Prestes a completar 10 anos, no dia 4 de fevereiro, o Facebook, a maior rede social do mundo, tem um desafio que contradiz seu gigantismo: provar que não está à beira da morte. Um estudo recente de pesquisadores da Universidade de Princeton (EUA) afirma que, até 2017, o Facebook terá perdido 80% dos seus usuários (leia mais abaixo). Pesquisa da Universidade College London, divulgada no mês passado, decretou que o Facebook está “morto e enterrado” para adolescentes entre 16 e 18 anos. O levantamento, realizado pelo pesquisador Daniel Miller com jovens no Reino Unido, aponta que outros aplicativos, como WhatsApp, Snapchat, Instagram e Twitter estão ganhando a atenção dos adolescentes, que veem o Facebook cada vez mais povoado por adultos, inclusive seus pais.
O tom apocalíptico de cada estudo, no entanto, não condiz com os números atuais da rede social. O Facebook reportou ter atingido 1,19 bilhão de usuários em outubro do ano passado. Se ele fosse um país, seria a terceira nação mais populosa do mundo, atrás da China (1,36 bilhão de habitantes) e Índia (1,23 bi). Dados da companhia apontam que 870 milhões de pessoas acessam a plataforma por dispositivos móveis todos os meses. O valor de mercado da empresa está estimado em US$ 138,2 bilhões, de acordo com a cotação das ações da companhia em 23 de janeiro.
Distante da saturação
Aos 10 anos, o Facebook está longe de cair na obscuridade, afirmam especialistas em digital e redes sociais, mas tem desafios à frente. O principal é manter a relevância para seus usuários e para as empresas que anunciam na plataforma. “Entendemos que o Facebook não está passando por saturação, mas por evolução. Os usuários e as marcas estão compreendendo a dinâmica da rede social”, afirma Walter Motta Jr., diretor de relacionamento com parceiros da Riot, agência de mídia social e uma das empresas brasileiras aptas a criar aplicativos para o Facebook.
Segundo ele, a rede social passou por três momentos: o primeiro, em que marcas lutavam por fãs; o segundo, em que houve o entendimento de que muitos fãs não traziam resultados (quando a atenção recaiu sobre a taxa de engajamento); e o terceiro momento, quando marcas passaram a utilizar o Facebook como plataforma de marketing e ferramenta de geração de negócio. “Acredito que estamos neste terceiro momento”, resume Motta. “Podemos falar de maturidade. As marcas finalmente estão compreendendo como fazer publicidade social e a trabalhar o conteúdo”, diz.
Para Michel Lent, diretor da Pereira & O’Dell Brasil, o mérito do Facebook é o grande número de usuários. Apesar de positivo, isso também traz desafios para o mercado publicitário. “O Facebook é o grande ponto de encontro. Ele facilitou a conversa com pessoas que estavam dispersas por muitos sites. Ao mesmo tempo, essa mesma qualidade nos torna muito dependentes de uma única plataforma. Você fica a favor de um player e não há, ao final, uma estrutura de competição bem estabelecida”, aponta.
Comparado com outras redes sociais, o Facebook de fato mantém a hegemonia na internet: seus competidores diretos, como Twitter (230 milhões de cadastrados) e Instagram (150 milhões), têm bem menos usuários que ele.
Alcance orgânico
Com a alta concentração de usuários e a participação massiva de marcas e agências, o Facebook dita suas próprias regras e as muda, mesmo que isso descontente alguns. A última alteração que gerou reclamações foi no algoritmo que publica ou não uma história no News Feed. Em meados de janeiro, Derek Muller, curador do blog de ciência Veritasium, postou um vídeo no YouTube intitulado “What’s wrong with Facebook” (“O que está errado com o Facebook”, em tradução livre). Nele, Muller acusa a rede social de diminuir a exposição orgânica de sua página, atualmente com 109 mil fãs, de forma a levá-lo a promover seu conteúdo por meio de pagamento. “Se considerarmos que cada pessoa posta quatro posts por dia, uma média de 4,75 bilhões de postagens são compartilhadas todos os dias. Filtragem é necessário, mas o Facebook está usando isso para ganhar dinheiro”, diz ele no vídeo.
No mercado publicitário, a decisão não repercutiu bem. “Entendemos que essa é uma decisão global da empresa. A principal reclamação é quanto à mudança de regra. Uma marca começa uma página, faz aporte em mídia na própria plataforma para trazer fãs acreditando no resultado orgânico e, de uma hora para outra, vemos essa regra mudar. Antes, um post falava com 60 mil pessoas e agora não consegue o mesmo alcance. É incômodo”, diz Lent.
