“Compre o meu carro, compre o meu”. Foi assim que Celso Loducca, presidente da Loducca.MPM (que atende a Peugeot), definiu a mensagem publicitária das montadoras diante da corrida para comprar carros no Brasil. Claro que a citação do publicitário é apenas ilustrativa. Mas ela serve para mostrar que nunca se vendeu tanto carro no País e que as montadoras estão “pegando” o cliente na esquina com a ajuda da propaganda. O Brasil já é o quarto País que mais vende veículos no mundo, ultrapassou a Alemanha e está atrás somente de China, Estados Unidos e Japão, segundo os números divulgados na semana passada pela Anfavea (Associação Nacional dos Veículos Automotores).

De janeiro a maio deste ano, as vendas de carros no País somaram 1,32 milhão de unidades (aumento de 15%). Segundo a Anfavea, o total supera em 30 mil veículos o mercado alemão. A entidade afirma que a manutenção desta posição dependerá de como a Alemanha reagirá diante das dificuldades econômicas na Europa. Enquanto isso, o mercado brasileiro de carros cresce em ritmo acelerado. A estimativa da entidade é de que a produção nacional alcance a marca recorde de 3,40 milhões de unidades, fechando com alta de 8% em relação ao ano passado.

Na opinião de Hugo Rodrigues, vp nacional de criação da Publicis (que inclui Publicis Brasil, Publicis Dialog e Salles Chemistri), a grande demanda por carros é natural, já que a relação de habitante por veículo no Brasil está longe da média mundial. “São Paulo não é o Brasil. A gente acha que a quantidade de carros é muito grande, mas a relação do habitante por veículo no País está longe da média mundial. Tem muito brasileiro que ainda não realizou o sonho do primeiro carro zero”, disse.

Loducca diz que para manter o espaço as montadoras têm de falar mais alto. “A vontade de comprar carros está aí, é grande. O investimento em comunicação aumenta em relação à competição. Para poder ao menos manter o seu espaço, tem que utilizar mais voz”, comentou o publicitário.

Investimentos

Os investimentos das montadoras no País são altos. De acordo com a Anfavea, o investimento total de 2008 a2012 no mercado interno será de US$ 9,2 bilhões. Os investimentos são em inovação tecnológica, aumento da capacidade de produção e marketing. No ano passado, só a GM anunciou investimento de R$ 2 bilhões no Brasil.

No ranking do Ibope dos 30 maiores anunciantes, seis deles são montadoras: a Hyundai Caoa aparece em quinto lugar, com investimento de R$ 744,5 milhões.  Na sequência, vem Fiat (sexto), que é líder em vendas, com investimento de R$ 737,9 milhões; Ford (10º), que investiu R$ 557 milhões; GM (12º), com R$ 508 milhões; Volkswagen (14º) com R$ 485,9; Peugeot/Citroën (25º) com R$ 368,2 milhões. Os dados são referentes a 2009 e os valores são brutos, não consideram os descontos dados pelos veículos de comunicação.

A Hyundai é um capítulo à parte nessa história. Já há alguns anos tem frequência ostensiva na mídia, tanto que está entre os cinco maiores anunciantes brasileiros. A Z+, agência que administra a verba publicitária da marca coreana, afirma que a estratégia da montadora é mesmo agressiva. “A filosofia de marketing da Hyundai é pautada em agressividade total, em todas as áreas de atuação, porque a montadora acredita que o que move vendas é propaganda de massa. A gente só utiliza os veículos de maior cobertura, de qualquer um dos meios de comunicação, TV, revistas, jornais”, contou Vicente Raggio, responsável pela conta do Grupo Caoa/Hyundai.

O executivo destaca que o grande salto da Hyundai foi dado em 2006, depois do lançamento do Tucson, que hoje é líder de mercado na categoria SUV compacto Premium. Ele ressalta que a marca anuncia diariamente nos jornais O Estado de S. Paulo, Folha de S.Paulo e O Globo; semanalmente nas principais revistas e também na Rede Globo, com oito inserções diárias. 
“Quanto mais o cliente vende carros mais continua investindo em comunicação. A Hyundai acredita realmente no poder que a comunicação tem para alavancar vendas”, disse Alan Strozenberg, sócio e vp da Z+.

Marcas de valor

Há muito mais tempo no Brasil,  Volkswagen, Chevrolet, Fiat e Ford praticamente já estabeleceram uma ligação afetiva com o consumidor brasileiro. No momento, o objetivo dessas montadoras é mostrar que são marcas de alto valor. “A Volkswagen é uma marca de alto valor, é um standard de qualidade. E por isso o posicionamento de comunicação da marca é: ‘A Volkswagen tem carro, e tem carro mesmo’”, explicou Fernão Cosi, diretor de unidade de negócios da AlmapBBDO e responsável pela conta da Volkswagen.

