, e no que ele pode ajudar.
Traduzindo, storytelling é contação de histórias. Na prática, trata-se de um conjunto de técnicas que normalmente são utilizadas por escritores, roteiristas e outros profissionais ligados à industrias de entretenimento.
Essas técnicas, decifradas desde Aristóteles, mostram como a organização de fatos em uma determinada estrutura narrativa tem o poder de prender a atenção das pessoas, transmitindo informações ao mesmo tempo que entretém.
Aliás, é justamente por causa desse efeito que o meio corporativo passou a se interessar pelo assunto. Com a batalha cada vez mais difícil pela atenção das pessoas, que se dividem entre várias telas e muitos gigas de informação, saber contar uma história virou uma arma importante.
Pense comigo. Ninguém tem tempo para nada. Mas quando um livro ou um seriado te pega, você dá um jeito de continuar lendo ou fazer maratona. Já a sala de cinema talvez seja um dos poucos lugares onde as pessoas ainda conseguem ficar duas horas sem olhar para seus celulares.
Uma história bem contada em uma propaganda de TV, nas mídias sociais, no palco de evento ou até mesmo em uma apresentação de PowerPoint pode trazer efeitos parecidos para uma empresa. Mas não se pode esperar por esses resultados sem antes dominar a técnica por trás disso.
É verdade que o storytelling não seja exatamente algo novo. Novidade é o interesse das empresas em assimilar essas técnicas de maneira profissional, aprendendo a fazer tão bem quanto ou até melhor do que a indústria do entretenimento. Afinal, a atenção do consumidor é uma só e, no fim do dia, o seu filme ou post estará disputando o mesmo espaço de uma notícia ou do novo seriado do Netflix.
Também é verdade que a publicidade sempre tenha bebido dessa fonte. Para isso ela tinha que contar com criativos que entendiam a lógica de uma história, muitas vezes na base da intuição. Mas, na prática, a maioria dos publicitários ainda não entendeu que uma história é sempre um personagem lutando contra forças antagônicas em busca de um desejo. Parece um detalhe bobo, mas quem domina já está na frente.
O clássico “Meu primeiro Valisere” de 1987, por exemplo, tem uma estrutura de história perfeita. Uma menina luta contra as dores do crescimento e se encontra como mulher a partir do produto que está sendo ofertado. Na linguagem literária o sutiã seria um “artefato” ou “objeto mágico”.
Então sim, o storytelling sempre esteve lá. Mas só recentemente começamos a nos dar conta dele e, quando isso acontecer em larga escala, passaremos a pensar mais como profissionais de entretenimento do que de publicidade. Ou pelo menos tanto quanto. E isso muda toda a indústria.
Bruno Scartozzoni é fundador do Escritório Caldinas, professor da USP e curador dos eventos Share, especializado em storytelling e branded content