Na contramão da maioria dos setores da economia, o mercado de games está indo muito bem, obrigado. E acredite: ainda mais na pandemia. Os números da mais recente Pesquisa Game Brasil 2021, feita entre Sioux Group, Go Gamers, Blend New Research e ESPM, revelaram que 72% dos brasileiros jogam algum tipo de game – em 2019, eram 66,3%. E, desse universo atual, 75,8% afirmaram que, por conta do isolamento social, passaram a jogar mais.

A situação imposta pela pandemia fez ainda com que 51,5% dos jogadores realizassem mais sessões de partidas online com amigos. Além disso, 60,9% dos participantes da pesquisa afirmam ter consumido mais conteúdos relacionados a jogos, e 42,2% disseram ter investido mais dinheiro em jogos durante o período de isolamento social.

No entanto, mais do que os próprios números, essa pesquisa não deixa dúvidas: o mercado de games é um terreno fértil. Tanto que algumas das principais marcas do mundo têm apostado nesse novo (mas, talvez, nem tão novo assim) segmento. O McDonald’s é um exemplo disso. O Méqui 1000, considerado o restaurante mais icônico da rede, se teletransportou para o mundo virtual do Minecraft e The Sims 4.

Desenvolvida pela DPZ&T, a ação permitia aos jogadores encontrarem um cupom com um QR code que, ao ser escaneado, direcionava o usuário para fazer seu pedido via McDelivery. Já no The Sims 4, o fast-food aparecia em um episódio da websérie Girls in the House. O restaurante foi criado especialmente para a produção.

Além do McDonald’s, a Vivo também já investiu no mundo dos games. Criado pela VMLY&R em parceria com o Gamers Club, o e-quality mostrava, por meio do Counter Strike, como o fato de uma mulher ganhar, em média, 32% a menos do que um homem impacta em toda a sua vida. Leão de Ouro em Cannes, em 2019, o case tinha o objetivo de reafirmar o compromisso com ESG da companhia.

O Méqui 1000 foi para o mundo virtual do Minecraft e The Sims 4: ação criada pela DPZ&T (Divulgação)

Para o Greenpeace, a agência fez com que alguns dos principais streamers do mundo se transformassem em animais ameaçados, chamando, assim, a atenção para a necessidade de se preservar a Amazônia.

Fernando Taralli, CEO da VMLY&R, disse que a demanda das marcas por ações em games cresce, porém, em uma velocidade um pouco menor. “Em geral, o universo dos games oferece muita liberdade criativa, já que é um ambiente lúdico e imersivo, com o qual as pessoas se envolvem proativamente em busca de entretenimento”, afirmou.

No Brasil, ainda de acordo com Taralli, 70% do público online utiliza videogames, o que mostra um  enorme potencial deste mercado. “Mundialmente, é uma indústria maior do que a da música e a do cinema juntas. Para as marcas, no
entanto, é importante haver consistência entre as ações gamificadas e os demais esforços estratégicos de comunicação”, destacou.

BATTLE ROYALE
Um dos jogos preferidos dos brasileiros, o Battle Royale foi a plataforma escolhida pela Unopar, universidade paranaense que pertence à Kroton, para uma ação, ainda em andamento. Criada pela Ogilvy, a Copa Unopar tem o gamer de eSports Cerol como embaixador.

A disputa online – e em grupos – vem alinhada com a campanha da universidade para este ano: #PRAVOCÊVIRAROJOGO. O time vencedor receberá quatro bolsas de estudos, além de R$ 16 mil. O segundo colocado também receberá quatro bolsas de estudos e mais R$ 8 mil para o time, o terceiro colocado, além das quatro bolsas de estudos, também receberá R$ 4 mil para o time. Já o quarto e o quinto lugar recebem cada um dos times o prêmio de mil reais. 

Roberto Vianello, diretor de estratégia integrada da Ogilvy, afirmou que este é o primeiro campeonato de Free Fire feito por uma universidade no Brasil. “Tudo foi feito com muito estudo e detalhamento, desde a escolha do jogo em si até o streamer, passando pelo modelo do campeonato, que segue as mesmas dinâmicas que a comunidade já está acostumada, assim como toda a linguagem gráfica da campanha. A ação fica no ar até maio, mas até o momento, o retorno já tem sido muito positivo como um todo”, disse. 

