Segundo o Ibope Repucom, o volume de novos inscritos nas redes sociais dos clubes no primeiro semestre de 2022 foi 31% maior que no primeiro semestre de 2021
Em 1976, a CBF decidiu que o Dia do Futebol seria celebrado no dia 19 de julho. A data remete ao dia em que o time brasileiro mais antigo foi criado, o Sport Clube Rio Grande.
Muita coisa mudou nestes 46 anos desde a criação da data. Muitos times foram criados, muitas regras foram mudadas, campeonatos nasceram, o VAR foi implementado... Mas, talvez, a maior mudança destes quase meio século seja a forma como o torcedor se informa sobre o seu time do coração.
Se antes as pessoas ficavam sabendo de contratações, datas de jogos e eleições de diretoria nas rádios e nos jornais, hoje quem comanda são as redes sociais. Cada vez mais os clubes brasileiros tem investido e visto as redes sociais como uma forma de se aproximar e se comunicar com os torcedores.
Amir Somoggi, especialista em marketing esportivo e sócio-diretor da Sports Value, explicou que as redes sociais sempre foram importantes para os clubes, tanto nacionais quanto internacionais, mas que pandemia do coronavírus fez com que o uso se intensificasse.
"Até a pandemia era uma realidade e depois dela, outra. Houve um desenvolvimento muito grande do Instagram, por exemplo, e hoje ele é a principal rede social dos clubes brasileiros e, em alguns casos, representa até 70% das interações", explicou o especialista.
Além do Instagram, Somoggi também destacou o YouTube como uma das principais redes socias usadas pelos clubes.
"O Youtube está consolidado como a rede fora das tradicionais porque a produção de conteúdo dos clubes acaba impactando o torcedor de baixa renda, que não tem acesso a uma TV por assinatura, streaming etc e isso acaba sendo importante", apontou o sócio-diretor da Sports Value.
A última edição do Ibope Repucom, publicado em julho de 2022, destacou o desempenho do primeiro semestre de 2022 em volume de novos inscritos nas redes oficiais dos 50 clubes brasileiros de futebol, o maior de toda a série histórica desde 2017.
Segundo o levantamento, o volume de novos inscritos nas plataformas oficiais dos clubes no primeiro semestre de 2022 foi 31% maior que no primeiro semestre de 2021, o que mostra um possível reflexo da retomada do calendário regular de competições. De janeiro a junho deste ano foram registrados 15,6 milhões de novas inscrições nos perfis oficiais dos clubes.
Do campo para a conta bancária
Além das informações sobre jogos e contratações, as redes sociais tem se mostrado grandes aliadas na conversão de torcedores em sócios do clube, que segundo o estudo "Finanças TOP 20 clubes brasileiros 2021" da Sport Value, são a quarta fonte de renda dos clubes. O Palmeiras, por exemplo, registrou mais de 70% de aumento na base de sócios torcedores nos primeiros seis meses de 2022 e, atualmente, soma mais de 77 mil sócios-avanti.
Assim como o Palmeiras, o Santos criou uma conta apenas para os sócios torcedores do clube que, neste caso, se chama Sócio Rei, em homenagem ao Pelé.
"É através da rede social que os associados ficam por dentro de todas as novidades do clube, como promoções, concursos, experiências e qualquer outra ação que seja destinada ao Sócio Rei. A rede social é tão importante para fidelizar sócios antigos e conquistar novos associados, que o próprio Sócio Rei tem uma página oficial dedicada exclusivamente para esses conteúdos", explicou Ricardo Cardoso, coordenador de redes sociais do Santos FC.
O programa de Sócio Torcedor do São Paulo FC também conta com canais e perfis próprios nas redes.
"[Essas contas] falam diretamente com o torcedor que já faz parte do programa e busca aumentar a base de torcedores que escolham aderir ao ST. Estes canais são fundamentais para o crescimento da base de fãs", afirmou José Eduardo Martins, diretor executivo de Comunicação do São Paulo.
Além dos sócios, as redes sociais também possibilitaram aos clube uma outra forma de ganhar dinheiro: o mercado publicitário, uma vez que, cada vez mais, as marcas buscam as redes sociais para alcançarem outros públicos.
