Quando a DPZ&T conquistou, recentemente, a conta da RedBull, Eduardo Simon, CEO da agência, ouviu do cliente que ela foi escolhida por ser “a mais moderna do mercado atual”. Para quem há três anos comandava uma das fusões mais difíceis e complexas da história da propaganda – a que uniu a DPZ, comprada pela Publicis, à Taterka – o comentário deveria ser a prova de que a fusão deu certo. Mas, Simon, que acredita na permanente reinvenção, prefere não afirmar que a fusão “deu certo”. “Está dando”, ele repete, como um mantra, mas com um objetivo em mente: ser a melhor agência do Brasil. “Qualquer pretensão menor que esta vai dar o mesmo trabalho, e não faz jus ao que recebemos de legado”, afirma. Veja a seguir os principais trechos desta entrevista.
Crise e transformações
As transformações do mercado estão só começando. Se a gente imaginar que tem de mexer ainda em assuntos tão complicados como modelo de remuneração, de relacionamento comercial com veículos, e ressignificar a relação com os clientes. Hoje você vê clientes importantes montando house agencies novamente. Percebemos que existe uma transformação enorme no mercado. Transformação muitas vezes é igual a sofrimento, depende de como você olha.
Fusão e sentido
Não é que deu certo. Está dando certo. O primeiro ano da fusão foi de sobrevivência, de não perder qualquer uma das contas – com o mercado inteiro apostando contra. O risco de não dar certo era grande. Se eu perdesse qualquer uma das contas fundadoras dessa nova agência, qual era o sentido da fusão? Para não perder, você tem de mostrar rápido para os clientes que a fusão que origina uma nova empresa faz sentido para eles. No segundo ano, havíamos não só mantido as contas como crescido nosso share nelas. Ali tivemos certeza de que a proposta do modelo de negócio que estávamos propondo tinha valor para os nossos clientes. Não adiantava sair prospectando se os nossos clientes ainda não tinham dito “essa agência me interessa”. Depois disso, prospectamos e entraram contas relevantes como a Petrobras, numa concorrência superdifícil, a Renault e a RedBull. O mercado já enxerga que o trabalho que estamos fazendo e entregando para os nossos clientes tem bastante valor.
Valor e modelo
Estamos em um momento importante. Digo para o meu time: o que nos trouxe até aqui, não será o que vai nos levar daqui para frente. Por que não posso ser um agente transformador dos negócios dos meus clientes? Olhamos para os nossos clientes da seguinte forma: este cliente tem problemas e precisa de alguém que entenda a marca dele bastante e não alguém que só quer vender um plano de mídia. Tudo isso não quer dizer que não tenhamos mídia no core do nosso negócio. Somos uma agência que tem três cotas de futebol, patrocínio da novela Segundo Sol, somos um dos grandes compradores de mídia do Brasil. Compramos para nossos clientes mais de
R$ 1 bilhão de mídia.
Liberdade e resultados
Se eu não perdi a relevância criativa que as agências tinham, e agrego dados, sou capaz de oferecer para o meu cliente algo muito mais preciso e mais valioso, e consigo conversar sobre atribuição de valor – que é a discussão libertadora do nosso mercado. Erramos ao não querer conversar sobre isso no passado, que é quanto do que eu faço está resolvendo os problemas do cliente e gerando vendas. Essa é a conversa que precisamos ter. Quando pego a conta da Renault, faço três campanhas seguidas e eles sobem de sétimo para quarto lugar no ranking, sem nenhuma variável de preço, distribuição, mas a partir, essencialmente, da mudança de comunicação, estratégia, mídia (e a forma como a olhamos) e o trabalho digital, sei atribuir valor ao trabalho que estamos fazendo.
Ressignificação
Vivemos um momento espetacular de ressignificação de tudo. Ontem eu assistia a um debate com candidato no Jornal Nacional (Globo) e no primeiro break quem anunciava com um comercial exclusivo era o Google. Olha que momento significativo. O Google, com toda a sua capacidade de mensuração, sabe o retorno que dá o investimento em TV aberta. Olha que interessante se eu estiver equipado, entregando as ferramentas certas, como a discussão sobre usar TV aberta ou não vira secundária, e dá lugar a falar de performance.
Menos, por menos
Nos últimos 15 anos, eu agi assim: o cliente pagava menos, eu entregava menos. Eles achavam que estavam fazendo um bom negócio, e as agências também. É um jogo de perde, perde. A discussão central, portanto, é de atribuição de valor. Não é assim que o digital faz? Não cobra por click, por resultado? Seria ingênuo dizer que não temos nada a aprender com esse modelo que veio, maravilhoso, em que os clientes não reclamam quando gastam milhões porque sabem que isso está atrelado a um resultado que está sendo construído. Passa por aí o nosso modelo mental de transformação.
