Neste primeiro mês do ano, duas das principais agências brasileiras anunciaram a instituição de um cargo que surge como tendência para um momento em que o setor precisa bucar novas formas de receitas. A crença na indústria é que especialidades enraizadas na estrutura das agências, como mídia, planejamento de marca e criatividade podem ser soluções para novos modelos de atuação e linhas de receitas.

Aos chief growth officers caberá essa missão, que se demonstra fundamental para o futuro do setor. Para isso, o mercado tem recrutado alguns de seus executivos mais experientes, como Wilson Negrini, alçado a Chief Growth & Business Officer (CGBO) pela Lew´Lara\TBWA, e Fabio Freitas, novo CGO da FCB Brasil.

Em um mercado em transformação, as constantes mudanças serão cada vez mais comuns. Por isso, precisamos ser mais flexíveis e adaptáveis. E o papel de um CGO é apoiar o negócio da agência e cliente, oferecendo diferentes serviços e buscando modelos disruptivos, de maneira ágil, com entregas que realmente façam a diferença no negócio dos clientes. O CGO só terá sucesso se for capaz de reunir todas as disciplinas da agência nesse movimento”, diz Negrini, profissional com mais de 20 anos de experiência e histórico nas áreas de atendimento e negócios de grandes agências. Antes do novo cargo, atuava como vice-presidente de atendimento e operações, desde 2017.

Negrini: “O papel de um CGO é apoiar o negócio da agência e cliente”

A razão da agência ter adotado o cargo é, segundo Negrini, porque os modelos de negócios precisam acompanhar as mudanças do mercado. “Cada vez mais as agências terão modelos de negócios totalmente desenhados e adaptados às necessidades de cada cliente. A era do one size fits all já acabou há muito tempo. A Lew’Lara/TBWA entendeu ser estritamente necessário ter um profissional cuidando de perto do negócio e da relação com clientes e ampliando os horizontes dessa atuação”, avalia. 

Ele acredita que a função terá uma função importante para o futuro do mercado de agências, e garantir que a entrega continue relevante e fazendo a diferença nos negócios dos clientes. “Tanto para o presente como para o futuro da agência, é preciso um movimento de constante revisão dos modelos, busca por mais e diferentes ofertas de serviços. O mercado de publicidade como um todo demorou bastante para se adaptar às mudanças e, portanto, ter profissionais capazes de liderar e incentivar movimentos de mudança, abraçando as necessidades de nossas mercado, se faz muito importante”, resume.

Fase inicial

Já Freitas está desde 2016 na FCB Brasil, aonde chegou como vice-presidente de mídia. Seu histórico profissional é nessa área, com liderança do setor em agências do porte de Y&R, F/Nazca S&S e Grey. Diante do novo desafio como chief growth officer, ele se mostra curioso e empolgado. “Dá um frio na barriga de fazer algo novo. Para mim, é muito bom, pois estou focado em mídia desde 1997. É a sensação de que você já domina um brinquedo e que passou por todas as fases. E, agora, tem que voltar para um jogo diferente, na primeira fase”, compara o profissional. “O Fabio tem a tarefa de encontrar novos modelos de crescimento para a FCB. Sempre com um olhar holístico, que envolva todas as áreas da agência e gere novos valores para nosso clientes. Ou seja, ele sempre foi um CGO, só lhe faltava o título”, afirmou Ricardo John, CEO e CCO da agência.

Com o desafio de buscar novas guias de receitas para a agência, diz Freitas, ele quer achar novos caminhos que influenciem não apenas no negócio da agência. É fundamental entender e descobrir formas para anunciantes e veículos também performarem melhor. “É um ecossistema que está machucado, mas há caminhos que trarão mais valor e resultados monetizáveis. É possível unir os lados, criando oportunidades, envelopando coisas junto com esses parceiros”, diz.

