1. A polêmica sobre as biografias não autorizadas ganhou ainda maior força nos últimos dias, com alguns ídolos surpreendentemente se manifestando em desacordo.

Muitos deles lutaram com suas canções e gestos contra a ditadura militar, protestando como era possível na época (e quase sempre não era possível), diante do cerceamento à liberdade de expressão imposto pelo AI-5, o mesmo diploma legal de um governo de exceção, que levou o vice-presidente civil (Pedro Aleixo) a contestá-lo perante o marechal Costa e Silva.

O então presidente da República retorquiu a Aleixo se este não confiava na sua pessoa. Aleixo respondeu com a frase que ficou na História: “No senhor confio plenamente, mas não no guarda da esquina”.

Aqueles mesmos que nos brindaram com obras poéticas e musicais inesquecíveis, juntam-se hoje ao discutível coro dos que se colocam contra as biografias não autorizadas.

O tema já foi aqui abordado, mas a ele voltamos pela indignação que nos causa esse tipo de corporativismo, partindo de pessoas que sempre mereceram todo o respeito e aplausos do povo brasileiro.

Como seria construída a História se não fossem os textos não autorizados sobre os seus personagens? Como saberíamos das mazelas de galanteador de Pedro I, se os historiadores fossem obrigados a pedir a ele ou aos seus descendentes autorização para a reprodução, ainda que com exageros, das suas aventuras amorosas?

Há uma contradição irreparável na postura de artistas posicionarem-se contra biografias não permitidas.

Como bem lembrou o presidente do STF, Joaquim Barbosa, sobre o assunto, as biografias fazem parte do vasto mundo da liberdade de expressão e quem se julgar prejudicado deve requerer indenização e reparos na Justiça.

Segundo seu pensamento, não se pode cercear a obra biográfica por antecipação, o que abriria uma lacuna em todas as manifestações do pensamento.

Nossos astros e estrelas deveriam refletir melhor sobre o tema, lembrando que o pretendido pode ser o estopim para novas formas de censura.

A propósito, aproveitando a onda, alguns famosos do nosso cenário político voltaram a se manifestar nos últimos dias contra a imprensa, com alguns deles afirmando que só sabemos criticar. Uma definição muito coerente com os seus horizontes intelectuais.

2. Não há um brasileiro sequer, em nosso universo de mais de 200 milhões de habitantes, que acima dos 10 anos de idade (às vezes, até menos) desconheça a história do bode na sala.

Tantas vezes repetida, despertou a sagacidade dos espertos, resvalando com maior força para a classe política, um prato farto para o encontro de defeitos.

Nem sempre, é verdade, chegam a ser políticos, mas homens públicos que adquirem um jeito especial de lidar com as massas, procurando sempre dizer, ainda que vitimando a verdade, o que elas querem ouvir.

Nessa privilegiada estirpe, há também a figura dos que, não precisando de votos, desprezam a opinião pública, chegando quase ao desplante de afirmar não segui-la e nem sequer considerá-la em suas decisões.

Alguns magistrados têm esse cacoete, querendo com isso provar que são independentes. É necessário nesse mister ser independente, mas sempre decidir com sabedoria. E para tanto nem sempre deve ser obrigatoriamente afastada a opinião pública, que na maioria das vezes tem razão nos seus pleitos. Como já foi dito milhões de vezes, Vox Populi, Vox Dei.

Ainda na última sexta-feira, um desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, tendo que decidir em segunda instância se os alunos da USP deveriam abandonar a ocupação da Reitoria, prolatou sentença favorável, porém, dando aos invasores 60 dias para fazê-lo.

Procurado por um repórter da Jovem Pan, a quem diga-se educadamente acolheu, defendeu o seu ponto de vista, acreditando estar com isso, entre outras coisas, evitando uma desocupação violenta por parte da autoridade policial, com risco de mortes.

O bom repórter insistiu no exagero do prazo, alegando inclusive a necessidade da Reitoria voltar a funcionar regularmente. O desembargador então sugeriu que a Reitoria se mudasse provisoriamente para outro imóvel da Universidade.

O repórter lembrou então que o prazo de dois meses atingiria o período de férias escolares, retrucando a autoridade judiciária que isso não estava em questão, encerrando a entrevista com o popular – tantas vezes repelido pelos nossos homens públicos – “em cada cabeça uma sentença”, que bem poderia ser contraditado com o também popular “justiça tardia é injustiça”.

Corte para o prefeito de São Paulo, que anunciou aumentos extraordinários (alguns chegando a 45%) do IPTU em algumas regiões da cidade no próximo exercício e agora esclarece que haverá um decréscimo em torno de 10% nas diversas faixas (alíquotas) do aumento anteriormente anunciado.

O fato quase lembra – com a mesma autoridade pública – as tarifas dos transportes coletivos que em junho tiveram um aumento de R$ 0,20 e, após as verdadeiras manifestações populares, mais tarde abafadas pelos black blocs (de quem será o comando?), desistiu-se da iniciativa do aumento, mudando-se o cardápio para o IPTU.

Maldito bode, deitado eternamente sobre o mapa do Brasil.

3. Na moda infinda das passeatas que tomam conta das ruas das principais cidades brasileiras, atrevemo-nos a sugerir mais uma, contra toda sorte de aumentos de impostos e taxas.

Pode não ir ninguém, mas servirá como lembrança à população escorchada pelos poderes públicos do que pagamos quase sempre injustamente.

Este editorial foi publicado na edição impressa de Nº 2471 do jornal propmark, com data de capa desta segunda-feira, 21 de outubro de 2013