Primeiro brasileiro na presidência do júri de Film Craft Lions, João Daniel Tikhomiroff, fundador e chairman da Mixer, que também é o segundo diretor de cena mais premiado do Cannes Lions, diz que a única barreira que o Brasil enfrenta na categoria é o orçamento. “A única barreira que existe é o orçamento, que está cada vez pior devido à situação do Brasil.” Ele também afirma que para ganhar prêmio em Film Craft é importante ter uma boa ideia por trás da produção. “É uma categoria muito forte e não é apenas o aspecto técnico que se avalia, é o técnico em função da criatividade, da ideia”, destaca Tikhomiroff. Confira abaixo os principais trechos da conversa entre ele e o propmark.
Expectativas
“Eu ainda não tive condição de mergulhar em todo o processo, mas em paralelo, evidentemente, tenho conversado com outros jurados e outros presidentes de júris também, afinando formas de trocar algumas ideias para tentar ter um resultado bacana em todas as categorias. Há um bom afinamento entre os meus jurados e os demais presidentes de algumas categorias que têm sobreposições naturais com Film Craft, como Film, Branded Content e Cyber. São categorias que vão ter peças comuns, naturalmente. Então é interessante uma troca de ideias para chegar a um resultado final que seja o melhor dos melhores.”
NOVIDADES
“Com a internet, já comecei a ver de algum tempo para cá algumas coisas que naturalmente estarão em Cannes. Tem peças que os brasileiros já mandaram para mim e também algumas de fora que recebi. Minha expectativa, honestamente, é que vamos ter peças em geral bastante relevantes, muito boas. A área de Film Craft, embora no Brasil não seja muito difundida, historicamente é muito conhecida e respeitada no mundo, pois ela representa o que é o Oscar, afinal são as mesmas categorias, como Melhor Filme, Melhor Direção, Melhor Roteiro e Melhor Música. É uma categoria muito forte e não é apenas o aspecto técnico que se avalia, é o técnico em função da criatividade, da ideia. Não adianta premiar uma peça lindamente fotografada, inovadora, mas que por trás da fotografia não tem uma ideia. O ponto de partida é uma ideia boa e a partir dela vamos nos debruçar sobre como a realização conseguiu evoluir, deixando a peça num nível de excelência que justifica o prêmio.”
BRASIL
“O Brasil nunca conseguiu Grand Prix em Film Craft e em Film também. Eu acho que falta ter um grande filme, um filme que tenha todos os ingredientes. É quando todos os Crafts estão no topo máximo e poderiam ganhar ouro em todas as categorias. O Brasil pode, a qualquer momento, ganhar um GP. Eu acho que o Brasil sempre teve, guardadas as suas épocas e condições, boa qualidade e tradição em realização, tanto em cinema como televisão. O país já ganhou prêmios nos principais festivais de cinema, como Urso de Ouro em Berlim, Palma de Ouro em Cannes, e em televisão também, como Ame Awards. E há muitos brasileiros dirigindo filmes nos Estados Unidos, roteiristas premiados, indicados para o Oscar, diretores de fotografia trabalhando no mundo inteiro. E são os mesmos que no fundo fazem publicidade, seja num formato mais convencional, do break, ou seja fazendo conteúdo. Então não é por falta de talentos que a gente deixaria de ganhar um Leão em Craft, temos qualidade, definitivamente. Também temos o que há de melhor em termos de equipamentos.”
ORÇAMENTO
“A única barreira que existe é o orçamento, que está cada vez pior devido à situação do Brasil. O que acontece é que os orçamentos de produção no país estão muito aquém dos orçamentos de produção de países como Estados Unidos, Inglaterra, França e Austrália. E quando se fala em Film Craft, claro que uma grande produção, se há uma grande ideia por trás, vai aparecer de uma maneira muito mais exuberante, esplendorosa, com chances de ser muito mais um Grand Prix do que um filme de orçamento baixo. Isso é natural. E o Brasil ainda tem uma mentalidade focada muito mais na mídia do que na produção.”
INTERNET
“Se pegarmos os principais Grands Prix de Cannes no passado, tanto em Film como em Film Craft, vamos notar que boa parte dos filmes ganhadores de Ouro ou GP são formatos que não são os convencionais A maioria deles, eu diria que mais de 70%, são feitos para uso na internet. E são as produções mais caras, de milhões de dólares, sendo que as produções menos caras são as que vão para televisão. Lá fora, o uso da internet, do streaming, é uma realidade. A maioria da audiência está muito mais focada nessas plataformas. No Brasil ainda não é assim. Em 2010, no primeiro júri de Film Craft de Cannes, eu era membro do júri. O Grand Prix foi para Philips, com uma série de filmes (“The Gift”) só para internet com produção de milhões de dólares pela produtora de Ridley Scott. Foi um case mundial para vender um televisor Philips. O conteúdo em si não mencionava em nenhum momento a TV. Não tinha nem product placement. Era uma história de ficção pura.”
ENTRETENIMENTO
“Cada vez mais, eu diria que a publicidade é entretenimento, pois cada vez mais também, o consumidor busca uma publicidade que seja entretenimento. Hoje, o espectador não é mais passivo como era antes, ele é absolutamente participativo, cada vez mais chegando a proximidade de ele formar a sua própria grade e, naturalmente, a publicidade está no mesmo caminho.”
EXPERIÊNCIA
“Todos nós sempre temos a aprender e a ensinar. Acho que a gente tem que estar sempre aberto. E é claro que uma pessoa que tenha mais experiência, pode talvez ensinar um pouco mais do que aquela que não tem tanta experiência. Porém, a gente que tem experiência tem que aprender muito com quem não tem experiência, mas às vezes tem uma determinada postura e um olhar que talvez você não tenha. E essa troca é sempre muito positiva nos júris.”