Nesta semana lancei o meu segundo livro, chamado Super-Histórias (Panda Books). Ele é uma espécie de manifesto contra as chatices das histórias no mundo corporativo. Os inimigos de uma boa história não existem. Isso porque inimigo pressupõe que existe um herói e no mundo corporativo não existem heróis. Existem pessoas tentando o máximo de seus potenciais para criar o tão desejado “valor” para seus clientes e então receberem algo em troca.
Há exatamente um ano, recebi no escritório da The Plot, nosso sócio e maior autoridade em roteiros (do mundo!) Robert McKee. Foi uma conversa com alguns CEOs e donos de empresa (o que são conceitos completamente diferentes!). Um deles perguntou: “O que você acha sobre a ‘jornada do herói’?”. A resposta não poderia ser mais direta: “Esqueça isso”, disse ele com uma risadinha irônica querendo dizer “isso é bobagem”. Claro que ele fez um tipo, mas sustentou com propriedade dizendo que no mundo corporativo não existem heróis pois, por definição, um herói é aquele que está disposto a arriscar a sua vida pelo outro. E quem é que faz isso nas empresas? E também não existe “jornada”, afinal, ela acontece quando você, por exemplo, pega um ônibus de SP e vai para o Rio.
Temos que encarar a verdade antes de escrevermos Super-Histórias. E ela não é “cor-de-rosa”, afinal, os consumidores estão tentando fazer o melhor que podem para sobreviver num mundo cada dia mais incerto e muitas vezes egoísta.
Ao pensar numa campanha ou numa apresentação, lembre-se que o protagonista não é você, mas sim a sua audiência. É ela que precisa entender que você vai representar uma força a mais dentro dos desafios que ela enfrenta na sua vida. Os consumidores não caem mais em propagandas que colocam o produto no centro, exageram seus atributos e utilizam clichés para passar suas mensagens.
As marcas de cerveja ilustram bem esta realidade. Itaipava com sua campanha “O verão chegou”, utilizou uma mulher como garçonete, que se chamava “Verão”. Então a galera nas mesas chamava a “Verão” com uma conotação erótica: “Vem verão”, ela levava a cerveja. Então, de costas, voltava para o bar, com sua micro-saia, em câmera lenta, enquanto o previsível acontecia. Um bando de homens que pareciam ter saído da prisão e não ter contato com sexo há anos, diziam “Vai Verão, Vem Verão!”. Será que um dia alguma marca de cerveja vai chegar no nível de insinuar que um deles está se masturbando? Não duvido! 🙂
Será que, ao aprovarem esta campanha eles pensaram em mim? Eu não tomo cerveja em função das mulheres de micro-saia. Até porque, como aquela da propaganda, só mesmo na propaganda! Eu tomo cerveja para relaxar, conversar, viajar, filosofar, estar com amigos, falar bobagem, ou mesmo sozinho, enfim, tudo, menos em função daquela cena. E tem mais, mesmo que ela fosse “verdadeira”, quantas vezes uma marca de cerveja associou seu produto com mulher, bunda, peito e sexo?
O que fazer então? Entender e utilizar os princípios que uma boa história para qualquer campanha, de qualquer produto. E deixar pra trás o que um dia funcionou mas hoje está com os dias contatos:
- Cerveja e mulher
- Super-herói para telecomunicações (lembram do Super 15? Quem era aquele cara?)
- Esponja de aço e a separação de que lugar de mulher é na cozinha e o homem não entende nada deste assunto
- Campos paradisíacos com famílias felizes levantando o filho em câmera lenta e associando tudo isso a um Banco
- Carros andando em cidades que não existem, e transformando o ambiente em que passam, trazendo uma onda de curiosidade para todos e declarando que “vem aí a reinvenção do carro”
- Produtos cosméticos que prometem uma beleza que nem photoshop consegue entregar
- Enfim, a lista é enorme…
Sugiro que você esqueça por um instante que pode ser um herói e tem todos os atributos que seu cliente precisa. Comece explorando as forças contrárias, negativas, que impedem o cliente de chegar onde ele quer. E aí sim, analise como o seu produto, serviço ou ideia pode ser um aliado do cliente.
E se um dia você arriscar a sua vida para salvar outra, aí sim, me conte a história da “jornada do herói”. Espero que este livro que acabo de lançar ajude não só publicitários, mas qualquer um que queira usar a criatividade para gerar identificação com seus públicos. Afinal, o “criativo” não está só dentro das agências, ele está em qualquer lugar. Inclusive na praia tomando aquela cervejinha!
Joni Galvão é líder da The Plot e autor do livro Super-Histórias (Panda Books)