O 64º Festival Internacional de Criatividade Cannes Lions recebeu menos inscrições na comparação com a edição anterior – são 41.170 contra 43.101 entradas do ano passado. Para a edição de 2017, também não foram criados novos Leões, algo que vinha sendo feito com frequência nos últimos anos. No total, o número de competições permanece em 24. Mesmo assim, o novo diretor-geral de Cannes, o brasileiro José Papa, que estará à frente do maior evento da propaganda mundial pela primeira vez ao lado do CEO, Philip Thomas, acredita que este será o maior festival de todos os anos. “Sem viés, acho que este vai ser o maior festival de todos. Cada ano é um ano de reciclagem, de reinício e progresso. E sempre as pessoas saem daqui com uma sensação de renovação”, disse Papa.

Alê Oliveira

Thomas garante que novidades não faltarão em Cannes. “Nós não lançamos nada novo este ano, nenhuma competição ou algo grande como o Lions Entertainment ou o Lions Innovation, mas haverá coisas diferentes e novas, como mais asiáticos no festival, especialmente da China, porque grandes empresas como Alibaba estão vindo para Cannes. Outra coisa é que cada vez mais temos a presença de companhias de entretenimento, da música, cinema e televisão em Cannes. Eles mudam a forma do festival e refletem as mudanças da indústria. Criam novas experiências. Com a música e o branded content, a propaganda entretém mais as pessoas. Com isso, o festival se torna mais interessante, diverso e os mais diferentes tipos de conversa ocorrem aqui, de diferentes indústrias. Acho que as pessoas vão sentir que o festival está maior”, reforçou.

Sobre tendências ou os grandes temas deste ano? “Acho que a mágica que faz Cannes ser especial é o fato de a gente não conseguir antecipar quais são os grandes temas que surgem. Cada ano é um tema diferente e é isso que, na prática, faz esse lugar tão especial”, contou Papa. No entanto, ele destaca que este será um festival mais voltado para aproximar os participantes. “Nós estamos apostando muito na parte de aproximar as relações humanas, as interações que existem dentro do festival. Isso vai desde o lançamento do novo app, que é muito mais interativo, permitindo uma compreensão muito mais detalhada do que ocorre dentro do festival, até o lançamento de uma plataforma que permite que as pessoas interconectem por perfil, por interesse. Com isso, a gente consegue compreender diferentes perfis e motivações e criar meetups de forma mais efetiva. Na prática, significa que a gente está realmente aproximando de forma mais efetiva todo mundo que está participando do festival”, afirma.

Duas áreas estão muito fortes em 2017: Creative Effectiveness e Glass Lions. A primeira cresceu 59% no ano passado, enquanto a segunda 31% em número de inscrições. Segundo Papa, o festival realmente abraçou a questão do gênero. “Uma das principais instruções para os jurados é não premiar campanhas estereotipadas”. Em relação à redução do número de jurados presenciais – serão 100 jurados a menos do que no ano passado, totalizando 390 –, Thomas afirma que o festival busca aumentar a qualidade dos debates dos júris. “O problema de ter um júri muito grande ficou claro para nós no ano passado. Uma das questões é que é realmente difícil selecionar pessoas tão qualificadas, ano após ano. Outra questão mais importante é ser muito difícil ter uma discussão de qualidade com tantas pessoas no júri. Os presidentes dos júris nos disseram que com menos pessoas a qualidade dos debates seria melhor”, ressaltou o CEO de Cannes.