"O torcedor é um público desejado por marcas de diversos segmentos e quanto mais protagonistas nós somos nas redes sociais, mais nós entramos no radar do mercado publicitário. Passamos a ter um crescimento de receitas seja na área comercial, licenciamento, sócios e no próprio digital", afirmou Guilherme Neto Coordenador de Marketing do Vasco da Gama.
Para que o trabalho atinja cada vez um público maior, os clubes passaram a investir em equipes para a produção destes conteúdos.
No caso do Palmeiras, o clube afirmou que o trabalho de mídias é realizado de forma conjunta pelo Departamento de Comunicação do Palmeiras, que reúne assessores, redatores, historiadores, fotógrafos, videomakers, designers e profissionais de social media que são responsáveis por acompanhar as tendências e traçar as estratégias de postagens com base em dados específicos de cada um dos canais oficiais. Além disso, o clube afirmou que, atualmente, conta com parceiros comerciais voltados a conteúdos digitais.
No time tricolor paulista, o departamento de Comunicação, junto com o Marketing, é o responsável pela produção e curadoria dos conteúdos das redes.
A mesma coisa acontece no time carioca. O processo de gestão de mídias sociais do clube passa pelo planejamento, produção e distribuição de conteúdo.
No Santos, também existe uma equipe destinada exclusivamente para gerir esses tipos de conteúdo, que interage diretamente com os setores de Marketing e Comunicação do clube, mas com uma divisão de foco para cada tema, como futebol profissional, categoria de base, futebol feminino, parceiros e patrocinadores, e também por rede social.
O coordenador das mídias sociais da equipe santista também ressaltou que as redes sociais do clube já trouxe vantagens financeiras para o clube.
"Além de conteúdos próprios monetizados, o Santos também possui parcerias com plataformas e conteúdos pagos por patrocinadores e parceiros. Em toda negociação envolvendo marcas, a rede social é acrescentada como parte do negócio. É comum ver inúmeras publicações de marcas parceiras em nossas redes sociais. Isso significa visibilidade para a empresa e significa lucro para o clube", afirmou Ricardo.
O torcedor como parte da equipe
Além da questão financeira, as redes sociais permitiram que os torcedores pudessem acompanhar de perto as ações dos clubes, como treinos e vídeos de bastidores, transformando a relação torcedor versus clube em uma rua de duas mãos: da mesma forma em que o torcedor "ganha" acesso a outros conteúdos, o clube tem a opção de se comunicar diretamente com o torcedor.
"O Palmeiras tem 20 milhões de torcedores espalhados por diferentes cidades do Brasil e do mundo e muitos deles se relacionam com o clube por meio das redes sociais", apontou a equipe do Verdão paulista.
Segundo Cardoso, além da aproximação com o torcedor, as redes aumentam a relevância do clube. "Um clube sem presença virtual forte é um clube com menos relevância. E relevância sempre foi e sempre será algo importante para o crescimento da instituição em todos os segmentos", apontou o coordenador do Peixe.
"A aproximação do torcedor é algo muito fácil de sentir, ainda mais pra quem viveu o período pré-redes sociais. Se antigamente o torcedor só se sentia ‘parte do clube’ quando estava no estádio apoiando, hoje ele se sente dentro da equipe, vivendo e interagindo com cada conteúdo, seja pra apoiar, elogiar ou criticar. E assim o torcedor, até mesmo aquele que mora a milhares de quilômetros, se sente, com total razão, parte crucial do dia a dia de seu clube", completou Cardoso.
O ponto de aproximar torcedores também foi destacado pela equipe de mídias sociais do Vasco. "As redes sociais acabam encurtando as distâncias entre o torcedor e o clube, ainda mais se tratando do Vasco que é um clube onde a maior parte da sua torcida está fora do Rio de Janeiro", apontou Neto.
A linguagem das redes
Junto com as redes sociais, vieram os memes, piadas e trends que viralizam com uma certa frequência e, como é de se imaginar, os clubes também se apropriaram dessa nova linguagem para se comunicar através de suas contas.
De acordo com a equipe de mídias do Palmeiras, o clube entendeu que as redes sociais têm linguagens próprias e que ele precisa se adequar a elas, a fim de impactar positivamente os seus seguidores. "O clube tem investido cada vez mais na criação de artes, brincadeiras e memes que valorizem os seus personagens e alavanquem o engajamento da torcida", apontou a equipe.
