Em tramitação desde o ano passado, o Projeto de Lei n° 29 de 2007 finalmente está marcado para ser votado no próximo dia 23, na Comissão de Ciência e Tecnologia da Câmara dos Deputados. Fontes próximas ao projeto garantem que há grande chance de aprovação ainda este mês, à revelia da ABTA (Associação Brasileira de TV por Assinatura) que desde 2007 promove campanha contra o projeto.
O PL 29, que libera as operadoras de telefonia para oferecer serviços de TV por assinatura, vem gerando uma série de polêmicas no mercado de comunicações, principalmente por que toca em temas sensíveis como o estabelecimento de cotas para produção independente nacional na grade de programação de TV fechada. Além disso, também amplia as competências da Ancine (Agência Nacional de Cinema) na regulação das atividades de programação das TVs fechadas (leia mais aqui)
Segundo o substitutivo que será apresentado pelo deputado Jorge Bittar (PT-RJ), na Comissão de Ciência e Tecnologia, na próxima quarta-feira (9), 10% da programação de canais internacionais de conteúdo eminentemente “qualificado” terá que ser preenchida com produções independentes nacionais. No texto, entende-se como conteúdo “qualificado” a programação que não tem predominância de telejornais, televendas, jogos de futebol, programas religiosos e políticos – dentre os exemplos de canais estão HBO e FOX.
Além disso, o projeto interfere nos pacotes de canais das operadoras vendidos ao consumidor. Segundo o PL 29, pelo menos 25% dos canais de um pacote deverão ser dos chamados “Canais BR”. A categoria é assim definida por canais que possuem 40% do seu conteúdo nacional e a metade deste necessariamente produzido por independentes.
Na prática, a definição funciona assim: em um pacote de 40 canais, por exemplo, dez terão que ser BR, com o detalhe de que esses não poderão ser de um só operador. Adendo também vale para os produtores independentes. Uma produtora não poderá oferecer produtos para preencher a cota de um canal. “São medidas pensadas para impedir a concentração e garantir a pluralidade”, justifica Bittar.
O projeto ainda será discutido em uma Comissão Geral da Câmara – uma espécie de audiência pública – que não chegará a impedir o andamento do projeto, segundo Bittar. Caso passe, a PL 29 segue para a Comissão de Constituição e Justiça, e depois para o Senado, antes de virar lei.
Polêmica
Mas a ABTA promete se opor veementemente ao projeto até as últimas instâncias. As medidas, que são de proteção ao audiovisual, acabam por interferir no modelo de negócio das operadoras de TV por assinatura. Essa é a razão que mais incomoda o presidente da ABTA, Alexandre Annemberg. O executivo explica que a exigência dos 25% de “Canais BR” no pacote das operadoras irá encarecer o produto para o assinante ou, no mínimo, forçar as empresas a reduzirem o seu cardápio de canais internacionais. “O problema é que não sabemos que o consumidor está disposto a pagar pelos canais brasileiros e nem sequer se eles preferem esses em detrimento a opções internacionais”, explica Annemberg, acrescentando: “O que estão fazendo na prática é nos forçando a impingir um conteúdo ao cliente, sem a certeza de que ele quer isso”.
Mas o vice-presidente da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de TV (ABPITV), Leonardo Dourado, contra-argumenta, dizendo que sempre foi um mito o fato do consumidor brasileiro rejeitar o conteúdo nacional. “A Globo se constitui como um sucesso justamente por mostrar o Brasil na tela”, disse.
Outro ponto que a ABPITV levanta é o fato de que em todos os países onde existe hoje uma indústria audiovisual desenvolvida adotaram-se no começo medidas protecionistas.
“O que nós estamos reivindicando é uma pequena parcela de um mercado bilionário, no qual o Brasil tem participação ínfima”, afirma Dourado, ressaltando que o audiovisual no mundo movimenta US$ 450 bilhões e o Brasil não tem nem 1% disso.
Pela falta de abertura no mercado nacional, produtores partiram para o exterior através de projetos de exportação. Muitos profissionais são reconhecidos fora do Brasil com produções na grade de emissoras estrangeiras. “A produção audiovisual já provou sua qualidade, mas falta entrarmos no mercado nacional”, afirma Dourado, que teve seu documentário “Carrapateira” selecionado em festivais internacionais. Em quatro anos de projetos de exportação foram gerados US$ 40 milhões – sendo 85% de co-produções e 15% de venda de conteúdo. Por conta de todas as discussões geradas em torno do PL 29, existem regras que poderão ser introduzidas a partir das observações de opositores. Uma delas é que as TVs ganhem tempo de adaptação para adoção de cotas. No primeiro ano, a cota de produtos nacionais seria de 2,5%, progredindo nessa taxa até chegar aos 10% depois em quatro anos.
Ruy Barata Neto