Há algum tempo, eu imaginei como iríamos nos comportar depois da pandemia, quando sairmos do “túnel”. Eu me atrevi a dizer, contra a visão precipitada de muita gente, que o futuro não nos reservaria um novo normal. Mas sim um novo antigo normal.

Muita gente torceu o nariz e outros, que não se manifestaram, devem ter pensado no quanto a pandemia havia distorcido minha visão da realidade e acelerado os primeiros sinais de uma fase gagá.

Ouvi muita gente garantir que os consumidores, finalmente, estavam aprendendo a refrear os seus desejos. Estavam se preparando para engavetar seus sonhos e suas compulsões no uso do dinheiro. E sabendo como viver sobre um “iglu” minimalista. Projetando um futuro em que seríamos capazes de reprimir e esconder essas vontades que conhecemos muito bem. E que dão um tempero e momentos, ainda que fugazes, de prazer na rotina muitas vezes insossa.

Houve os que me diziam: veja o que aconteceu em países da Europa que viveram sob os rigores da guerra. Eles controlam até o número de ovos e pães que compram. É verdade, eu já vi isso algumas vezes. Porém, a imensidão oceânica e hemisférica que nos separa não tem tido aqui o mesmo efeito. Nós não somos feitos da mesma matéria cultural.

Como nos ensinou Eduardo Giannetti em seu Trópicos Utópicos (Companhia das Letras, 2016), nosso futuro como povo, como nação, não é mimético, mas muito mais provavelmente profético. Não vamos reproduzir os padrões que construíram o que é o primeiro mundo da mesma forma como eles o fizeram. Temos as nossas próprias raízes e argila para formular o devir. O nosso segundo Hino Nacional, a Aquarela do Brasil (Ary Barroso), prenuncia essa trilha do futuro, recuperando o caminho que percorremos e temos pela frente. Ouçam!

Esse rápido olhar ensimesmado para quem somos e sobre como nos comportamos tem me inspirado e me conduzido a uma visão muito mais provável do que nos espera ali, logo depois da esquina da pandemia. Em trabalhos de que participo em branding, eu me alimento de um fermento fundamental, ou seja: aquilo que as pessoas estão sentindo neste momento e como prenunciam o amanhã. E para isso, melhor mesmo é dar um passo além do que elas nos dizem, já que consumidores dizem o que pensam, mas fazem o que sentem. E o que eles sentem?

Eles sentem que suas expectativas, planos, sonhos e desejos ficaram paralisados no meio do caminho. Não estamos no fim, nem no começo do fim desse longo e tortuoso trajeto que nos leva ao futuro, estamos apenas no fim do começo. Estamos ainda tirando o atraso.

As marcas com quem nós vamos festejar a saída deste “túnel” são as mesmas que compreenderam nosso sofrimento e estenderam as mãos e abriram seus corações durante esta dolorosa travessia.

São aquelas que não agiram com oportunismo. Que não se aproveitaram da nossa vulnerabilidade. Que não deixaram de conversar conosco, ainda que tenham sido apenas cochichos.

São as marcas que não se preocuparam apenas em salvar a própria pele, a qualquer custo. São muitas, com certeza a maioria. Aquelas que eu farei questão de ter mais próximas de mim nesse futuro que está chegando.

Muito melhor é aproveitar as premonitórias palavras do poeta:
“E quem me ofende, humilhando, pisando
Pensando que eu vou aturar
Tô me guardando pra quando o Carnaval chegar
E quem me vê apanhando da vida
Duvida que eu vá revidar
Tô me guardando pra quando o Carnaval chegar” (Chico Buarque)

Afinal, o compromisso das marcas sempre foi o mesmo: aliar-se à sociedade ao seu redor, muito mais do que atender os impulsos imperiais do mercado.

Jaime Troiano é presidente da TroianoBranding (jaime@troianobranding.com)