O mercado começa a se movimentar diante dos riscos de um efeito cascata nos investimentos em mídia

A ordem foi dada. Todos os países passam a sofrer taxações por parte dos Estados Unidos. Durante o evento chamado de ‘Liberation day’, organizado pelo governo republicano na última semana, em Washington, o presidente declarou taxas de importação sobre todos os produtos estrangeiros em território americano, começando com uma alíquota-base de 10% e possibilidade de aumentos graduais, conforme a origem e o setor envolvido.

Em alguns casos, de maneira mais expressiva, como a China, que agora enfrenta uma tarifa mínima de 34% sobre todas as exportações. Em declaração publicada na rede social Truth Social, o presidente Donald Trump afirmou que pretende adicionar uma taxa de 50% em resposta às tarifas chinesas (34%), caso não haja um recuo até esta terça-feira (8).

Em situações mais brandas, como no caso do Brasil, a tarifa foi de 10% sobre os produtos exportados para os EUA.

As justificativas do presidente são de que as medidas visam proteger as indústrias domésticas e reduzir os déficits comerciais, mas elas têm gerado tensões internacionais.

A implementação dessas tarifas resultou em reações imediatas nos mercados financeiros. Nesta segunda-feira (7), por exemplo, os principais índices de ações dos EUA registraram quedas significativas, o S&P 500, por exemplo, caiu 0,2%.

Antes mesmo da confirmação oficial por parte de Trump, algumas projeções já apontavam queda no crescimento do setor publicitário americano. Com a formalização das novas tarifas, o setor deve sentir os impactos em todo o ecossistema.

Projeções no setor publicitário americano

O mercado publicitário norte-americano já sente os impactos das novas tarifas impostas pelo governo. Segundo dados da Madison & Wall, a expectativa de crescimento do setor para 2025 caiu de 4% para 2,6%. No caso dos anunciantes americanos, uma pesquisa do Interactive Advertising Bureau aponta que 94% estão preocupados com as tarifas, sendo que 45% já planejam reduzir os investimentos em publicidade.

Brasil

Na análise do professor Roberto Kanter, economista e docente da FGV, o Brasil tem respondido com reciprocidade. Segundo ele, o país vem buscando acelerar acordos bilaterais, reforçando seu aprofundamento nas relações comerciais com a China.

"Essa é uma resposta estratégica à tendência de fechamento dos Estados Unidos. Em resumo, fomos pouco penalizados diretamente pelo ‘tarifaço’, mas estamos nos posicionando de maneira ativa diante do novo cenário global.”

Especialistas do setor, como Brenda Silva, gerente de mídia da Dojo, entendem que os impactos no setor publicitário tendem a ser indiretos. Ela conta que o tarifaço de Trump pode se refletir em duas frentes principais: câmbio e comportamento de consumo.

"Com o dólar pressionado, o custo de insumos importados — inclusive tecnologias e plataformas globais usadas na compra de mídia digital — tende a subir. Isso pode afetar orçamentos, especialmente em campanhas com alto investimento em mídia programática internacional ou plataformas que cobram em dólar.”

Jorge Ferreira dos Santos Filho, professor do curso de administração da ESPM, complementa esse pensamento antecipando a visão dos anunciantes. De acordo com ele, ao contrário da relação com a China, que é centrada em commodities, o mix de exportações para os EUA é mais diversificado, com itens como calçados e equipamentos.

"Esse novo custo pressiona margens e pode levar a ajustes nos orçamentos — incluindo o publicitário”. Ele completa: “A publicidade costuma ser uma das primeiras áreas a sofrer cortes quando há crise — o que exigirá ainda mais eficiência nas ações de comunicação”.

Há ainda uma previsão, por parte dos analistas do mercado, de possível valorização do dólar, o que pode comprometer a compra de mídias negociadas na moeda americana, desencadeando uma diminuição dos investimentos em certos canais.

“Além disso, ferramentas globais como DMPs, softwares de automação e plataformas de dados têm custo em dólar. Isso pode abrir espaço para soluções nacionais, com preços em reais. Mesmo que não sejam tão modernas quanto as estrangeiras, podem se mostrar eficazes e economicamente mais viáveis. A pressão econômica, portanto, pode levar a uma revalorização de soluções locais na cadeia de mídia e comunicação”, reforça Kanter.

A tendência, segundo Jorge, é clara: “Até eventos premium, como o Super Bowl, sentiram a pressão — houve mais negociação e busca por redução de custos, o que mostra que até os espaços mais valorizados da publicidade estão sendo repensados. Com isso, há uma migração crescente para as mídias digitais, por serem mais acessíveis e permitirem mensuração clara de resultados. Esse movimento deve se repetir no Brasil. Visualizamos dois caminhos possíveis para o mercado brasileiro: uma pressão orçamentária sobre as mídias tradicionais, com migração para o digital; e a possibilidade de aproveitar brechas abertas na guerra comercial para se reposicionar globalmente — o que pode gerar novas demandas publicitárias adaptadas a mercados regionais ou emergentes”.

Se a ideia for buscar novos mercados como recálculo de rota, Jorge ressalta: “Será necessário adaptar campanhas e estratégias publicitárias a esses novos contextos. Isso inclui não só ajustes de linguagem e abordagem, mas também na escolha das mídias e canais usados.

(Crédito: Foto de Alan Santos / Agência Brasil)