A crise institucional que atingiu a Volkswagen nos Estados Unidos e na Europa não teve efeito na operação brasileira da montadora alemã, apesar de o imbróglio estar no foco. O slogan Das auto foi substituído por Volkswagen. Ideia é manter conexão com as pessoas. Um dos instrumentos é a assinatura Inspirada na sua vida, presente no lançamento do Novo Gol. “As pessoas vêm em primeiro lugar”, diz Leandro Ramiro, gerente-executivo de marketing e comunicação da marca. Vejam a entrevista dele ao PROPMARK.

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O senhor está há 15 meses na Volkswagen. Como é a experiência de chegar à empresa em um momento que o mercado automobilístico passa por transformações significativas?

Tivemos uma grande mudança no planejamento de comunicação, especialmente na forma. Tudo passou a ser muito mais dinâmico, ou seja, proativo e reativo. Quando passamos por mercados mais desafiadores, como o brasileiro, a tendência é que se prevaleça o tático e o pontual. Porém, buscamos uma comunicação estratégica, de construção de imagem de marca a médio e longo prazos. Sempre lembrando que a jornada de compra do consumidor é composta por diferentes fases e não podemos nos ater apenas a uma ou outra. A comunicação tem de estar a serviço da experiência inteira. Essa mudança se tornou pública a partir de alguns movimentos que fizemos em 2015, como a campanha Volkswagen #vale, que abre caminho para uma proposta de valor que materializa tudo que a marca tem de entregar para o consumidor e não apenas uma promoção, por exemplo. A marca Volkswagen tem pontos de diferenciação que podem ser elementos de desempate na decisão de compra.

Qual é a orientação mercadológica da montadora?

As pessoas vêm em primeiro lugar, afinal Volkswagen significa carro do povo; o carro das pessoas. E isso ficou nítido na maneira como trabalhamos a campanha do Gol (Novo Gol. Forte como todo Gol. Conectado como nenhum outro). O plano não era mostrar um sistema inédito de web conect simplesmente pela tecnologia, mas para que tornasse a vida dos usuários mais prática, mais ágil e mais segura. A comunicação sempre vai destacar features, mas eles devem ser adequados à jornada de compra.

Como o cenário econômico brasileiro está interferindo nos processos?

Temos de entendê-lo para podermos ativar reações. Há queda de vendas, sem dúvida. Nesse tipo de ambiente é importante ressaltar os diferenciais da marca porque a escolha está mais seletiva. O consumidor não pode errar e nem arriscar. A comunicação ganha relevância porque ela tem a oportunidade de mostrar que a opção pelo modelo A ou B é mais importante por motivos bem embasados. A campanha Volkswagen #vale tinha o propósito de ajudar os consumidores na decisão de compra sem foco na oferta de preço, taxa zero ou desconto específico. O foco era o valor: por trás disso tem um produto com diferenciais como segurança, economia, valor de revenda etc.

No comercial Tia Lu, do Gol, há uma nova assinatura?

Passamos a usar Inspirada na sua vida, que faz mais sentido para uma marca que quer estar próxima das pessoas. É uma orientação estratégica que se tornou pública nessa ação. O infotainment precisa fazer a diferença na vida dos usuários, assim como um novo interior.

O slogan Das auto foi suprimido?

Sim. Desde janeiro deste ano passamos a assinar Volkswagen. No Brasil já estávamos buscando uma reorientação para as pessoas. Das auto significa o automóvel. Volkswagem, simplesmente, tem mais sinergia com essa conversa mais próxima às pessoas.

No que uma marca não pode ficar desatenta?

Na entrega real de serviços e produtos para os consumidores. Eles precisam, efetivamente, ser um diferencial competitivo.

A crise é uma alegação relevante para desacelerar ações de mídia?

Nem pensar. Permanecer em evidência pelos motivos orgânicos e publicitários é extremamente necessário. Obviamente cada vez mais, com a perspectiva da assertividade. Estar na mídia em momentos mais desafiadores é muito importante, porém de forma inteligente, devido às reduções naturais dos orçamentos. Temos de conseguir fazer o balanceamento correto da mensagem da marca, para que ela mantenha o frescor com o seu público, mas com os recados mais específicos para quem está no momento de decisão de compra.

Houve redução de orçamentos?

Neste ano, temos trabalhado para tornar ainda mais eficientes os nossos investimentos em comunicação, diversificando as nossas ações em diversas plataformas que envolvem as mídias tradicionais, mas também outros meios, como os digitais e de relacionamento com o cliente. Contudo, nós não abrimos valores dos nossos investimentos e, por isso, não informamos se houve alguma mudança em seu volume.

O brasileiro está deixando de ter uma visão patrimonialista em relação ao automóvel?

Em relação ao consumo, as gerações mais antigas agiam bem diferente do que ocorre hoje. O novo consumidor exige muita atenção de todos os fabricantes de bens e não exclusivamente da indústria automotiva. Mas, ao mesmo tempo, um produto com valor agregado maior, como um carro, é um patrimônio, sim, especialmente para algumas classes socioeconômicas. Os valores da revenda, do seguro, das taxas e da manutenção são importantes para o cliente, porque ele vai ter de conviver com esses gastos no seu orçamento por algum tempo.