Assinada pela Ogilvy, ação traz o gamer Cerol como embaixador: ação alinhada ao #PRAVOCEVIRAROJOGO (Divulgação)

Para o vice-presidente de crescimento da Kroton, Leonardo Queiroz, o campeonato remete a um conceito de uma marca que “olha para o jovem como alguém capaz de tomar as próprias decisões”. “No videogame é assim, você ganha ou perde dependendo da decisão feita ali, naquele momento. Acreditamos que, com a realização do campeonato, temos uma excelente oportunidade de contribuir com momentos de descontração, alegria e a possibilidade de os participantes conseguirem o acesso ao ensino superior de forma leve”, disse.

E os games podem ir muito mais além ainda, se as marcas destinarem parte de suas receitas para esta ‘nova’ forma de se fazer publicidade, como defendeu Luís Velloso, social operations manager da Ogilvy.

“Você pode pegar os números, hoje uma transmissão do CBLOL, em rodadas decisivas, dá uma audiência comparada a canais de televisão, um streamer, como o Gaules, transmitindo uma partida de CS GO com milhares de inscritos, e com a retenção de horas de transmissão é um exemplo também de como é uma audiência fiel”, disse. “Cabe a nós, no mercado publicitário, e pessoas especializadas em games, sermos responsáveis por essa democratização do gaming como ferramenta de mídia publicitária”, completou.

Para Gisele Giardelli, gerente de conteúdo da AlmapBBDO, o mercado brasileiro já entendeu a importância desse universo. “Acredito que já está claro para o mercado publicitário o valor dos games e as oportunidades que temos aqui. Demoramos mais para chegar nesse momento, mas hoje já estamos em um patamar parecido com o mercado de fora do Brasil”, disse.

Como exemplo, a executiva lembrou da campanha de Johnnie Walker no Hydra 1008. A ideia foi levar um bar para dentro do RPG, onde aconteciam ativações de marca. Giardelli contou ainda que o grande desafio foi encontrar um jogo que permitisse a participação na narrativa e tivesse o fit cultural que a marca estava buscando.

“Alcançamos mais 600 K views nos conteúdos ao vivo e 7.5 M de minutos assistidos, além do feedback qualitativo dos usuários durante as transmissões, que nos trouxe insights supervaliosos para a atuação da marca nesse território”, relembrou.

BAR E CARNAVAL: VIRTUAIS
Até a boa e velha cervejinha foi parar no mundo virtual dos games. O case, criado pela Cheil, inseriu a Brahma no GTA RP Cidade Alta (servidor alternativo do game onde as pessoas entram e interpretam personagens, como se fosse a vida real). Foi criado, então, um bar virtual e uma história para criar engajamento dos gamers.

A cerveja tinha acabado na cidade e a jornada de todos os players resultaria em uma festa no final, patrocinada pela Brahma Duplo Malte. “Cerca de 700 influenciadores participaram da ação, incluindo a Anitta. E atingimos mais de 1,3 milhão de pessoas simultaneamente só durante as livestreams, fora o conteúdo gerado depois”, contou Douglas Santos, head de games da Cheil.

Uma das vantagens do universo virtual é o fato de não ter limite, ou, como afirmou Santos, o limite é o contexto da marca e do produto. “Tudo é possível desde que seja conectado ao contexto do consumidor”, disse.O executivo acredita que as marcas, algumas pelo menos, entenderam que a publicidade mudou de uns anos para cá. “Os games ganharam protagonismo nos últimos anos, e muito disso se deve ao avanço da internet. Hoje se pode baixar um jogo de 50 GB de forma fácil, rápida e barata, já o mobile também permitiu que mais pessoas se aproximassem, o que torna um ambiente propício para qualquer marca, alcance e engajamento”.

Druid criou um Carnaval dentro do GTA, que durou cinco dias: 19 milhões de views em várias plataformas de livestreams (Divulgação)

Apesar disso, o head de games da Cheil vê o Brasil no que chama de primeira fase de amadurecimento. “É o lugar onde as marcas estão entendendo seu papel com games e eSports, o valor da comunidade e mapeando o ecossistema atrás de uma conexão real com esse público. Do outro lado, tem toda a indústria aprendendo como realizar uma entrega de valor para a marca e os influencers também aprendendo como entregar e mensurar o trabalho”, disse.

Outra agência que também coleciona cases em games, a Druid criou um Carnaval dentro do GTA Cidade Alta. Músicas do Monobloco foram licenciadas para deixar a festa mais próxima do real, e 130 influenciadores foram convidados a participar do evento, que durou cinco dias.

“Alcançamos a marca de 19 milhões de views nas mais diversas plataformas de livestream do Brasil e tivemos resultados expressivos para a Trident, Engov After e Tinder, que toparam participar dessa maluquice que seria o primeiro Carnaval dentro de um game no mundo”, disse Bernardo Mendes, sócio e chief gaming officer da Druid.