Nigel Bogle, um inglês de 61 anos, com quase 40 de publicidade, já viveu vários tempos recessivos e enfrentou diversos ambientes de crise econômica desde que se envolveu com o mundo das marcas e da mídia. Depois de ter fundado a BBH, em 1982, em Londres – com John Hegarty e John Bartle – esta é terceira recessão pela qual afirma “estar passando”. “É também a mais desafiadora”, ele qualifica, loquaz, justificando que o grau de incerteza que paira sobre o mercado publicitário é o maior de todos os tempos e pelo menos cinco vezes maior do que o das recessões anteriores.

Bogle não tem um oráculo. Muito menos uma bola de cristal para saber o que vem por aí. Semana passada, por exemplo, ele chegou a São Paulo, para uma visita à Neogama/BBH (ele faz duas ou três por ano) cheio de eufóricas informações sobre uma certa blindagem da economia brasileira. Mas sua chegada foi exatamente no mesmo dia em que o ministro Guido Mantega aparecia na TV amargurando-se com revisões de planos e discursos de crescimento diante da drástica redução do PIB no último trimestre de 2008, que insere o Brasil no time de países que também sofrem – e muito – com a atual crise econômica mundial que completa seus seis meses de arrastão nesses dias do início do outono tropical.

Bogle de fato não tem como prever as oscilações da crise. Ninguém aparentemente tem. Ele possui porém um mantra que faz questão de recitar incessantemente para amenizar os impactos da recessão: “Certainty in uncertain times”. A frase, que numa tradução livre pode ser entendida como “Certeza em tempos incertos”, foi bolada por ele mesmo, no último mês de dezembro, no auge do desespero de bancos mundo afora e na crise de consumo que intimidou os planos de vendas para o Natal na maior parte do planeta.

À frente de uma agência internacionalmente admirada e fortemente reconhecida por campanhas memoráveis – as de Levi’s são um ótimo exemplo – Nigel Bogle acredita que não há receita melhor nesses tempos de crise do que “instilar” confiança e otimismo tanto no staff quanto nos clientes com os quais a rede trabalha. Há 27 anos no mercado, a BBH tem hoje sete escritórios – Londres, Nova York, São Paulo (Neogama/BBH), Xangai, Tóquio, Cingapura e Mumbai (o mais recente) – e lida com  anunciantes do perfil de Unilever, Audi, British Airways, Heineken, Sprite e TIM. As três últimas são conquistas recentes, já dos tempos de crise. As duas bebidas são contas para Europa, Estados Unidos e Ásia. A de telefonia é conquista local da Neogama.

O mantra de Bogle é sustentado pela importância de mostrar clareza de fatos e situações. “A clareza é o meu principal direcionamento. A falta de confiança gera uma insegurança generalizada e é por isso que em um clima de recessão temos de atuar de maneira muito clara, principalmente com as perspectivas dos negócios”, diz Bogle. Segundo ele, a atual recessão mexeu em pilares fortes – os bancos – que representavam solidez e segurança. “É normal todo mundo ficar inseguro e é por isso que não me canso de repetir o meu mantra”.

Bogle conta que a situação da BBH, em Londres, por exemplo, vem sendo periodicamente relatada aos funcionários para que eles não tenham medo de demissões, o que atrapalha a produtividade e, fundamentalmente, a criatividade. “As pessoas estão mais ansiosas, com medo de ser demitidas. Se você tiver uma situação incerta, todo mundo vai ficar preocupado. Uma força de trabalho ansiosa vai produzir menos, com menos qualidade. Nosso compromisso é criar um equilíbrio para sabermos que temos condições de manter os empregos”. Bogle afirma que desde o início da crise não houve demissões na BBH londrina. Elas também não estão nos planos da agência “neste momento”.

Além da clareza – “você tem de saber onde você está e para onde você vai” –, o mantra da certeza recitado por Bogle é sustentado por incentivos à eficiência e à agilidade. “Temos de ser mais rápidos para novas aprendizagens e para a inovação. Hoje, há mais canais de mídia do que há dez anos, por exemplo, e assim, temos mais ferramentas de comunicação a nosso favor. Há mais oportunidades de mídia para confrontar com a recessão e, nesse contexto, a criatividade é particularmente mais importante agora porque todo mundo está preocupado com orçamentos”.

Em relação aos clientes, Bogle diz que seu mantra é visto de formas diversas, principalmente em relação à realidade de planejamento de cada um deles. “Tenho dito (aos clientes) que não podemos deixar a recessão sobressair”, sintetiza. De maneira geral, ele constata que alguns segmentos no Reino Unido estão bem mais afetados pela recessão. “Os que têm a ver com ficar dentro de casa estão indo bem. Assinaturas da Sky, por exemplo, estão indo bem porque os consumidores estão investindo dinheiro para ficar dentro de casa. O KFC idem porque o consumidor raciocina que não pode ir a um restaurante porém pode comprar comida na rua e levar para casa”. Bogle cita o setor de viagens e o de automóveis entre os que mais sofrem na recessão britânica.

por Marcello Queiroz