Escrevo este texto durante minhas férias, que passo em Portugal. Além das maravilhas gastronômicas e dos belos passeios pelo destino da moda, durante um inverno deliciosamente light, impossível deixar de analisar o marketing desse belo país e compará-lo ao praticado no Brasil. Amigos publicitários recém-chegados à Terrinha desde pronto previnem: o mercado português é muito pequeno. Além das pequenas dimensões do país e sua população 20 vezes menor que a nossa, a cultura da “Terrinha” faz tudo parecer um tanto naive e low profile, em termos de marketing. Segundo o amigo Gui Pacheco, um desses publicitários brasileiros neoportugueses, há ainda certa resistência dos portugueses a agências de fora. As empresas anunciantes aparentemente “protegem” os seus compatriotas, dificultando a vida de agências “de fora”. Há profissionais bons “importados” do Brasil, mas não agências tupiniquins.

O país, principalmente sua capital Lisboa, vive um boom econômico, decorrente das suas atrações turísticas, a preços mais módicos que seus vizinhos, principalmente os de fora da península ibérica, atraídos também pelo seu clima e ambiente de segurança. O turismo já responde por mais de 10% do PIB do país (no Brasil, é menos de 5%). Mas é o mercado imobiliário que se apresenta mais exuberante. Num dos passeios de barco pelo Rio Tejo, com uma vista privilegiada, tentei contar os guindastes instalados pela cidade. O piloto do barco se adianta: são mais de 50. São obras de retrofit de belíssimos prédios históricos da cidade, que recebem ambientes contemporâneos no seu interior, sem alterar suas lindas fachadas históricas. Fiquei no apartamento de um amigo brasileiro num desses prédios retrofitados, no charmoso bairro do Chiado. O resultado é fantástico: todos os benefícios de paredes largas e pé-direito alto aliados agora a ambientes modernos. Ainda faltam alguns recursos modernos – garagens, por exemplo -, mas o resultado dessa combinação do velho mundo com o novo mundo é muito bacana.

Como efeito colateral, o preço de se viver nesses bairros mais nobres, em prédios remodelados, cresceu muito, expulsando moradores antigos para bairros mais distantes. Mas os contrastes entre o velho e o novo estão presentes por todos os lados. Um dos eventos mais importantes de tecnologia, por exemplo, é realizado em terras lusitanas: o Web Summit. Mas ao caminhar pelo comércio mais tradicional, pelas ruas dos bairros históricos da cidade, nota-se quase sempre um vitrinismo simplório e merchandising ainda muito amador, sem sofisticação mercadológica. Se meus amigos que moram aqui não me contassem eu jamais saberia que a livraria Bertrand, no Chiado, é a mais antiga do mundo. Há apenas uma pequena e escondida placa ressaltando isso. Seu ambiente interno é incrivelmente simples, sem deixar os visitantes com a sensação de estar numa livraria histórica.

Não dá para entender. Qualquer marqueteiro tentaria reproduzir um ambiente que remetesse aos tempos antigos da livraria, mas o que vemos lá é uma livraria comum, como as demais. Por outro lado, empreendedores mais ativos se sobressaem e se dão bem nesse mercado em ascensão. É o caso do Midas da gastronomia José Avillez. Chef jovem e empreendedor, Avillez, que teve como mestre o incensado Ferran Adrià, nada de braçada na gastronomia lisboeta mais refinada. Desde o seu maravilhoso Belcanto, detentor de duas estrelas Michelin (não deixe de experimentar na sua vinda a Portugal – é caro, mas vale cada centavo) até o Cantinho do Avillez, passando por propostas menos pretensiosas, mas todas muito criativas, como o seu Bairro do Avillez, que reúne num mesmo espaço uma mercearia, uma taberna, um páteo e um beco, cada ambiente oferecendo uma experiência gastronômica única.

Foi esse contraste entre iniciativas empreendedoras e modernas com outras datadas de décadas atrás, como a maioria do comércio de rua, que me fez escrever esse texto. Será que nós, que fomos educados na cartilha do marketing mais agressivo, de origem americana, estamos certos? Ou os mais tradicionalistas e comedidos portugueses é que estão? De qualquer maneira, é bom viver esses contrastes. Não é agradável ver só um monte de McDonad’s e Starbucks em cidades que antes tinham seus cafés e restaurantes tradicionais. Assim como os prédios remodelados de Lisboa, não é nada mau ter um marketing retrofitado, fazendo conviver o velho (e belo) com o novo (e moderno). Concorda?

Alexis Thuller Pagliarini é superintendente da Fenapro (Federação Nacional das Agências
de Propaganda) (alexis@fenapro.org.br)