A Chevrolet – cuja conta publicitária está há cerca de 10 anos na Salles Chemistri (do Grupo Publicis) –, que foi líder de mercado por vários anos e que no início dos anos 2000 mexeu com o varejo com campanhas como “Poeira”, agora quer ser reconhecida como marca premium. “O foco de campanha muda, passa a ter mais conteúdo, vendendo o carro como diferencial e  atingindo pessoas que procuram mais qualidade”, observou Hugo Rodrigues.

Outra demonstração de força do mercado brasileiro foi com relação à crise da GM nos Estados Unidos. Naquele momento, a GM Brasil passou a ser espelho para a matriz. “Na época, foi criada a campanha ‘A GM do Brasil é a GM do futuro’. O market share continuou em torno de 20% no País, durante crise, e a filial brasileira se fortaleceu. Nossa relação com a GM é muito forte”, disse o vp de criação da Publicis. A divisão da conta da GM é a seguinte: digital está com a AG2, institucional e branding com WMcCann e varejo e pós-venda com Salles Chemistri. 

Economia está favorável

Além da enorme vontade do brasileiro de comprar carros, o aumento do consumo da classe C e o crescimento da economia também favorecem o avanço das vendas das montadoras. Em síntese, o cenário é extremamente favorável para a aquisição de bens de consumo, como a compra do desejável primeiro zero quilômetro.

Na semana passada, o IBGE divulgou crescimento de 9% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro no primeiro trimestre de 2010, em comparação com o mesmo período do ano passado, sendo que a indústria e os investimentos foram os grandes destaques. Trata-se da maior taxa já registrada desde 1995. O ritmo de crescimento já é comparado ao padrão chinês.

Para o professor de finanças e economia da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas, Rogério Sobreira, o resultado aponta uma expansão magnífica, porém é preciso estar atento aos riscos relacionados ao crescimento exacerbado. “O resultado mostra que a economia brasileira se recupera com exuberância, porém a questão que se coloca é até que ponto o País suportará um crescimento como esse. Abrimos o debate sobre o nosso potencial de expansão, pois há o risco de bolha e inflação. Manter esse ritmo sem pressionar preços é impossível. A economia brasileira não está preparada para crescer no ritmo chinês”, disse Sobreira. O especialista esclarece que para o Brasil suportar o crescimento de 9% é preciso expandir o percentual de investimento. “Temos uma série de investimentos estruturais que devem ser feitos sistematicamente para que consigamos sustentar o ritmo de 9%”, defendeu.

Experiência na web agrega

Antes do governo Collor (1990-1992), que abriu o mercado brasileiro às importações, o que se via nas ruas das cidades do País eram basicamente carros de quatro montadoras: Fiat, Ford, General Motors e Volkswagen. Era muito raro um brasileiro ter um automóvel de marca importada. Só quem fosse muito rico. Hoje, além da miscelânea de marcas que se vê nas ruas do País, outro aspecto da frota nacional é que ela é bastante nova. O cheiro de carro zero quilômetro é um dos trunfos das montadoras.  Brasileiro adora. Há três anos, os compradores do primeiro carro zero quilômetro representavam 10,5% das vendas, hoje são 18%.

A experiência que o consumidor pode ter com um carro na internet também é outro fator que vem ajudando as montadoras a vender seus novos modelos. Há inúmeros exemplos de ações nesse sentido. Os fãs do Uno (Fiat), por exemplo, já podem montar o Novo Uno pela internet de acordo com sua preferência de cor e versão.

André Zimmerman, ceo da Havas Digital – que controla no Brasil a Media Contatcts (agência de marketing interativo), e a Mobext (mobile), donas da conta digital de Peugeot e Citroën –, relata  o desenvolvimento das marcas no meio digital. “Quando as  campanhas digitais começaram eram muito básicas, praticamente uma adaptação do meio offline para internet, sem muita sofisticação. Pouco a pouco elas foram evoluindo. Há quatro anos as marcas começaram a investir em buscadores,  desenvolvimento com games, hotsites interativos. O uso das mídias sociais é mais recente, há cerca de dois anos”, comentou  o executivo, acrescentando que cada vez mais a internet se torna estratégica na comunicação das montadoras.

Outro ponto que o brasileiro vem valorizando mais é o design dos automóveis. “O design já começou a virar uma coisa importante. Prova disso é o lançamento do Novo Uno, um carro popular baseado em design”, destacou Celso Loducca, presidente da Loducca.MPM. Outro aspecto importante é a brasilidade da marca. “A Peugeot é uma marca francesa que está instalada há muito tempo no Brasil, mas isso não é muito percebido. Existem pessoas que ainda acham que Peugeot é carro importado. A demanda é tão alta, que a prioridade no momento é preencher espaços em detrimento de fazer um trabalho de médio prazo, mas isso não quer dizer que a gente não planeje trabalhar mais a brasilidade da Peugeot”, contou Loducca.

por Kelly Dores