Uma vez minha agência foi contratada pelo PSDB para fazer a campanha de seu candidato ao governo do Rio de Janeiro, Ronaldo Cezar Coelho, um empresário respeitado, rabeira nas pesquisas de intenção de voto, mas com um belo potencial de crescimento graças a uma folha corrida com muitos méritos e um discurso bastante coerente, além de ser uma pessoa simpática. Na chapa, como senador, meu querido irmão Técio Lins e Silva, paladino na defesa dos perseguidos pela ditadura, advogado brilhante e figura das mais carismáticas. O vice era o professor Carlos Lessa, ex-presidente do BNDES, economista genial e um dos cariocas mais apaixonados pela sua cidade. Fui o último a ser convidado, numa equipe que tinha Milton Coelho da Graça, Bob Feith, que estava voltando de Nova York, onde era correspondente da Globo, e outros cobrões do mesmo porte.

Junto com eles, vieram alguns dos melhores profissionais de televisão daquela época, nomes até hoje consagrados, ainda em plena atividade. Uma equipe de sonhos, num ambiente de trabalho delicioso. Alugamos uma casa enorme na Lagoa Rodrigo de Freitas e montamos um estúdio da maior qualidade, capaz de produzir os mais emocionantes programas de televisão que o talento pode criar. Estou exagerando? Um pouco. Mas só um pouco, posso garantir.

Do outro lado, o concorrente, Brizola, não tinha nada disso, a não ser o carisma natural do velho engenheiro e a sua charla de estancieiro dos pampas, capaz de manter uma conversação por horas, falando de um mundo de heróis valentes, frases de efeito e imagens poéticas, algumas carentes de sentido. No horário gratuito tínhamos o mesmo tempo, uns dez minutos cada candidato.

Nós fazíamos programas que tinham cuidado de produção padrão Globo, baseados nas mais apuradas pesquisas, com textos que mereciam exames cuidadosos, utilizando as mais modernas técnicas de persuasão. Sabem estas coisas todas que o pessoal que trabalha com internet fica dizendo que elegeu o Obama? Pois é, a gente já fazia mais ou menos isso desde aquela época. Do outro lado, Brizola vestido com uma camisa azul tendo ao fundo uma parede também azul, sem roteiro nem nada, falava o que lhe dava na telha. Um papo meio desgarrado, ideia puxando outra, câmera fixa, e cada vez mais ele subia nas pesquisas. Uma verdade era indiscutível: nossa tecnologia e nossa arrogância de especialistas estavam perdendo para uma cara que não apresentava planos de governo e dizia coisas que não tinham significado concreto. Por exemplo. Todo programa ele se referia a certas “perdas internacionais” que o Brasil estava tendo. Nunca explicou o que queria dizer nem o que isso tem a ver com o estado do Rio de Janeiro. Mas parecia um risco grave.

Resumo: Brizola, um gaúcho, candidato ao governo do Rio, que começara a campanha com 2% de intenção de voto, sem recursos materiais, com um discurso meio atabalhoado, subia diariamente nas pesquisas. E nós empacados. Até que um dia resolvemos apelar. Entrar na briga direto, na tentativa de polarizar a disputa. E fizemos um programa da maior profundidade, apresentando nosso plano de governo e dando algumas cutucadas no Brizola, que não apresentava plano algum. E ficamos esperando a resposta.

Brizola simplesmente ignorou. O máximo que fez foi se dizer vítima de uma “orquestra perversa”. E, para nosso candidato, reservou uma pérola. A certa altura, falando de seus adversários referiu-se a ele como “um tal de Ronaldinho”, com sotaque bem gaúcho. Perdemos. Tirando os CIEPs, Brizola fez um governo controverso. Um acordo com Collor trouxe dinheiro para algumas obras viárias importantes. Já que estava com a mão na massa, dizem que fez acordos outros, inclusive na área da segurança. Mas, apesar de cercado de uma troupe para lá de suspeita, não enriqueceu. Nem queria, seu negócio era outro.