A equipe vascaína também aposta nos memes e em conteúdos mais leves em suas redes. "Entendemos que as redes sociais são feitas por pessoas para pessoas. Temos o objetivo de participar e fazer parte da nossa comunidade digital de torcedores", apontou a equipe.
O diretor executivo de Comunicação do São Paulo explicou que o clube tentar buscar o equilíbrio entre informar e ter momentos para um engajamento mais informal nas redes.
"Estamos lidando com o torcedor, e o 'estagiário' das redes sociais é, também, por definição, um torcedor tricolor. A busca é por esse equilíbrio, entendendo o momento do time, do torcedor, e do próprio ambiente do futebol. Há momentos para maior descontração, mas há momentos que as redes, como canais oficiais do clube, devem falar institucionalmente de assuntos sérios", afirmou Martins.
O coordenador da redes do Santos explicou que, apesar de trabalharem com liberdade criativa e por o time ser tradicionalmente conhecido por seu bom humor e ousadia, a equipe toma os devidos cuidados para que essa linguagem não resulte em algo negativo para a equipe.
"Nossa missão é brincar para alegrar a nossa torcida, mas nunca desrespeitando outras instituições e seres humanos. A ‘zoeira’ existe no futebol e as piadinhas entre clubes são tradicionais e sagradas, mas existe a brincadeira que é positiva para que essa tradição siga existindo da melhor forma possível e a brincadeira que ultrapassa limites e estraga essa atmosfera. Não existe um manual que venha com esses limites, então a necessidade do bom senso dos criadores de conteúdo é primordial nesses momentos", afirmou Ricardo.
Ele, inclusive, ressaltou que em tempos passados essas postagens de humor já geraram desconforto com a diretoria do time.
"A rede social ainda é algo muito recente e esse tipo de abordagem mais descontraída já foi muito evitada em seu início, por uma visão mais conservadora de antigas gestões. Estou à frente das redes sociais do Santos desde 2015 e já tive muito conteúdo negado justamente por esses motivos. Com o tempo, a rede social foi evoluindo de importância internamente e, na base de muita conversa e planejamento, os conteúdos descontraídos começaram a ser algo tradicional no clube", contou o coordenador.
Pelo mesmo motivo, o coordenador de marketing do time carioca afirmou que as postagens das suas redes seguem uma linha tênue onde a subjetividade pode aparecer, mas não tem casos relevantes de desentendimentos e desconfortos internos. "Entendemos nosso papel e buscamos deixar claro quais são as nossas intenções. Se houver algum conteúdo que possa ser sensível, sempre buscamos o alinhamento interno antes de publicar", apontou a equipe.
No caso do time alviverde, a equipe de mídias afirmou que as postagens nunca geraram desconfortos e que os próprios atletas do clube "se divertem com o bom humor das redes sociais do Palmeiras". O diretor executivo do tricolor paulista também afirmou que o tom das redes nunca geraram desconforto com a diretoria.
Streaming, NFTs, metaverso...
A internet tem evoluído rápido e, atualmente, o metaverso se tornou uma realidade não só para marcas e para a publicidade, mas também para os clubes brasileiros.
O PROPMARK questionou aos times quais eram os próximos passos deles no digital e, enquanto o Palmeiras afirmou que este assunto era "estratégico, portanto interno", as equipes do Santos, Vasco e São Paulo apontaram quais direções estão seguindo no mundo dos código binários.
O coordenador santista apontou, atualmente, o foco do clube é aumentar a sua relevância nas redes, aproveitar os detalhes das plataformas e estar atento às novidades, seja de ferramentas ou de novas mídias e que, por isso, "é impossível negar que há a possibilidade do Santos estar presente no Metaverso no futuro".
Enquanto isso, o Vasco já deu alguns passos em direção a estas novas tecnologias da Web 3.0, com o lançamento de NFTs colecionáveis, fan tokens e jogos apoiados em blockchain.
O diretor executivo da comunicação do SPFC afirmou que, em breve, o time deve lançar o seu próprio canal de streaming com uma programação dedicada aos torcedores.