A economia brasileira criou um cenário especialmente desafiador para as empresas anunciantes em 2017. Embora haja sinais de reação no ar, como a expectativa de que o PIB tenha um crescimento previsto para 0,5% neste ano, podendo até ultrapassar 1%, segundo projeção mais recente do Ministério do Planejamento, o desemprego, que atinge 13 milhões de brasileiros – de acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) relativos ao trimestre mais recente encerrado em setembro -, ainda segura o consumo das famílias.
Mas se enganou quem preferiu deixar suas estratégias de comunicação para 2018. Os testemunhos de executivos de algumas das principais empresas brasileiras mostram que foi um ano para se mexer e reforçar posicionamentos e propósitos de marca que, se não necessariamente se refletiram em vendas imediatas, vão trazer grandes resultados quando a economia voltar aos trilhos.
“A soma de um cenário de instabilidade na política e na economia com um ambiente de constantes e profundas mudanças, em grande parte, promovidas pelas novidades tecnológicas, fez de 2017 um ano de muitos desafios. Contudo, os anunciantes demonstraram coragem e, mesmo em meio a um mar revolto, saíram para navegar e explorar as possibilidades, efetuando investimentos”, relembra Sandra Martinelli, presidente executiva da ABA (Associação Brasileira de Anunciantes). “Ao longo de 2017, tivemos diversas concorrências para contas de marcas nacionais e multinacionais. O cenário econômico adverso ou instável exige cautela e mais trabalho. Porém, os gestores de marketing responderam à altura e, de fato, todos estão atuando de forma muito ativa para buscar os melhores caminhos para suas marcas e negócios”.
Neste cenário de crise, a entidade concentrou os debates do ano na construção de confiança e na gestão de marcas em um mundo ultraconectado, com foco na segurança para investimentos no digital. “Por conta disso, o marketing precisou buscar muita consistência em suas ações, considerando todos os aspectos do negócio e o ROI. Esse movimento leva em conta, cada vez mais, as expectativas da sociedade e elevou a importância do compliance a um novo patamar”, analisa.
Pior já passou
A necessidade de manter investimentos publicitários para garantir a consistência na comunicação veio acompanhada de iniciativas estratégicas de renovação de produtos. O setor automobilístico, um dos mais interessantes para se compreender a dinâmica da economia, foi um exemplo da importância dessas estratégias.
“Temos a sensação de que o pior já passou. Os investimentos em renovação do portfólio no passado foram importantes para manter a competitividade durante a crise, embora não pudéssemos ter usufruído por causa da queda da indústria”, relembra Hermann Mahnke, diretor de marketing da General Motors. “Foi um ano muito difícil. Somos o primeiro setor a entrar na crise e último a sair. Sofremos muito com a queda da indústria como um todo, que, na comparação com 2013, foi acima de 40%. O cenário político e econômico derrubou substancialmente a confiança do brasileiro. Mas, passado o pior momento, já enxergamos um crescimento em nossa indústria em 2017, especialmente a partir do segundo semestre”.
Quem também renovou seus produtos foi a Whirlpool, no setor de eletrodomésticos. Em agosto, a empresa apresentou a nova geração de Brastemp, por exemplo. “Foi a maior mudança de portfólio da história, contribuindo para impulsionar o nosso negócio. O impacto do marketing foi fundamental para a divulgação dos produtos”, afirma Paulo Miri, presidente de home appliances da Whirlpool na América Latina.
A Brastemp lançou campanhas como Homenagem, que reuniu referências ao legado da publicidade da empresa, enquanto Consul assinou a ação Bem pensado, além de uma promoção nova no ambiente digital e reforço nas redes sociais, sempre com o objetivo de fortalecer a marca.
“Um dos principais desafios foi redefinir nosso olhar para produto com foco maior em experiência do consumidor”, relembra Miri. Uma das iniciativas nesse sentido foi a Brastemp Experience, espaço conceito que teve mais de 75 eventos no ano.
Beleza
Para a Avon, no segmento de cosméticos, também foi ano de reforçar o posicionamento de marca, no caso, Beleza que faz sentido, e renovar o portfólio, especialmente em fragrâncias e maquiagens. “É claro que uma turbulência grande como a que o país passou não desaparece de uma hora para outra. Ainda estamos buscando tração para crescer. Mas todos os anos difíceis abrem oportunidades para a construção de identidade. É o momento em que as marcas reafirmam sua relação com os consumidores”, analisa Marise Barroso, vice-presidente de marketing da empresa.
Segundo ela, o awareness da marca aumentou, bem como a intenção de compra, de acordo com as pesquisas internas. Seria indicativo de que a comunicação está próxima ao consumidor. A área de telecomunicações teve movimentos como os da Vivo, que investiu na inovação de produtos, como o serviço de compartilhamento de internet e o lançamento de novos planos pós-pagos. Na publicidade, reforço do posicionamento Viva Tudo. “Com o conceito Menos do Mesmo, convidamos nossos clientes a saírem de suas bolhas ideológicas e refletirem sobre novas possibilidades abertas pela conexão. Desta maneira, conseguimos tornar a marca mais próxima das pessoas, participando das discussões que têm pautado nossa sociedade, como estereótipos de gênero, idade ou composição familiar”, analisa Marina Daineze, diretora de imagem e comunicação da Vivo.
Outras iniciativas no período foram as ações para os planos família, com filmes como Kung fu, ações para datas especiais como Dia dos Namorados e Dia dos Pais e ativação do patrocínio à seleção brasileira, dentre outras iniciativas.
Alimento
A Barilla nota que o mercado se reencontrou no segundo semestre, mas o que o tornou menos desafiador. A empresa reforçou investimentos no digital para se adaptar a uma população que passou a consumir mais alimentos no lar, por causa da crise.
“Sinto que um desafio para as marcas é reduzir ainda mais os riscos em investimentos que não conversam com os seus consumidores. Quando a verba é menor, a margem de erros também é cada vez menor”, afirma Fabiana Araujo, gerente de marketing da empresa.
Segundo ela, a expectativa da empresa para 2017 não era das melhores, por conta das incertezas econômicas que impactam especialmente marcas de maior valor agregado, mas a conexão da marca com os consumidores ajudou a trazer resultados acima dos esperados.
No e-commerce, a sensação também foi de melhoria gradativa na economia. O Mercado Livre fez investimento de R$ 1 bilhão na operação brasileira, com foco no programa de fidelidade Mercado Pontos. “Reforçamos nossas campanhas focando na geração millennial, mesclando online e offline numa linguagem mais divertida e descontraída”, explica Daniel Aguiar, gerente sênior de marketing do Mercado Livre.
Na Netshoes, também houve foco em comunicação digital. “Em 2017, nós iniciamos uma transição de investimentos em marketing digital, que entendemos ser mais assertivo para a comunicação com o nosso público e a entrega de boas experiências em toda a jornada de compra. Aprimoramos a gestão dos dados. Otimização passou a ser o mantra do marketing para encontrar o equilíbrio no custo de aquisição de clientes com publicidade em mídias online, offline e, principalmente, em canais mobile”, revela Gabriela Platinetty, diretora de marketing da Netshoes.
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