Mas há uma nítida renovação da frota?

Os brasileiros estão comprando com um prazo menor.

Com quais disciplinas de comunicação, a Volkswagen tem priorizado seus projetos de comunicação?

Todas são essenciais e precisam ser mantidas. Há alguns movimentos possíveis, um deles é o investimento necessário para que a marca continue comunicando seus diferenciais e mantendo o posicionamento correto na mente dos consumidores. Com alternativas cada vez maiores de mídia, o desafio é manter a construção de uma mensagem coesa e integrada, mesmo que para fins diferentes como uma campanha de marketing, de lançamento de produto ou de varejo. O que não se deve fazer é desmembrar. A ação que lança o Novo Gol é a mesma que vai fazer a promoção em algum momento da estratégia. Portanto, é preciso que a mensagem tenha coerência e consistência. Principalmente porque, para um consumidor mais atento, a comunicação não vai se sustentar. E ter uma compreensão clara para os investimentos que estão amparados por questões táticas pontuais. Eles devem ser respaldados por diferenciais que também são de construção de marca. A campanha Volkswagen #vale foi uma feliz solução de uma equação complicada. No final das contas, ela é a tradução de uma oferta da marca e de uma proposta de valor.

A Volkswagen realmente vale?

Sim, ela pode e entrega o que diz. A decisão do consumidor leva em conta motivações consistentes, não apenas uma ação promocional.

A lei da oferta e da procura é implacável e o valor de revenda de modelos usados caiu consideravelmente. Como a empresa reage a esse cenário?

O modo contínuo de manter um carro é extremamente importante, mesmo com as mudanças consolidadas de preço. Os consumidores mais racionais levam muito em consideração o valor da revenda.

Nos anos 1950, a Volkswagen revolucionou a publicidade do segmento com a campanha Think small, que se transformou em benchmark para a indústria. A criatividade é elemento de conexão com os consumidores?

É essencial para uma marca ou uma campanha. O ponto é a necessidade da criatividade para o impacto positivo e a conquista da entrega da mensagem de uma forma diferente. O que quero dizer é que a criatividade não deve ser usada para ganhar prêmios, mas para gerar impactos. Quando se consegue o pacote completo é muito bom. O importante é ter uma isca mais poderosa em cada momento do consumidor, seja em um filme, promoção ou no ponto de venda. As pessoas são impactadas diariamente por um número enorme de campanhas publicitárias. A entrega criativa, como na campanha do Novo Gol, é diferencial competitivo para chamar a atenção para a verdade da marca. A criatividade não está apenas na ideia, mas no grau de aderência que tem com a marca. A criatividade é achar um ponto que só aquela marca pode entregar.

A campanha Despedida da Kombi é um marco?

Eu não estava na Volkswagen na época, mas fui impactado como consumidor.

Ela pode voltar?

Isso é com o pessoal de produto. No Salão do Automóvel de Genebra, a empresa apresentou um carro nessa linha, mas não com foco em trabalho e sim no transporte de pessoas. A Kombi é um ícone.

A Volkswagen está oferecendo mais importados?

Temos um portfólio amplo. Há os carros de entrada, como o Up!, Gol e Fox, até os importados, como Passat, Tiguan, Passat Variant e Touareg. A Volkswagen está se tornando mais premium. O Up! TSI é um carro que faz parte dessa nova realidade da empresa. Os produtos de entrada estão com tantos elementos sofisticados que terminam influenciando a percepção que a marca tem. Quem entra no Novo Gol não se sente em um carro dessa categoria. Quem falaria nos testes cegos que estava usando um Novo Gol com tantos diferenciais tecnológicos à disposição?

Os problemas institucionais da Volkswagen nos Estados Unidos e na Europa tiveram interferência no Brasil?

Foi um assunto bastante forte e fizemos estudos no país, mas ficou restrito aos países envolvidos. Porém, está no nosso radar o tempo todo. A saída do slogan Das auto é uma das atitudes da empresa para o reposicionamento da marca. Temos autonomia local mesmo estando subordinados ao planejamento global. De outra forma, as estratégias ficariam muito enlatadas. O balanço precisa ser inteligente. A unidade brasileira, que ocupa a terceira posição no ranking da empresa, exerce influência na rede. Para se ter uma ideia, a campanha Desejos, do Novo Golf, é veiculada em outros mercados. O Brasil é um hub rico para o headquater e outras unidades.

Há divisão entre on e off?

Não temos esse muro, embora saibamos muito bem que há diferença entre o discurso e a prática. A integração de mídias é complexa. O desafio é o diálogo da marca com o consumidor. Isso não significa que não tenhamos ações exclusivas para o digital ou para canais impressos. A campanha do Novo Gol começou 100% digital na fase teaser e de pré-lançamento. Um mês depois, alcançou os demais canais.

Quais agências a marca trabalha no Brasil?

A AlmapBBDO e a The Group.