José Roberto Maciel: “Nossa curva de aprendizado em vídeos digitais foi muito grande”/Foto: Divulgação

Ao completar 40 anos no ar, o SBT traçou três grandes pilares pensando no futuro: conteúdo, tecnologia e dados. “Vejo oportunidades relevantes quando vislumbramos a chegada da TV 3.0, que passa a permitir a segmentação da publicidade olhando para a persona além do cluster”, aponta José Roberto Maciel, CEO da emissora. Para ele, haverá a adoção das ações de T-Commerce para integrar varejistas, instituições financeiras e serviços através dessa ferramenta. Com isso, aumentará a capacidade de a TV gerar cada vez mais conversa e capturar mais cadastros e dados de telespectadores, respeitando todas as premissas da LGPD.

Diante da proliferação de conteúdos e de plataformas de distribuição, como o SBT pretende se manter atrativo em sua próxima década?
O que estamos presenciando é a noção de que qualquer pessoa hoje pode se tornar um produtor de conteúdo em função de as redes sociais e as plataformas digitais permitirem isso. Mas alcançar relevância é algo complexo e demorado. Nesse sentido, o SBT com seus 40 anos de experiência, curadoria, tradição e credibilidade, continuará criando conteúdos que sejam relevantes para a vida das pessoas, quer seja para se entreterem ou se informarem. Iremos aprofundar cada vez mais o uso de todas as novas plataformas, tanto para levar nosso conteúdo tradicional da TV aberta para ser acessado ao vivo e on demand, como para produzir e agregar novos conteúdos que sejam nativos digitais, como já temos feito de forma crescente. Claramente percebemos que a TV aberta continuará liderando em gêneros de programação como jornalismo, eventos ao vivo, shows, reality shows e em novelas, que são parte da vida dos brasileiros. O SBT está atento a isso e presente em todos esses gêneros.

O perfil da emissora continuará sendo eminentemente popular?
Acho curiosa essa pergunta! Isso porque qualquer veículo que pretenda atingir centenas de milhões de espectadores, num país como o nosso, tem de ser popular por si só, ou então está fora do jogo! Esse é o papel da TV aberta: ser popular! Está em nossa essência. O que nos diferencia quando usamos o termo popular é que o SBT é querido, tem a simpatia do público e do mercado, porque somos autênticos, falamos com as famílias e levamos alegria e informação de qualidade todos os dias. Se isso é ser eminentemente popular, então continuaremos sendo! O que não significa que não tenhamos de ofertar uma programação que busque agradar a todos os públicos, desde aqueles menos favorecidos até aqueles com maior renda, já que dependemos da publicidade das marcas que desejam falar com
esses consumidores e gerarem conversão de leads, vendas e awareness. Não vejo diferença naquilo que plataformas como YouTube ou a recente TikTok buscam. Aliás, o que eles querem é mostrar que são tão populares como nós.

As indústrias da comunicação e da mídia estão em pleno processo de transformação digital. Como o SBT está se preparando para isso?
Temos total consciência disso e nosso planejamento estratégico fixou três grandes pilares quando olhamos para as competências que nossa empresa precisa ter: conteúdo, tecnologia e dados. Vejo oportunidades relevantes para nosso negócio quando vislumbramos, num futuro próximo, a chegada da TV 3.0, que passa a permitir a segmentação da publicidade olhando para a persona além do cluster; vejo a adoção das ações de T-Commerce para integrar varejistas, instituições financeiras e serviços através dessa ferramenta; acredito fortemente na capacidade de nosso conteúdo em gerar cada vez mais conversa e capturar mais cadastros e dados para que, respeitando todas as premissas da LGPD, possamos ajudar as marcas a acessarem as pessoas. Transformação digital é estratégica para o SBT.