Phil Thomas também chama a atenção para a melhoria no sistema de julgamento dos júris. “Nós melhoramos o sistema de julgamento para ter certeza de que os jurados estão sendo justos. Para que não tenham um voto patriótico pelo seu país ou por sua rede de agências e amigos. Nós conseguimos ver todos os votos e gerenciar todos os integranes do júri”, revelou Thomaz.
No que diz respeito à decisão de manter o mesmo número de competições, ele destaca que este será um ano para ver como a indústria se comporta. “A gente quis ter um ano para ver as coisas se acomodarem, porque a indústria muda muito rápido. Nós também mudamos com a indústria, mas isso não significa que precisamos ter um novo Leão todos os anos. A gente quis dizer para a indústria dar uma respirada. Nós sabemos que vamos ter mais mudanças no futuro, mas a ideia foi ter um ano para ver como as coisas caminham”.

Brasil

Apesar de até o momento não abrir números de inscrições por país, a organização do festival revelou um aumento na participação de países como China e Emirados Árabes, e da América Latina. Além de um ressurgimento de envios de trabalhos do Brasil, após vários anos de participação reduzida. “O Brasil é sempre destaque em Cannes. Uma potência criativa, que acredito se repetirá este ano no festival. É muito impressionante ver o Brasil, mesmo com essa grave crise financeira e institucional, ser um território primordial no festival”, afirmou Papa. Porém, ele faz uma ressalva. “Uma coisa que eu gostaria de reiterar é que ainda existe uma visão errada no Brasil de que Cannes é só celebração, quando na verdade o festival é um lugar de muito trabalho. Um trabalho que indica o futuro, tendências. Não somos só um lugar para os publicitários beberem vinho rosé, participar de festas e ganhar Leões. Trata-se de um trabalho que realmente transforma e muda a indústria, determinando novas culturas”, observou ele.

Critérios

Em relação aos critérios para se conquistar o tão desejado Leão de Cannes, nada mudou. “Para ganhar um Leão, o trabalho precisa o melhor do mundo. Tem de ser original, com boa execução e bonito. Com uma grande ideia que engaje as pessoas. Precisa ter tudo isso junto. Essa é a única forma de ganhar um Leão em Cannes”, argumentou Thomas.
E como é a escolha do Anunciante do Ano? “Temos uma série de critérios. O primeiro é: a empresa se declara como uma marca que quer ser mais criativa? Ela ganha Leões em várias categorias? Também perguntamos às agências se esses clientes realmente acreditam em criatividade, se eles são bons clientes e apoiam as ideias criativas”, contou Thomas. Vale lembrar que o Burger King foi eleito o Anunciante do Ano nesta edição de Cannes.

Outra questão que os executivos falaram é sobre a importância do branded content para as marcas. “Eu acho que ainda há muito espaço para a propaganda. Publicidade ainda é muito importante. Eu acho que a maioria das marcas entendeu que elas precisam aprender como criar branded content, não para tudo que fazem, mas para algumas coisas”, avaliou Thomas.
“A linha que divide plataformas, conteúdo e pessoas é muito tênue, porque hoje indivíduos viram marcas e as marcas contam as próprias histórias. O entretenimento está muito mais interconectado às propostas de marcas que querem trazer valor às suas respectivas comunidades. Essa intersecção é muito mais evidente e a gente reflete a indústria, novamente”, opinou Papa.
O Festival Internacional de Criatividade 2017 começou no último dia 17 e termina no próximo dia 24, em Cannes, na França. Foram recebidos trabalhos de aproximadamente 100 países e são esperadas 15 mil pessoas. Além do festival principal, o Cannes Lions, são realizados paralelamente três festivais especializados: o Lions Health, voltado para os trabalhos de saúde e bem-estar; o Lions Innovation, que avalia cases de tecnologia e inovação; e o Lions Entertainment, direcionado para o conteúdo de marcas.

Uma das ativações este ano é uma roda-gigante instalada em frente ao Palais des Festivals, além do tradicional telão do projeto FilmBrazil, que comparece mais uma vez como um dos principais patrocinadores do evento. Este ano o tema é #TweetScripts. Programa da Apro (Associação Brasileira de Produção de Obras Audiovisuais), o FilmBrazil usa de forma criativa neste ano o símbolo da hashtag como objeto que materializa as claquetes.