Ideias e projetos
Vendemos ideias, não filmes. Vendemos projetos, e tenho muito orgulho de ter ajudado clientes a criar produtos. Acabei de colocar Renault e McDonald’s juntos numa promoção. Conhecemos as duas marcas o suficiente e num momento em que a economia está com problemas, e os desafios são enormes, colocá-los juntos está sendo maravilhoso para os dois, seja do ponto de vista de imagem, seja de resultado. E não foi fácil, mexemos no jingle do Bic Mac! Mas quando eles veem valor, assumem o risco. Fizemos uma latinha da Coca-Cola comemorando os 50 anos do McDonald’s. Isso é propaganda? Tem a ver com mídia? Pode ter? É libertador. A relação vira outra.
Longevidade e reinvenção
A gente vive um mercado que celebra as concorrências. Agência tal ganhou a conta tal. E as relações que são duradouras, se renovam e não falamos nada a respeito? Eu tenho Itaú e Vivo desde que era Telesp. As grandes histórias da propagada brasileira são histórias marcadas pelo fato das agências e os clientes conseguirem se reinventar juntos. Veja Almap e Havaianas, Volkswagen. Quanto vale a história que esses caras construíram juntos? Essa é a diferença do nosso posicionamento, do posicionamento das consultorias, por exemplo. Que de repente viraram o bicho-papão do mercado, mas aonde estão? Que projetos fizeram?
Resultados e propósito
Acho que a gente, às vezes, perde o propósito. Infelizmente como todas as agências foram vendidas para grupos internacionais, todos de capital aberto, experimentamos o vício do capitalismo moderno. Qual o resultado do quarter? Esquecemos das relações. Aqui eu tento represar esse tipo de pensamento.
Craft e Essência
Não me lembro de uma fusão que tenha dado certo na propaganda brasileira. A nossa vem dando certo porque foi feita entre duas agências totalmente diferentes, mas com valores muito próximos. O craft por exemplo, presente numa agência fundada por um diretor de cinema, que era o Dodi Taterka. Não tem um filme da Taterka que não seja primoroso. Você olha para a DPZ, a mesma coisa. Teve estúdio fotográfico dentro, entendia de filmes como ninguém. É óbvio que craft é uma essência daquilo que fazemos. Craft não significa fazer um filme de 1 milhão de dólares. É como fazer, o olhar, a atenção que você dá. É acreditar que tudo o que uma marca expressa ajuda a construir o posicionamento.
Letras e formigas
Nas nossas apresentações temos uma ilustração em que as letras da nossa logomarca são formadas por formiguinhas. Sempre digo para prospects e para o meu time que viemos e fomos ícones de uma era em que as letras na porta das agências queriam dizer tudo. Hoje estamos numa era em que o que vale é o time, é o exército de formiguinhas. O que fazemos é como deixar um bolo em cima de uma mesa: no dia seguinte está coberto de formiguinhas. Quando você entra no cliente e tem projeto de tecnologia, pensa no RH, faz campanha de recrutamento, leva um filme incrível para botar na TV.
Legado e ambição
Desde o primeiro dia da fusão, na primeira conversa que tive com o time das duas agências, comecei a trabalhar em um sonho com eles: queremos ser a melhor agência do Brasil. Qualquer pretensão menor que essa vai dar o mesmo trabalho. E não faz jus ao que estamos recebendo de legado. Meu papel é fazer a ambição pessoal de cada um estar alinhada com a ambição da agência. E preciso que meu exército de formiguinhas acredite que é o melhor do Brasil. Fazer todos andarem na mesma direção, em um mercado em transformação, com uma grande barreira cultural. Isso dá um trabalho enorme.
Diversidade e ideias
O pensamento de diversidade é fundamental para as agências. E diversidade não passa somente pela questão de homem, mulher, homo ou heterossexual. Passa por trazer para trabalhar por uma marca alguém que não trabalha em propaganda, um artista de rua, alguém que pensa de outro jeito. Eu vendo pessoas, ideias.
2018 e Brasil
É um ano desafiador para todos porque atingimos aquele lugar terrível chamado “fundo do poço”. Se você olhar para a eleição com cuidado e tirar fora paixões e estilos, há um esqueleto central de propostas bem parecidas. Extrema esquerda e a extrema direita estão falando em reforma tributária, em tributar heranças e dividendos e não só produto, você começa a ver um grau de maturidade em que todos estão entendendo o que precisa ser feito. Tirando o episódio terrível da greve dos caminhoneiros, que deu uma chacoalhada no mercado, a vida está continuando, as empresas têm de entregar resultados. Tem gente que está percebendo que como tudo é cíclico no Brasil, agora é hora de capturar mercado. Estou vendo alguns anunciantes se comportando como investidores, que apostam no mercado no momento em que ele não está em alta. Tem gente fazendo construção de marca muito bem, tem gente sendo agressiva no varejo, os ativos no Brasil estão muito baratos, você começa a ver entrada de capital para fazer negócio.
Novo governo
Devemos entrar num ciclo bastante positivo a partir da entrada do novo governo, qualquer que seja ele, concordemos ou não com a ideologia. A minha crença é tanta que há um ano abri uma agência no Rio de Janeiro, botei 40 pessoas e não recuei um milímetro até aqui, apesar de o mercado de lá ter piorado. Sou pai de menina e acho que estamos em um momento de retrocesso em algumas coisas em que evoluímos, mas o eixo central da conversa, que é de recuperação do Brasil, tem eco no discurso dos candidatos.
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