E quais são as principais iniciativas do SBT nessa linha?
Várias delas estão sendo conduzidas pelo SBTLab, que foi criado faz dois anos com a missão de difundir pela empresa a cultura de inovação, da adoção de métodos ágeis de trabalho com a premissa de que ‘feito é melhor que perfeito’ e tudo daqui para frente estará em constante evolução e cada vez mais rápido. Nossa Universidade Corporativa tem preparado nossos líderes para que o processo de comando e controle seja cada vez mais substituído por um modelo mais horizontal via o empoderamento e responsabilização pelos resultados, mas, sem medo de tentar. Aliás, esse último já faz parte da nossa cultura, até pela característica marcante de nosso fundador que sempre foi um grande empreendedor. Desses processos estamos lançando aplicações que digitalizaram, por exemplo, todo controle das caravanas por onde as ‘colegas de trabalho’ vêm ao SBT para participarem dos auditórios; relançamos o game do Show do Milhão, que na Alexa está entre os três melhores dessa plataforma; lançaremos em breve o SBTAds, visando atender aos pequenos anunciantes; reorganizamos nosso CRM e realizamos diversas pesquisas, quer sejam voltadas à melhoria do conteúdo, quer sejam para atender a algum projeto que está sendo formatado para as marcas. Estamos automatizando a produção e estamos finalizando este ano a implantação no nosso novo sistema de MRP de TV, que já integra os processos de produção linear e não linear.

Falando em não linear, o SBT baseou sua estratégia no YouTube, como sendo sua principal plataforma de streaming. Continuará sendo assim ou há outras iniciativas?
A decisão de usarmos o YouTube para essa finalidade foi tomada em 2010, e foi acertada até aqui. Nossa curva de aprendizado em vídeos digitais foi muito grande e nos permitiu escalar nossa audiência a ponto de sermos um dos principais players de conteúdo nessa plataforma no Brasil e no mundo, sem a preocupação de que o sucesso da audiência nos penalizasse, já que o custo de banda de internet (CDN) poderia inviabilizar o modelo. Mas, paralelamente, criamos o SBTVídeos (ainda usando o player do YouTube), onde organizamos nosso conteúdo num formato de plataforma de streaming clássica. Em breve, subiremos nova versão e novos conteúdos. Isso é o embrião de uma solução mais robusta que está sendo desenhada. A beleza do não linear está no fato de que podemos agregar cada vez mais conteúdo onde tudo pode ser monetizado por vários modelos, desde o conteúdo premium, até aquilo que está no conceito de calda longa. Mas é importante frisar nossa relevância em audiência e seguidores em todas as redes socias e com grande produção de conteúdo pela nossa área de digital content. Mais recentemente passamos a produzir conteúdo de e-Sports e games, usando principalmente a plataforma do Twitch, onde já produzimos cerca de 200 horas mensais de conteúdo. É uma vertical na qual pretendemos crescer muito.

Vocês acreditam que com tanta oferta de conteúdo e tantas plataformas há ainda espaço no mercado brasileiro para mais serviços?
Acreditamos que sim. Mas depende do modelo. Apesar da crescente oferta de novas plataformas, o Brasil ainda é um país muito desigual. Nem todos podem pagar pelo conteúdo aos preços em que as plataformas estão se posicionando. Vejam o caso da Netflix, que recentemente reajustou seus preços, que chegam a R$ 56 por mês. Pode ser um preço justo para uma oferta justa, mas para a grande maioria dos brasileiros isso ainda é inacessível. Vide a quantidade de pessoas que compartilham suas assinaturas e racham a conta. Agora, que a tendência de consumo de conteúdo não linear é crescente, isso é inegável! E vai se acentuando quanto mais novo for o público.

Falando no público mais jovem, o SBT é a única emissora que mantém programação infantil na TV. Vocês não temem perder esse público que, como você disse, está migrando para as outras plataformas?
Sim e não! Claro que a questão geracional já impacta. Mas não pretendemos abandonar o infantil. O Silvio Santos sempre soube o valor de atender a esse público e, com isso, conquistamos o que toda marca quer: a afetividade. Temos isso e o infantil sempre foi estratégico na construção da memória afetiva. Já temos ajustado nossa programação para acompanhar esse movimento, construindo novos conteúdos no digital para manter a relação com esse público. Criamos um canal específico que é o TVZyn, “Zyn” de geração Z, com nosso casting da TV, com novos influenciadores e produzindo com eles conteúdo nativo digital. A plataforma cresce muito a cada mês. Olhem que curioso: estamos reexibindo a novela Chiquititas na TV, já que tivemos de paralisar a produção das telenovelas em função da pandemia. Essa novela está também no Netflix e podem olhar lá, que deve estar entre os Top 10 do dia. Aliás, junto com outra novela nossa – Carrossel.