Freitas: “há caminhos que trarão mais valor e resultados monetizáveis”

Freitas menciona quatro pilares para buscar o crescimento de linhas de receita para a agência. O primeiro, afirma, é o de cuidar bem do que já está na casa e vislumbrar novas oportunidades. Outro é gerar projetos que precisem de especialidades que a agência possua, como estratégia de mídia, planejamento e criatividade. Uma terceira vertente é descobrir atuações novas, que podem muito bem ser feita por agências, como criar uma startup. “Elas precisam de três coisas: marca, estratégia de comunicação e criatividade, mesmo que para criar uma simples logomarca. Percebo que nossa função se faz necessária, mas muitas vezes somos lembrados apenas para fazer campanhas”, diz Freitas. Uma quarta linha de atuação é de aquisições de empresas que ajudem a FCB a crescer em outros segmentos.

Em escala internacional, um dos principais movimentos recentes de executivos foi a contratação de Laurent Ezekiel pelo WPP junto ao rival Publicis Groupe, para assumir o cargo inédito de chief marketing and growth officer da holding britânica. Na estrutura do maior grupo de comunicação do mundo, ele fica abaixo apenas do CEO Mark Read e da chief client officer Lindsay Pattison, respondendo aos dois.

Chamou atenção de Read o desempenho de Ezekiel em diversas concorrências como GSK e na forma como conquistou novos negócios dentro de clientes como Amex e Samsung. Sua contratação é parte importante do plano trianual de reestruturação do WPP. Em conversa com o AdAge, ele explicou que os clientes vão atrás das agências buscando não apenas marketig ou comunicação, mas uma experiência de consumidor com a marca em todos os pontos de contato, na loja, nas ruas, nas mídias ou no digital. 

Anunciantes

Entre os anunciantes, a realidade do chief growth officer já vem de algum tempo. Em alguns casos, ele foi protagonista de uma transformação na estrutura de lideranças de empresa que, inclusive, encerraram a função de chief marketing officer (CMO). A questão é vista não como una forma de não se ter mais os líderes de marketing na estrutura das companhias, mas de criar mais responsabilidades, sendo o crescimento de novas linhas de receitas uma das principais.

A Coca-Cola é um dos maiores exemplos da tendência desde quando, em 2017, encerrou o cargo de CMO com a saída de Marcos de Quinto. A função foi absorvida pelo chief growth officer Francisco Crespo, também responsável por habilidades como a estratégia corporativa e relação com o varejo. “Construir marcas não é criar performance e capital de marca mais fortes, mas transformar isso em receitas e margem de lucros”, definiu Crespo em entrevista ao AdAge, na ocasião das mudanças. 

O movimento levou diversos anunciantes a fazerem a mesma transformação, como a Johnson&Jonson Consumer, que encerrou o cargo de CMO com a saída de Alison Lewis, no ano passado. No final de dezembro de 2019, a Coca-Cola retomou o cargo de CMO, entregue a Manolo Arroyo. As funções, no entanto, são bem mais amplas do que antes, já que o profissional será ainda presidente da empresa para a região da Ásia Pacífico. A Coca-Cola disse que a mudança visa que o marketing esteja mais integrado com a operação da companhia,  e pensando em criar novas receitas e crescimento.

A função de chief growth officer, definitivamente, não parece ser um modismo no setor de agências. Ela consta na mais recente versão do Guia Salarial Robert Half 2020 como uma das áreas em ascensão no marketing, com salários médios que variam de R$ 13 mil a R$ 33,8 mil, de acordo com o tamanho da companhia e experiência do profissional. Mais que os salários, o estudo mapeou as habilidades que serão mais demandadas na contratação de profissionais até 2022, segundo os líderes das empresas entrevistados. A mais elevante, na opinião de 51%, será a visão de negócios. Pensamento estratégico, liderança e capacidade de adaptação estão logo a seguir. Todas essas habilidades serão necessárias aos chief growth officers na sua missão de moldar o futuro do negócios das agências.