O executivo, contudo, lembra que alterações comerciais estão previstas em qualquer player. “É um direito de eles fazerem as mudanças que lhes são relevantes. Essa é uma ferramenta muito poderosa, é mídia social de massa. Conseguimos falar com milhões de pessoas a um custo interessante”, observa.
Vicente Martin Mastrocola, professor de criação digital da ESPM e autor do livro “Ludificador” (2012), aponta que o Facebook ainda é dominante, mas o surgimento de outros pontos de contato fragmenta a audiência. “Ele acaba perdendo um pouco de público com a chegada de novas plataformas. Há alguns anos, os jovens não tinham outras opções”. Ele acredita que previsões apocalípticas sobre a rede social não representam a realidade. “Isso só indica que serão necessários ajustes. O Facebook cresceu muito e precisa se reinventar de acordo com os desafios que se interpõem a sua frente”.
Estudo de Princeton é criticado
Um estudo de pesquisadores do departamento de engenharia mecânica e aeroespacial da Universidade de Princeton que previu que o Facebook perderá 80% dos usuários até 2017 se tornou viral na semana passada, ganhou ampla repercussão na imprensa até receber uma enxurrada de críticas. Os pesquisadores John Cannarella e Joshua A. Spechler comparam a rápida adoção e abandono das redes sociais à dinâmica que governa a contaminação por doenças contagiosas, da infecção à recuperação.
A pesquisa “Epidemiological modeling of online social network dynamics” (“Modelo epidemiológico da dinâmica de redes sociais online”) foi apresentada num simpósio em Princeton em 2012, mas só foi divulgada na semana passada. Para avaliar as dinâmicas governando a rápida ascensão e queda das redes sociais, eles utilizaram o modelo SIR (Suscetível, Infectado, Recuperado), destinado para mapear o ciclo de início e fim de epidemias, sendo que “suscetível”, no estudo, se refere a usuários potenciais de redes sociais; “infectado”, aos usuários atuais; e “recuperado” identifica a população que se opõe ao uso desse tipo de plataforma.
Os autores aplicaram o modelo SIR primeiro ao MySpace para validá-lo antes de utilizar com o Facebook porque, segundo eles, “esse é um exemplo de rede social que exibiu o ciclo de vida completo, da ascensão à queda”. A fonte de dados para o estudo é o Google Trends, pelo qual analisam as buscas relacionadas às duas plataformas. O levantamento mostra queda na frequência de buscas pelo Facebook a partir de dezembro de 2012. Segundo os autores, isso sugere “que o Facebook já atingiu sua popularidade e entrou na fase de declínio”.
A previsão dos pesquisadores é de que a rede social encolha 20% até dezembro deste ano e que continue perdendo usuários no futuro próximo. “Extrapolando o melhor modelo de ajuste no futuro, está sugerido que o Facebook sofrerá um rápido declínio, perdendo 80% de sua base de usuários entre 2015 e 2017”, concluem. A pesquisa, que ainda não foi publicada em um jornal científico, recebeu diversas críticas. Lance Ulanoff, editor-chefe do Mashable, rebateu o estudo num artigo intitulado “Não, o Facebook não é uma infecção”. “Eu não acredito no modelo empregado. Pessoas que aderem a redes sociais não se sentem infectadas. Nós gostamos dessas redes”, disse.
Em tom de chacota, o matemático Mike Develin, cientista de dados no Facebook, publicou um artigo intitulado “Desmascarando Princeton”, em que utiliza o mesmo modelo dos pesquisadores para provar teorias aleatórias. Ao analisar as buscas sobre Princeton no Google Trends, Develin encontrou declínio desde 2006 e ironizou os resultados que pode tirar a partir dessa base de dados. Seguindo a mesma lógica dos pesquisadores, o matemático conclui que “Princeton terá somente metade dos matriculados até 2018 e, em 2021, não terá estudante algum”.
Develin também satiriza os resultados a partir da pesquisa da palavra “ar”. “Enquanto estamos preocupados com Princeton, estamos ainda mais preocupados com o destino do planeta — [as buscas no] Google Trends para a palavra ‘ar’ também vêm declinando continuamente, e nossas projeções mostram que, por volta de 2016, não haverá ar restante”. O matemático termina o artigo dizendo que sua intenção não era de fato prever o futuro de Princeton ou do ar, mas dar um recado bem-humorado de que “alguns métodos e análises levam a conclusões absurdas”.