Você comentou do impacto da Covid na produção da novela. Vocês retornarão com a produção?
Sim, retornaremos. O nosso planejamento é voltar a gravar no início de novembro com toda segurança necessária. Estamos agora na fase pré-operacional. Mas ainda mantemos a intenção de poder ampliar o núcleo de dramaturgia, quer seja para atender a nossa grade, quer seja para fomentar a produção a terceiros, já que temos uma excelente infraestrutura para isso. Como disse, as novelas fazem parte do repertório do cotidiano do brasileiro, portanto, é estratégico para nós.

A pandemia também exigiu muito das estruturas de jornalismo dos veículos. Como o SBT lidou com isso e o que pensam pela frente?
Acredito que as estruturas de jornalismo nunca foram tão exigidas como agora. Se há uma área onde o conceito do VUCA se aplica muito bem é no jornalismo. Já fomos os percursores de muita coisa em jornalismo. Nossa história mostra isso quando olhamos modelos de jornalismo investigativo, da “câmara na mão”, da figura do âncora de telejornal, do casal de bancada etc… Se isto hoje é menos percebido, também tem relação com a proliferação de notícias para tudo quanto é lado. Mas são críveis? São imparciais? No nosso caso, mais do que dizermos que somos, melhor é quando nos avaliam assim, e foi isso que vimos na recente pesquisa da renomada Reuters, que indicou o Jornalismo do SBT como Nº 1 “Brand Trust” no Brasil. Esse é o tipo de relevância que perseguimos. Novamente, olhando para a premência da notícia e de estar em cima do fato, lançamos há dez meses a plataforma SBTNews, com matérias, podcast e programas ao vivo. Isso amplia nossa presença, permite criar oportunidades para novos talentos e mantém o público do SBT informado ao longo do dia, sem competir com a grade do linear, que tem hoje cerca de 7 horas diárias de jornalismo de segunda a sexta.

O SBT voltou recentemente a adquirir torneios de futebol. Isso veio para ficar?
Esse é nosso forte desejo e uma das nossas missões. Como diz o Silvio Santos, “o SBT é popular e o futebol também, então combina com a gente”. Ele tem razão! Agradecemos pela confiança que estamos tendo para consolidar esse gênero em nossa programação e em nossas plataformas. O futebol brasileiro é um ativo muito valioso e ainda pouco desenvolvido quando comparado com as ligas de outros países e, se pudermos ajudar a desenvolver esse esporte, que também tem responsabilidade social e é um patrimônio cultural do país, ficaremos muito felizes. Isso está gerando várias novas oportunidades, tanto para os profissionais envolvidos, como para os anunciantes e, claro, para o resultado da empresa. Estar hoje com Libertadores, UEFA Champions League, Europa League, Copa do Nordeste e termos feito as transmissões da Copa América, tudo isso em menos de um ano, tem sido um trabalho muito desafiador, mas muito recompensador também.

Como o SBT chega aos 40 anos e como encara o futuro?
Chegamos com a disposição, a curiosidade e a ansiedade de nosso fundador que, aos 90 anos, volta ao palco para estar junto às suas ‘colegas de trabalho’ e a seu público de todas as idades, com muita energia para entretê-los e encantá-los com sua alegria de sempre e seu desejo de ajudar a construir um país melhor. Olhamos para o futuro com muito respeito ao trabalho do passado, que foi construído com o esforço de muita gente importante em nossa história, mas com a convicção de que teremos de reaprender muita coisa para continuarmos na disputa em um mercado cada vez mais competitivo e agressivo. Mas sem nunca perder a essência de ser a “TV Mais Feliz do Brasil”, que foi e está sendo construída junto com todos os nossos parceiros de negócio, agências, anunciantes, emissoras afiliadas, elenco artístico e jornalistas, todos os nossos profissionais dedicados e, especialmente, nosso querido público. Vamos em frente!